CONTOS NEFASTOS DO AKIN
A velha Firmina e seu amado Anastácio
A velha Firmina, e seu amado Anastácio, viviam em uma casa às proximidades de um rio. Todas as tardes, os dois percorriam a trilha que levava ao regato. Ambos de poucas palavras, discretamente se despiam, e banhavam-se no rio. Todas as vezes, antes de voltarem para casa, Anastácio massageava as costas de sua velha Firmina enquanto ainda na água. Durante um fatídico dia, quando foram se banhar em um trecho mais profundo, Anastácio foi pego por uma correnteza d´água, o que lhe causou a morte.
A velha Firmina, triste sem seu amado Anastácio, continuou a se banhar no rio, e, enquanto chorava por seu amado, sentia as mãos dele mais uma vez em suas costas, a massageando. Uma vez, a velha Firmina decidiu se vestir mais depressa, e ao sair da água, quando estava para colocar as roupas no corpo, o fantasma do seu amado Anastácio surgiu vindo de dentro do rio, e como todas as outras vezes, massageou as costas da velha Firmina. Até que um dia, ambos deram as mãos, e desapareceram dentro do rio. A velha Firmina, e seu amado Anastácio às vezes são vistos, como um silencioso casal, por pessoas que decidem se banhar no mesmo rio.
FIM
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Dora e o defunto
Anadora era uma menina de dezessete anos, um pouco diferente
das demais garotas da sua idade. Dora não tinha nenhum amigo, ou amiga, e era
muito calada. Os pais dela eram muito ausentes, e passavam pouco tempo em casa.
Mas Dora, preferia passar o seu tempo no cemitério da cidade. Naquele
cemitério, Dora sentia-se bem a vontade. Ela caminhava durante horas, olhando
as lápides, e depois se sentava abaixo de uma árvore florida que ali existia.
Numa tarde, enquanto ela caminhava pelo cemitério, para sua surpresa reparou em
um túmulo que ela nunca tinha visto antes, quase todo coberto pela folhagem.
"Como pode ser?" pensou ela, e decidiu se aproximar para olhar mais
de perto.
Ficou espantada, ao constatar pela data na tumba, que aquela
pessoa já havia falecido a duzentos anos. Tinha uma brecha na tampa do túmulo,
e Anadora espiou o seu interior. "Que espanto!" Aquela pessoa estava
em perfeitas condições, como se ainda estivesse viva. Aquela noite foi a
primeira que Dora não voltou para casa. A menina ficou ao lado do túmulo, pensando,
se deveria abri-lo, e saciar sua curiosidade. Aquela vontade foi se tornando
mais forte com o passar dos dias, e Dora não pensava em outra coisa além disso.
Até que, certa noite, no meio da madrugada, Dora tomou
coragem, e empurrou com todas as suas forças a tampa, que por fim se abriu.
"Que perfume maravilhoso! Parecem rosas! Que expressão tranqüila a deste
homem morto. Que pele impecável! Parece o príncipe que eu sempre sonhei que
estivesse ao meu lado." Na noite do dia seguinte, ela entrou na tumba, e
dormiu deitada sobre o corpo. Sonhara estar em um campo florido, cheio de
animais que vinham até ela, e lhe prestavam homenagens. Na noite depois
daquela, ela deitou-se da mesma forma, e tocou os lábios do morto com os seus.
E, neste exato instante, o defunto a abraçou com força, jamais deixando-a
partir. Anadora nunca mais foi vista.
FIM
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Vivian e o anjo
Vivian, uma garotinha de quatro anos, morava com os pais e com o irmãozinho de dois anos, em uma casa bem modesta. Durante as festividades da igreja, haviam diversas imagens e estátuas de anjos, e de santos por todo o pátio, e as pessoas de toda a cidade faziam suas preces, à um, ou à outro, e lhes deixavam oferendas. Havia porem, uma pequena estátua feita de barro que ninguém parecia notar. Era a estátua de um anjo, e que, talvez por ser tão simples, ninguém a reparava. Vivian sentiu que devia rezar para aquele anjo. Ela chegou perto da estátua, e rezou com grande amor e sinceridade.
Durante a noite, Vivian acordou com uma luz em seu quarto, que desceu e tomou a forma daquele anjo. O anjo sem dizer nenhuma palavra, fez um gesto para que ela o seguisse. A menina seguiu aquela imagem, descendo pelas escadas, e saindo para fora no jardim. O jardim da casa tinha um antigo poço de água abandonado, e o seu irmão menor estava prestes a subir em cima da borda dele. Vivian correu até o irmão, segurou ele pelo braço, e levou-o de volta para o quarto. Desde então, Vivian sempre se lembrou de agradecer aquele anjo em suas orações.
FIM
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O pescador e o boto
Os aldeões de uma aldeia localizada bem no interior de uma floresta, iam pescar no rio todos os dias. Certa vez, um pescador decidiu se afastar um pouco mais em sua canoa, quando uma inesperada correnteza o derrubou na água. Sem poder controlar para onde ia por causa da força da água que o arrastava, concluiu que logo seu corpo iria ceder, e então se afogaria. Quando o pescador muito cansado deixou-se levar, um boto cor de rosa surgiu por debaixo dele, e salvou-lhe a vida.
Sobre as costas do boto, ele chegou até uma lagoa tranquila, e de águas límpidas. O pescador não havia perdido a consciência por completo, então acompanhou o trajeto com os olhos poucamente abertos.
Haviam muitos outros botos cor de rosa, e também de diferentes cores. As criaturas pareciam ser muito felizes, e gentis. O boto podia falar com o pescador, e o advertiu – “não conte a ninguém sobre nós” O pescador concordou, e assim voltou para sua aldeia, onde haviam-no dado como perdido. O pescador, entretanto, não podia controlar o desejo de contar aquela historia tão fantástica, e foi o que ele fez. Muitos dos outros aldeões o acompanharam através do caminho que ele teria percorrido na ocasião de seu desaparecimento, em procura daquele tal boto.
Até que chegaram na bela lagoa onde vivem os botos. Não vendo nenhum, o pescador que foi salvo pelo boto entrou na água para averiguar. Quando se deu conta, de que todos os outros aldeões estavam olhando para ele com grande surpresa. Ele mesmo havia se transformado em um boto! Não estando acostumado com a sua nova forma, não podia nadar com agilidade, e, sem demora os aldeões o capturaram.
FIM
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As formigas e Cléber
Cléber era um estudante da faculdade de engenharia civil, e tinha vinte e seis anos. Após uma visita à um centro de cultura especializada em formigas, uma idéia esquisita veio em sua mente. Aquelas formigas passavam o dia trabalhando, e totalmente concentrada em seus afazeres naturais, como se não lhes sobrasse tempo para mais nada. Afinal, era preciso que tivessem agido desta maneira, para que não deixassem de existir na natureza.
Mas, pensou Cléber, e se não precisassem mais trabalhar? O que fariam com o tempo livre que lhes sobraria? Pensando nisto, Cléber trabalhou durante algumas semanas na construção de uma cidade em miniatura, feita com argila dura. Cléber construiu pequenos modelos de prédio, de casas, e de vias públicas. Haviam praças, e também passagens subterrâneas que interligavam vários dos locais da pequena cidade.
As primeiras formigas que foram colocadas na cidade em miniatura, aparentaram não saber como deviam agir, ou o que deveriam fazer. Mas em poucas gerações, as formigas começaram a viver nos apartamentozinhos, e também a se mover com agilidade pela cidade. Só o que precisavam fazer, era estocar o alimento, e carregá-lo. Não havia meio de que cavassem na argila ou abrissem novas passagens. Também não precisavam se defender de outros bichos.
Com o decorrer de três anos, Cléber notou que as suas formigas viviam mais tempo do que as formigas normais. Elas também haviam descoberto maneiras de se manterem ocupadas, com o que pareciam ser “competições esportivas”, onde algumas delas percorriam certo caminho carregando uma quantia de carga, até que uma terminasse primeiro o percurso. Cléber também notou que as formigas passaram a ter mais individualidade, e moravam sempre em casas definidas, que podiam abrigar uma porção delas.
Com o decorrer de cinco anos, as formigas de Cléber viviam muito mais do que as normalmente encontradas na natureza, e quando uma delas morria, as outras permaneciam um tempo imóveis ao redor do corpo, e então o levavam para o subterrâneo. Cléber comprou um jogo de letrinhas do alfabeto, e as arranjava na praça escrevendo “comida” sempre antes de fornecer alimento a elas. Certo vez, quando há muito tempo não lhes dava alimento, colocou todas as letras na praça, desorganizadas, e prontamente as formigas rearranjaram as pecinhas na forma da palavra “comida”. Desta maneira, Cléber estabeleceu algumas comunicações com as formigas.
Porem, Cléber foi ficando cada vez mais paranóico com seu experimento. Deu nome a muitas das formigas, e as vezes, às levava para passear fora da cidade. Após o decorrer de dez anos desde que teve inicio o experimento, as formigas haviam desenvolvido diversas capacidades extra-naturais. Podiam se comunicar com as letras do alfabeto, podiam consertar pequenos dispositivos como relógios e rádios portáteis, haviam estabelecido datas para competições e culto aos mortos, entre muitas outras coisas extraordinárias para as formigas.
Um dia, Cléber foi a um cinema levando consigo duas formigas, às quais ele havia dado o nome de Antenor, e Samanta. As formigas estavam sobre o ombro de Cléber, quando, de repente, a pessoa sentada ao seu lado bateu com a mão nelas, as esmagando. Cléber neste instante perdeu todo o controle, arrasado com a morte das formigas, e estrangulou a pessoa. Cléber foi mandado à um manicômio, onde, até hoje, age como se fosse uma de suas formigas.
FIM
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Até onde Juarez pode chegar
Existe um lugar muito distante, no deserto do México. Onde os xamãs cantam, dançam, e se conectam com os espíritos da natureza. Juarez queria conhecer esse lugar. Pegou algumas poucas coisas, somente o que podia carregar, e partiu da pequena cidade onde nasceu, e onde passou toda a sua vida, entrando cada vez mais no deserto escaldante. O mais longe que pôde chegar foi à um povoado chamado Chihuwaka. “Como esta quente. E estou tendo algumas visões, que não sei se são reais, ou ilusões do calor.” Pensou Juarez.
Uma velha chihuwaka de pele muito enrugada tomou-lhe a mão, e, falando em um idioma que ele não conseguiu entender, puxou-o para dentro de uma tenda simples de pano, mas muito bem decorada. Havia um aroma peculiar no lugar, parecia alguma espécie de incenso doce, mas que lhe fez tossir. A chihuwaka pegou um colar dourado com três pingentes, um na forma de um sol, um na forma de uma caveira, e outro com a forma de uma meia-lua. Em seguida, a mulher disse uma palavra, e nesta hora, Juarez viu um redemoinho vermelho de vento circular acima deles dois.
Juarez não teve reação alguma, enquanto a velha colocou o colar em seu pescoço. Estava ali para aquilo. Havia também uma moça morena sentada no canto da tenda, com as pernas encolhidas para si. Ele podia não tê-la notado antes naquela sombra, e com o cheiro da fumaça penetrando em sua respiração. Por um instante, tinha desviado sua atenção da velha, e quando a olhou novamente, viu não o rosto de uma pessoa, mas de um cão. Ainda assim, as palavras continuavam saindo de sua boca, conduzindo Juarez a embarcar em um ritmo.
Juarez sentia uma estranha euforia. A moça mais jovem tinha se levantado, e atravessado uma abertura na parede da tenda, saindo para fora dela. O vento vermelho havia parado, e se transformado em uma chuva de poeira verde brilhante. Juarez ouviu uma multidão de vozes fora da tenda. Chamavam por ele. Não com palavras, mas havia uma expectativa, e um entusiasmo. Juarez sabia que agora precisava sair da tenda, e ser recebido por aquelas pessoas. Mas, quando Juarez estava para sair dali, a velha com o rosto de cão mudou seu comportamento, o agarrando forte com os dedos magros, e esbravejando palavras que ele desconhecia, mas que lhe davam calafrios.
A velha sacudiu Juarez como a um boneco, e o jogou no chão. Ele achou que morreria ali. Ficou deitado, sem se mover, enquanto a sua anfitriã discutia com as pessoas de fora da tenda. Juarez estava apavorado, e não suportava mais aquilo. Sentiu um peso em suas costas, e viu a moça jovem sentada sobre ele. Primeiro, aquele peso pareceu incômodo, mas depois, foi deixando-o mais calmo. Sentiu a jovem derramar um óleo sobre as suas costas e ombros, e sabia também, que havia um lobo do deserto rodando em torno dele, o farejando . Dormiu, e quando acordou, estava dentro daquela mesma tenda. Mas ela estava vazia, e para a sua surpresa, todo o resto do povoado não estava mais lá, e nem mesmo nenhuma das outras tendas.
FIM
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O marinheiro e a sereia
Em pleno alto mar, o barco por pouco resistiu a uma tempestade
terrível, e os marinheiros, esgotados, recompunham as suas energias. A
tempestade levou o barco até a proximidade de pequenas ilhotas. Um dos
marinheiros, olhando para a terra firme, notou uma bela mulher deitada sobre um
rochedo, com a cabeça e o busto de fora da água. Tentado pela mulher, e temendo
que viessem a ser pegos por uma outra tempestade, o marinheiro pulou ao mar e
nadou até lá. Quando alcançou o terreno firme, percebeu que aquela linda mulher
de cabelos loiros e compridos, tinha da cintura para baixo uma cauda de peixe,
prateada, e que balançava graciosamente, dentro da água. “Você é uma sereia!”
disse o marinheiro ao perceber.
A sereia, através do seu maravilhoso canto, disse ao
marinheiro que ela poderia se transformar na mulher que ele imaginasse. O
marinheiro perguntou “- Você pode se transformar na princesa?” , então a sereia
tomou a forma da princesa, e o marinheiro à possuiu. “- Você também pode se
transformar na vendedora da laranjas?” novamente a sereia tomou a forma da
moça, e novamente o marinheiro à possuiu. “- Agora se transforme na filha do
cozinheiro.” mais uma vez, a sereia tomou a forma de tal mulher. Enquanto o
marinheiro à possuía, de uma hora para outra, seu prazer transformou-se em
horror, ao constatar que, dominado pelas garras da sereia, seu corpo já tinha
sido quase todo devorado por ela.
FIM
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Elisa e a bola de cristal
Elisa era uma mulher dedicada ao estudo do misticismo, e
sendo escritora, escreveu alguns livros sobre o assunto, e também escrevia diariamente
em revistas e artigos especializados nas artes ocultas. Certo dia, Elisa
recebeu uma carta que dizia ter sido escrita por uma bruxa. A carta dizia que a
bruxa visitaria Elisa e deixaria com ela um presente. Uma semana depois, bateu
na porta de Elisa uma mulher velha, que escondia quase totalmente o corpo com
uma roupa mofada e um capuz. A pessoa desconhecida tinha consigo uma bola de
cristal, e disse à Elisa que a estava dando de presente. Elisa perguntou por
que ela estava recebendo aquele presente, e a desconhecida disse que aquela
bola de cristal é mágica, e precisava ficar em boas mãos. Depois de entregar a
bola de cristal para Elisa, a pessoa foi embora sem dizer mais nada.” Que
surpresa!” Disse, Eliza. “ Uma bola de
cristal mágica. Vou aproveitar para perguntar alguma coisa e ver se ela me
responde. Amanhã irei a um evento importante, como isso vai ser?” A bola de
cristal brilhou em azul bem forte, e uma voz em sua cabeça contou para Elisa
que ela faria boas conexões profissionais, mas que no regresso bateria o carro
e machucaria o seu pulso direito. “Que coisa! O que foi isso que acabei de
ouvir? Mas não vou deixar de ir ao encontro, e também não baterei o carro!” No
dia seguinte quando Elisa retornava do evento em seu carro, um outro veículo
surgiu do nada e colidiu com ela, machucando-a em seu pulso direito.” Elisa
ficou assombrada. Ao chegar em casa, Elisa perguntou para a bola de cristal o
que aconteceria se ela fosse fazer compras naquele exato momento. A bola de
cristal disse a ela que ao passar de
quatro dias, ela e o seu namorado romperiam o relacionamento. Elisa perguntou o
que aconteceria se no dia seguinte ela fosse caminhar no parque. A bola de
cristal respondeu que com o passar de dois anos, Elisa sofreria um acidente e
perderia a sua perna esquerda. Elisa perguntou o que aconteceria se ela fosse
ao cinema no final de semana como havia combinado com uma amiga. A bola de
cristal respondeu que com o passar de nove meses Elisa morreria atingida por um
raio. Elisa nunca mais saiu de casa, e passou o resto dos seus dias em um
estado de paranoia, até que ficou fraca, e de doença, faleceu.
FIM
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O solitário fantasma de Meredith
Era um dia de frio cruel. Meredith esperou que uma única pessoa a notasse pela última vez, por uma vez. Sentada na beira da fonte congelada bem no interior da praça. Meredith sempre foi uma pessoa bondosa e amável com todos, mas sempre terminava sozinha. Por que seria que todos não lhe davam a mínima importância? Havia perdido tudo o que tinha durante este inverno para pessoas sem escrúpulos. Não iria mais se mover. Até que Meredith morreu, carregada para fora do seu corpo mortal com uma lufada fria de vento. A alma de Meredith não achava que deveria deixar aquele lugar, tão real, e tão injusto, não antes de entender e fazer algo a respeito. Seu fantasma passou a aconselhar pessoas em situações difíceis, e também a estimular pessoas a fazer caridades. O fantasma de Meredith, todavia, estava obcecado pelo pensamento de que deveria haver união, e não somente a solidão deveria existir para ela. O fantasma de Meredith começou a acompanhar Rivaldo, e a relação começou a ficar mais forte, até que Rivaldo podia ver e conversar com o fantasma. Foi que um dia, Rivaldo conheceu uma mulher e os dois se apaixonaram um pelo outro. Possuído por ciúme, o fantasma de Meredith ficou violento, e começou a quebrar vidros e mover os moveis. Rivaldo sabia que o fantasma de Meredith estava irritado, e muitas vezes orava pedindo que Meredith o deixasse viver ao lado de uma pessoa também viva assim como ele. A fúria do fantasma continuou, até que Meredith sentiu um véu negro cair sobre ela mesma. Alguma coisa estava mudando, e aonde antes havia um brilho muito forte no céu, lhe indicando o caminho, havia somente uma luz quase apagada. Alguns fantasmas que antes Meredith não podia ver começaram a ser visíveis a ela. Eram fantasmas ciumentos, e cheios de rancor, e que agora podiam vê-la e conversar com ela. O fantasma de Meredith percebeu que deveria deixar Rivaldo e procurar um sentido para a sua solidão. Então o fantasma de Meredith saiu o mais rápido que pôde de baixo daquele véu negro, e iniciou uma jornada para longe dali.
FIM
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As agulhas mágicas do Dr Chang Zhao
“Venham! Depressa! Venham ver o Doutor Chang Zhao e as suas
agulhas mágicas!” anunciava o serviçal, enquanto puxava uma carroça, coberta
por um pano de seda, onde dentro estava o doutor Chang Zhao. As pessoas do
vilarejo chegavam cada vez em maior número para saber do que se tratava. O
serviçal continuou a falar: - “O doutor Chang Zhao pode curar qualquer dor com
as suas agulhas mágicas. O doutor Chang Zhao pode até mesmo realizar milagres
com as suas agulhas mágicas.” Uma por vez, as pessoas eram tratadas pelo
doutor. As agulhas de metal, bem finas, se moviam sozinhas sem que precisassem
ser manejadas, e espetavam em locais bem específicos nas pessoas, curando-as.
Todos ficaram maravilhados com os resultados. Quem antes sentia dores, agora
não mais as sentia. Outros que sofriam de algum tipo de paralisação agora
podiam se mover. Até que um sujeito influente e corrupto decidiu experimentar
as agulhas, porém, enquanto isso teve a ideia “depois que eu sair daqui, vou
mandar que matem esse doutor e assim vou roubar essas agulhas”. Acontece, que
as agulhas sentiram as intenções daquele sujeito, e o mataram. O doutor Chang
Zhao ficou apavorado. “-Isso nunca aconteceu antes! Já havia acontecido das
agulhas agirem de modo inesperado, mas não assim! “A cidade ficou revoltada.
Prenderam o doutor, para julga-lo na manhã seguinte por assassinato. Enquanto
estava preso, o doutor Chang Zhao podia ver além do seu alcance da cela, a
caixinha onde estavam guardadas as suas agulhas mágicas. Aproveitando a
oportunidade da visita de um guarda, o doutor pediu a ele que o deixasse ver mais
uma vez as suas agulhas, que só abrisse a caixa para que ele as visse à
distância. O guarda concordou, desde que o doutor apenas olhasse mas não
tocasse nelas. Quando o guarda abriu a caixa, as agulhas se moveram por si
mesmas, espetando-o, e controlando-o, fazendo com que ele abrisse a cela e
libertasse o doutor Chang Zhao. E foi assim que o doutor Chang Zhao escapou com
as suas agulhas mágicas.
FIM
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A Fênix
O jovem Emelião viu quando a montanha de fogo soprou negra
fumaça. Parecia que os habitantes do mundo inferior estavam irritados. Era
proibido chegar muito perto da montanha sagrada, mas o que poderia acontecer se
o apanhassem? Provavelmente uma repreenda do chefe, mas nada mais que isso.
Emelião achou que seria emocionante ir até lá, e foi subindo a montanha de
fogo, com cuidado para que ninguém o visse. De repente, do cume da montanha foi
lançada uma bola fumegante que caiu bem ao lado de Emelião. Era um ovo,
brilhante, de tão quente. Tomando as precauções para não se queimar, Emelião
levou o ovo com ele de volta para o povoado. Emelião contou o que aconteceu
para o supremo sacerdote, e mostrou-lhe o ovo que encontrara. O velho deu um
pulo de susto, e disse que era um ovo da ave fênix, e que quase nunca mais eram
encontrados. Depois disse a Emelião que
seria perigoso ficar com o ovo, mas o jovem não deu ouvidos, e quis criar ele
mesmo, a ave que viesse a nascer. Depois que se passaram nove dias contando com
aquele, a ave fênix nasceu. Emelião decidiu que não deixaria o pássaro preso,
mas apenas cuidaria caso ele retornasse depois de solto. A ave era muito
inteligente e difícil de prever, mas ela sempre voltava, e Emelião cuidou dela
durante nove anos. Até que um dia, a fênix, que já estava bem grande, com
quinze metros de ponta a ponta de suas asas, começou a pegar fogo. O pássaro
voou pela cidade totalmente fora de controle, incendiando tudo o que existia
ali. Os sobreviventes puderam apenas contemplar as cinzas da sua cidade. A ave
fênix queimou toda, e depois, ressurgiu das cinzas, muito maior do que antes,
voou até a montanha de fogo e entrou dentro dela.
FIM
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O boneco de madeira
Em uma região afastada das cidades grandes, fábricas derrubaram
as florestas, e na última reserva que foi devastada havia uma grande árvore, a
mais antiga de todas, e a sua madeira foi usada entre outras coisas para a
fabricação de um boneco articulado. O boneco foi vendido para uma criança
chamada Oswaldo. Acontece, que muitos povos antigos viviam ao redor daquela
árvore sagrada, e o boneco, carregado com grande energia espiritual, por ser
feito da madeira dela, ganhou vida. Oswaldo brincava com o seu boneco, e o seu
boneco brincava com ele. O boneco era puro e inocente. Até que um dia, Oswaldo
levou-o até um local arborizado para brincar. O boneco sentiu que havia alguma
coisa que ligava ele e aquelas árvores.
Naquela noite o boneco desapareceu, e uma semana depois, durante um
incêndio inexplicável em uma das fábricas, que já era o terceiro consecutivo,
encontraram o boneco de Oswaldo causando o fogo. Alguém conseguiu tirar uma
dúzia de fotos antes que o boneco fugisse mata adentro. Saiu uma matéria sobre
isso no noticiário local: “Boneco teria causado os incêndios nas fábricas.” Mas
a notícia foi considerada mais uma matéria sensacionalista e foi esquecida pela
maioria das pessoas.
FIM
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O pequeno Timothy e o espelho misterioso
Em uma casa nos campos, vivia Timothy, um jovenzinho com doze anos de idade, e sua madrasta. A madrasta de Timothy havia ficado louca após a morte do marido, e esquecia-se até de si mesma, fiando e costurando, de manhã até a noite, e isso, fazia com que o garoto às vezes tivesse que procurar comida ele mesmo, nos bosques, ou na cidade, onde se apiedavam dele. Timothy caminhava por uma estreita trilha no bosque, uma trilha que ele costumava sempre seguir. A trilha levava até um local cheio de árvores que davam frutos deliciosos, mas, como aquele era um local bem afastado, raramente apareciam outras pessoas por ali.
Naquele dia, Timothy, quando estava na metade do caminho, viu um músico com seu violão. O músico também viu o menino, e falou com ele em um tom simpático – “Olá meu jovem! Você gosta de música?” Timothy respondeu que sim, e chegou mais perto. O músico disse – “Tocarei uma música para você.” Depois de terminar de afinar o instrumento, o músico subiu em cima de uma pedra na beira da trilha, mas, ao tocar o primeiro acorde, escorregou, caindo muitos metros dali abaixo, no meio do mato. Timothy desceu com cuidado para ver o que havia acontecido com o sujeito. Já havia terminado a descida, quando viu o pobre homem caído sem movimento algum. Foi então, que o pequenino ouviu uma voz rouca de mulher – “Timothy! Timothy!”
O jovenzinho seguiu a voz que o chamava, até que viu ao lado do instrumento quebrado, um espelho muito esquisito no chão. O espelho estava embaçado de tão velho, e Timothy não podia enxergar perfeitamente o próprio reflexo nele. Ainda assim, Timothy levou aquele espelho para casa. Antes que a última vela de sua casa se apagasse naquela noite, o garoto ouviu de novo aquela voz que o chamava “Timothy! Timothy!” . Vinha da direção onde ele havia deixado o espelho, então ele foi até lá, e viu que, onde antes quase não havia reflexo algum, agora havia a imagem de um rosto horrível, parecido com o de uma mulher muito feia. A pele do rosto era decrépita, verde e azul. Os olhos eram completamente escuros, e sem reflexo. Cabelos loiros mofados desciam até a altura do ombro. Timothy sentiu um arrepio, e esfregou os olhos. A luz da vela tremulava nas preliminares de se apagar.
Quando abriu novamente os olhos, o rosto ainda estava lá. E o rosto falou com Timothy – “Eu sou uma fada Timothy.” Timothy, assustado, respondeu ofegante – “Então me prova que você é uma fada! Você é muito feia!” O rosto disse –“Nunca aprendeu a não julgar pelas aparências? Muito bem, vou te provar que sou mesmo uma fada. Amanhã, assim que o Sol raiar, siga andando pela estrada que leva na direção do vale, e você verá que estou dizendo a verdade.” Então a vela se apagou, e naquele dia, Timothy não viu, e nem ouviu mais nada. Logo que amanheceu, o menino começou a caminhar pela estrada na direção do vale, e não demorou para notar que meia dúzia de pássaros grandes e mal-cheirosos rodeavam uma cesta no chão, logo à frente em seu caminho. Dentro da cesta haviam muitos doces. Timothy sorriu, e quando foi pega-la, segurou sobre uma mão, pálida, e fria que estava agarrada na alça de um dos lados. Deu um pulo com o susto, e voltou correndo.
Naquela noite, Timothy esperava a última vela em sua casa se apagar, quando ouviu mais uma vez a misteriosa voz “Timothy! Timothy!” O garoto foi até onde estava o espelho velho, e viu aquele mesmo rosto que ele tinha visto na noite passada. – “Eu te provei que sou mesmo uma fada. Na próxima noite, eu quero que você se esconda o melhor que puder. Você precisa se esconder Timothy!” Em seguida a vela se apagou, e naquele dia Timothy não viu, e nem ouviu mais nada. Na noite depois daquela, Timothy decidiu fazer o que o rosto tinha dito a ele, e, quando anoiteceu, se escondeu abaixo das tábuas do piso de sua casa. Quando sobrou apenas uma única vela acesa, alguém bateu na porta. A madrasta de Timothy foi ver quem era, e a abriu. Tratava-se de um homem vestido com uma capa muito preta, que bateu no rosto da madrasta de Timothy,agarrou o pescoço dela, e a sufocou, até que ela morreu. O malfeitor revirou a casa, e depois saiu sem levar nada.
Timothy saiu de seu esconderijo, percebendo o que havia acontecido, quando ouviu aquela voz – “Timothy! Timothy!” Timothy foi olhar o misterioso espelho. A última chama de vela teimava à se apagar. – “Timothy, existe uma maneira que você pode me agradecer por ter te salvado. Você precisa me enterrar junto com a sua madrasta, para que assim, possa sempre se lembrar de mim.” O menino estava com muita raiva daquilo tudo. Pela manhã, Timothy pegou o espelho, e foi caminhando até a cidade. No percurso, ele podia ouvir aquela voz arrepiante o chamando. Não queria quebrar o espelho, então o deixaria onde pudesse ser encontrado. Quem sabe quando espelhos antigos podem aprisionar a alma de uma fada.
FIM
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O retrato de Eufânio
Vera comprou uma casa sobre a colina. De lá, era possível ver toda a cidadezinha. Os móveis eram os mesmos de quando a casa tinha sido construída, antigos, feitos de madeira. Além dos móveis, a única coisa que havia na casa quando Vera se mudou, era um retrato do antigo morador, Eufânio. Vera sabia pouca coisa sobre os antigos moradores, sabia somente que eram um casal. E em um certo dia, quando Vera olhou para aquele retrato, viu que, ao invés de estar ali a imagem do rosto de Eufânio, havia uma cena. Mostrava um antigo moinho de vento, que Vera já tinha visto lá por perto, e também uma árvore com os galhos secos. Quando piscou os olhos, a imagem do retrato voltou ao normal.
Vera comentou com um dos vizinhos sobre o que tinha visto. O vizinho disse que, pouco depois que a mulher de Eufânio desapareceu, ele se enforcou naquela árvore do lado do moinho de vento. Durante a ocasião seguinte, Vera viu no retrato o próprio Eufânio de corpo inteiro, na frente da porta do antigo moinho de vento. E não demorou para que acontecesse outra vez, quando Vera olhou para o retrato e viu a imagem de Eufânio, de joelhos, e chorando no interior daquele moinho. Vera decidiu ir até o moinho, e bem onde Eufânio estava chorando, tinham pedras soltas no chão. Vera retirou as pedras, e encontrou um esqueleto.
Eram os ossos da mulher do Eufânio. E ao lado, estava uma faca que Eufânio usou para assassiná-la, e também uma carta de confissão. A carta dizia: “Silmara! Minha amada Silmara! Durante quarenta e cinco anos, eu te disse para jamais abrir a caixa. Canael me avisou, antes e depois! Mas tu o fizeste, e agora não posso deixar que ele leve também a sua alma. Acertei-a no coração com esta faca, para que não haja tempo de que ele venha. Enterrarei a caixa fundo, abaixo da velha árvore, já eu, estou amaldiçoado. “ Quando Vera voltou para casa, o retrato tinha mudado para uma cena de paisagem, e nunca mais mostrou o rosto do antigo morador. Vera avisou sobre o corpo que encontrou no moinho, mas jamais mostrou a carta para alguém, e nem mesmo procurou por aquela tal caixa.
FIM
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Kátia e o gato preto
Uma jovem chamada Kátia, tinha a pouco tempo, rompido com o
seu noivado. Estava desamparada, e, em certo ponto, concluiu que se mataria.
Antes de morrer, Kátia decidiu ir dar uma volta, caminhando pelas ruas. Eis
que, ao decidir que já era hora de retornar, e colocar um fim em sua vida, um
gato preto atravessou logo à sua frente no caminho. O gato cruzou os olhos com
os de Kátia, e a moça ouviu um sussurro em sua mente, que lhe dizia que aquele
gato, seria o amor de sua vida.
Kátia pegou o gato com as mãos, e levou-o para casa. Ao
chegar, incrivelmente, aquele gato se transformou em um homem, com a beleza e a
elegância de um verdadeiro príncipe. Kátia e seu príncipe se amaram por anos. Até
que um dia, Kátia, que tinha se apaixonado por uma pessoa, foi ao seu príncipe,
infiel. Durante a noite, quando Kátia voltou para casa, os olhos do gato se
encontraram com os seus, e um fogo queimava no interior dos olhos do felino.
Foi então, que o corpo de Kátia ficou envolto em chamas, até que ela
desapareceu, restando apenas pó.
FIM
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O fantasma do índio Raposa Vermelha
No passado, muitos índios habitavam as planícies e as
colinas. Um deles, foi o índio Raposa Vermelha. Raposa Vermelha era conhecido
por dançar durante dias seguidos, sem parar, e também por causa de sua extrema
longevidade. Mesmo aparentando ter trinta anos, Raposa Vermelha já tinha cento
e trinta anos. Os xamãs o respeitavam, e, alguns até mesmo o veneravam,
dando-lhe oferendas. Dizem, que Raposa Vermelha foi morto pelo tiro de uma arma
de fogo, quando o homem branco veio, mas o seu espírito, às vezes, volta para
dançar na terra onde ele costumava viver. Foi o que um grupo de aventureiros
soube. E eles quiseram averiguar por si mesmos.
Com suas mochilas nas costas, o grupo acompanhou um guia
local, e durante a ocasião em que passavam pelo território onde viveu o índio
Raposa Vermelha, o guia contou-lhes um pouco sobre a lenda do espírito do
índio, que, às vezes, era avistado dançando por ali, principalmente durante as
noites de lua minguante. O grupo riu, e foi até uma cabana nas redondezas para
passar a noite.
Eles conversaram, e decidiram naquele momento, ir até o
lugar onde lhes foi dito ser assombrado pelo fantasma do índio Raposa Vermelha,
afinal, era uma noite de lua minguante. Aquela decisão, eles jamais poderiam
esquecer. Mesmo com toda aquela emoção, nenhum deles acreditava realmente que
veria o fantasma do índio.
E não demorou muito, para que, à partir de um redemoinho de
vento, aparecesse a imagem de um índio, dançando ferozmente. Seus longos fios
de cabelo, avermelhados, e a cor de seu corpo, azulada. Vestia roupas de pele
de búfalo, e em sua mão direita, o fantasma segurava um chocalho, que sacudia
conforme o balanço de sua dança. Os pés não tocavam o chão, e levantavam uma
nuvem de poeira. Uma voz fantasmagórica cantava no antigo idioma indígena. Era
o fantasma do índio Raposa Vermelha.
Apesar do susto, alguns se deixaram envolver pelo ritmo, e
passaram a dançar junto ao fantasma. Outros, decidiram voltar. Na manhã
seguinte, os que haviam retornado para a cabana na noite passada, ouviram a
porta bater. Eram os que tinham ficado com o índio. Estupefatos, viram que,
aqueles que haviam ficado, e dançado com o fantasma do índio Raposa Vermelha,
envelheceram quarenta anos, da noite para o dia.
FIM
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O guarda-roupas da Tia Anastácia
Luisinho, sempre ao passar de três meses, visitava a sua tia Anastácia. Como a casa era bem grande, e sua tia muito séria, sendo um garoto de onze anos de idade, Luisinho passava o dia todo correndo, para um lado, e para o outro. Quando sua tia não estava obrigando que ele fizesse alguma coisa, o garoto gostava de bisbilhotar os quartos, quase sempre cheios de coisas antigas, espalhadas por toda parte. Em toda a casa, havia apenas um guarda-roupas, o qual sua tia lhe avisava para que ele não o abrisse, e que ficasse longe. Tia Anastácia vivia sozinha, e sempre se recusou em ter alguém que a ajudasse com a limpeza, e com os afazeres da casa. –“Luisinho você não esta pensando em abrir o guarda-roupas, esta?” -“Óh! Eu não, tia Anastácia! Eu só estava vendo o quanto ele está empoeirado..”
O guarda-roupas era enorme, e Tia Anastácia dizia que seu tataravô guardava doces e frutas nele, ao invés de roupas. –“Luisinho! Este guarda-roupas já está fechado a muito tempo, e é melhor que continue assim. Não sabe que é errado bisbilhotar a casa dos outros?” –“Tudo bem tia Anastácia.”Luisinho prontamente saiu daquele quarto, mas esqueceu uma barra de chocolate em cima da mesa. Durante a noite, Luisinho ouviu barulhos na casa, e levantou-se da cama. Nas pontas dos pés, seguiu os ruídos até o quarto onde estava o guarda-roupas proibido.
O móvel sacudia de um lado para o outro. Luisinho chegou mais perto, e abriu de uma vez só, o guarda-roupas. Naquele momento, saiu voando de dentro do guarda-roupas, uma barata enorme. Luisinho fugiu, correndo, e a barata foi logo atrás dele. Tia Anastácia estava no corredor, e o menino passou por debaixo das pernas dela, até sair para fora da casa. A barata, sem demora, devorou a Tia Anastácia.
FIM
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A ilha proibida
Carlos, Velma, e Clarissa, eram amigos, e pretendiam passar um feriado emocionante, ao alugarem um barco para explorar o alto mar, mesmo contra as advertências dos marinheiros mais sensatos. Era algo que haviam há um bom tempo planejado. Moura, foi o marujo que partiu junto com eles, contratado; Um experimentado homem do mar que concordou em aceitar o trabalho em troca de um favor: depois que tivessem terminado a aventura, eles o levariam até a terra natal dele, uma ilha pouco conhecida, à qual os nativos chamam de A Ilha do Escorpião. Moura contou-lhes que o nome se justifica por causa do formato da ilha, que vista de longe assemelha-se a um grande escorpião. O marujo também disse a eles que só é possível chegar naquela ilha com a permissão do mar, não importa o quão possante seja o barco, ou habilidosa seja a tripulação.
Caso não tivessem a permissão do mar, as ondas sempre levariam o barco para longe de lá. Quando os amigos perguntaram para Moura, se é possível chegar até lá de avião, ou pelo menos sobrevoá-la, o marinheiro ficou aborrecido com a pergunta, e somente respondeu rispidamente, que A Ilha do Escorpião é uma terra de gente do mar, e não do tipo da gente deles, que invade toda parte, e considera a si mesma os donos do mundo. Como parte do combinado, antes de partirem, Moura também falou para o grupo que, quando chegassem na Ilha do Escorpião, só ele mesmo deveria sair do barco, e entrar naquela terra, embora, de todas as condições impostas, e combinadas, esta foi a que menos os amigos deram importância, e, prontamente concordaram. A bordo do ligeiro Andorinha, o grupo visitou meia dúzia de paraísos tropicais isolados na imensidão do mar.
Uma empreitada perigosa, que por mais de uma vez, quase custou-lhes a vida, ficando à mercê de violentas tempestades, e até tendo que fugir de bandidos, e piratas, num nervosismo alucinante, que, por um triz, e graças a perícia de Moura em navegar, foi que conseguiram. Levando em conta os poucos momentos que tiveram de tranqüilidade, e todas aquelas situações perigosas por que passaram, esta era do tipo de aventura que só se pode recordar com alegria depois que ela termina, e todos regressam à segurança de seus lares. Moura, constantemente fazia questão de se certificar, de que, os três, se lembravam do acordo que haviam feito. Já há dois dias, que Velma e Clarissa só faziam praguejar, e culpar, ora à um, ora à outro, por acabarem naquela situação.
Carlos estava apático, parecia doente, e quase não falava, mas tinha consigo uma curiosidade em ir até aquela Ilha do Escorpião. De qualquer modo, os três amigos dependiam do guia que contrataram, se quisessem ter alguma chance de voltar sãos e salvos. –“Ali está ela!” o marinheiro tomou o controle do barco, quando fortes ventos começaram a agitar as ondas. –“Palua Ta Mo! Palua Ta Mo!” Moura gritava estas palavras, enquanto tentava manter o barco na rota correta. De repente, os ventos cessaram, e o mar se acalmou. A Ilha do Escorpião podia ser vista não muito longe de onde eles estavam, e a forma dela era mesmo muito parecida com a de um escorpião. Uma grande elevação de terreno em um dos lados, com uma curva, lembrava a cauda de um escorpião; E também onde não tinham rochedos ao redor dela, haviam duas praias que davam a forma das patas. Velma se aproximou de Moura, e perguntou o que eram aquelas palavras que ele tinha dito. –“É o meu nome de batismo!” disse o marinheiro, dando em seguida um sorriso. O que aconteceu dali em diante, foi que, depois que Moura desceu do barco, os três amigos também decidiram desembarcar e conhecer o lugar, contrariando o que havia sido combinado. Depois de subirem e descerem por caminhos difíceis, e não sabendo para onde estavam indo, Carlos, Velma, e Clarissa, chegaram à um ponto, no qual, era possível ter uma visão das duas praias da ilha. O lugar era todo muito bonito. Haviam pessoas em uma das praias, e também casas construídas nela. Na outra praia, o cenário era bem selvagem, e encantador.
Velma decidiu que voltaria para o barco. Clarissa decidiu que iria até a praia onde haviam pessoas. E Carlos se sentiu atraído pela praia aparentemente inabitada, que lhe tinha um aspecto provocante.
Velma voltou ao barco, e depois de algum tempo, reencontrou o seu guia, e teve de explicar a ele o que havia acontecido. Moura disse a Velma que os dois, Carlos e Clarissa, estavam perdidos, e que não adiantaria esperar por eles. Depois disso, a maneira que Moura olhava para Velma mudou. O marujo a encarava com um olhar frio, e ao mesmo tempo enigmático.
Um olhar que fazia Velma desconfiar dele.
Quando Clarissa chegou na praia, algumas das pessoas estavam indiferentes à ela, enquanto outras, pintaram o corpo dela, e a adornaram, com tiaras de flores, e enfeites de pedras. Clarissa, mais tarde compreendeu que, para a maioria das pessoas, era impossível sair daquela ilha. Por mais que a impressão fosse a de estar se afastando, não se podia ir adiante de certo ponto. Logo depois que Carlos entrou na praia aparentemente vazia, viu muitas pessoas saindo de esconderijos, com os corpos pintados e usando máscaras. As pessoas saíram de dentro de arbustos, e debaixo de buracos na areia, e então, com violência, o amarraram, e o arrastaram para outro lugar, enquanto gritavam, e erguiam lanças. Dos três amigos, Velma foi a única que voltou para casa.
FIM
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Dona Lurdes e o gnomo de jardim
Dona Lurdes morava em uma casa pequena e simples, feita de cimento, e alvenaria em cerâmica. Sua casa tinha um jardim modesto na parte dos fundos, circundado apenas por uma cerca baixa, feita com tábuas de madeira. Como morava sozinha, a vegetação de seu jardim havia progredido de forma emaranhada, que dona Lurdes aparava apenas o essencial. Havia também em seu jardim um gnomo de pedra, que estivera naquele jardim desde muito antes de Dona Lurdes nascer, embora sua estrutura ainda permanecesse intacta, e com inúmeros detalhes.
Foi quando Dona Lurdes resolveu deixar uma pequena moeda de um centavo em oferenda aos espíritos da natureza, no patamar sólido de pedra em que o gnomo estava sustentado. No dia seguinte, Dona Lurdes se surpreendeu, ao notar que a posição em que antes estavam as mãos do gnomo, já não era mais a mesma, e haviam três moedas de um centavo onde ela havia deixado apenas uma.
Os dias se seguiram então, de forma que Dona Lurdes fazia oferendas, sucedidas de estranhos acontecimento relacionados a isso no dia seguinte.
Dona Lurdes preferiu ignorar os movimentos que sempre aconteciam no corpo de pedra do gnomo em seu jardim, e convenceu-se, de que alguns dos acontecimentos esquisitos eram brincadeiras dos muitos pedintes que viviam na redondeza. E foi por isso, que um dia resolveu deixar um pedaço de pão com carne, e uma fatia de queijo. No dia seguinte, havia um gato morto ao lado da estátua de gnomo. A cabeça do gato tinha sido arrancada, e em seu lugar, estava uma moeda de ouro. Todas as vezes que Dona Lurdes oferecia algo que continha carne, apareciam no dia seguinte animais mortos em seu jardim, vez coelhos, outras gatos, ou cachorros, e juntamente de seus corpos, uma moeda de ouro.
Certa noite, um pedinte das redondezas aproximou-se daquela casa, para pegar um pernil que havia sido deixado ali por Dona Lurdes à pouco. O homem passou por cima da pequena cerca, e se esgueirou até o pedaço de carne, quando de repente, o rosto do gnomo se modificou na forma de uma terrível, e assustadora expressão. Diante da cena, o pobre pedinte teve um ataque cardíaco, e morreu, ali mesmo, no jardim de Dona Lurdes; O seu corpo nunca foi encontrado. À partir daquela noite, durante todas as noites, o gnomo desaparecia do jardim, sempre que Dona Lurdes desviava por um instante os olhos dele, e alguém da comunidade era dado por desaparecido no dia seguinte.
Dona Lurdes jamais em sua vida comentou sobre o que acontecia em seu jardim com alguém que fosse, e dizem que, mesmo depois que toda a pequena comunidade sumiu sem deixar vestígios, existe coberto pela vegetação um jardim em que o gnomo desaparece durante a noite.
FIM
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O mendigo e a pomba
Joselmo não tinha casa, e dormia debaixo do viaduto. Era um homem com pouco mais de quarenta anos de idade, uma pessoa marcada com uma expressão de tristeza, e sem nenhum objetivo pessoal além dos pequenos afazeres básicos e inconvenientes ocasionais do seu dia-a-dia. Como já vivia na rua faziam dez anos, estava acostumado com a companhia dos animais que vivem na cidade. Ratos, cachorros, pombas, e os insetos, eram a Joselmo uma presença constante.
Desde um escuro fim de tarde, sua vida tomou um rumo sombrio. Naquela tarde, enquanto Joselmo caminhava sobre o viaduto, as pombas que estavam no chão, logo ao seu lado, alçaram vôo, e uma delas pousou sobre seu rosto, não querendo depois sair dali.
Era uma pomba quase tão negra como a noite, e seus olhos encaravam os de Joselmo. Havia também uma marca de cicatriz dividindo o rosto daquela pomba entre os olhos.
Aquele olhar era assustador para Joselmo, e parecia ter um requinte de maldade neles. Cambaleando, Joselmo chegou próximo da beirada da ponte, e por pouco não caiu lá de cima, quando a pomba alçou vôo. A lembrança daquela pomba passou a assombrar Joselmo, e às vezes, ele a reconhecia voando junto das outras, por causa da cicatriz que ela tinha entre os olhos.
Joselmo estava à mendigar em um cruzamento de ruas, quando aquela mesma pomba surgiu voando à poucos metros de seu rosto, o encarando, e em seguida ela se distanciou, deu um giro no ar, e pousou no capacete de um motoqueiro que vinha tomando velocidade. A pomba como que por vontade própria, forçou o motoqueiro a ir sem poder enxergar na direção de Joselmo, que foi atropelado e quebrou uma das pernas. Joselmo foi socorrido, e levado à um hospital público.
Com uma de suas pernas enfaixadas, e sentado em uma cadeira de rodas, Joselmo estava à sair do hospital, sendo conduzido por um enfermeiro, e para seu total horror, a pomba o esperava, voando em círculos do lado de fora. Joselmo naquele instante perdeu o controle sobre as próprias emoções, e se debateu em pânico, fazendo com que o enfermeiro sem querer soltasse a sua cadeira. Sem o controle de sua trajetória, Joselmo despencou em um córrego de esgoto. Depois disso, Joselmo ficou doente, e pareceu também perder o contato com a realidade, até que com o passar de pouco tempo, faleceu.
FIM
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O ataque de Clodoal
Soprava o vento levantando a poeira da terra, e Clodoal, um pobre trabalhador rural, embaixo do sol, trabalhando desde a manhã do dia anterior, noite e dia sem parar, com a enxada revirando o solo. A sua mente constantemente lhe falava sobre o quão injusta era aquela condição para o seu corpo, e a necessidade o lembrava do quanto precisaria trabalhar, sem descanso, para conseguir pelo menos o mínimo e não morrer de fome. Atordoado pelo cansaço, os pensamentos de Clodoal começaram a deixa-lo confuso, e muito irritado, influenciado por tendências demoníacas. Clodoal, aos poucos, ia usando a sua enxada com cada vez mais força, e, às vezes, berrava lamentações. “–Oh Inferno! Mais que maldição essa minha, ai meu pai!” O capataz ouviu de longe os gritos e foi falar com ele. “-Oh Clodoal! Vai fica com essa choradeira homem? O cê ta assustando as moça lá na casa. Se quiser o trabalho é melhor ficar quietinho. Leva esse cavalo daqui.” O capataz puxou um cavalo até próximo de Clodoal. O animal era velho, e já era a hora dele. O cavalo tombou morto encima de Clodoal, que estava desatento descansando abaixado. Clodoal se contorceu, e pegou um facão que estava guardado em sua cintura, que usou para enfiar no cavalo, abrindo um buraco. Depois, usando uma força sobre-humana, Clodoal forçou passagem através do cavalo com a sua enxada, rasgando a carne a as vísceras do animal, despedaçando-o, e fazendo o sangue jorrar por toda parte. A aparência de Clodoal estava transfigurada, meio-homem meio-animal. Haviam dois pequenos chifres saindo do topo da sua cabeça. Os olhos dele estavam totalmente na cor vermelha, e misturado com os seus grunhidos havia um riso histérico. O sangue do cavalo entrou na boca seca de Clodal, e também em seu nariz, olhos e ouvidos. Isso pareceu hidratá-lo, e revigorá-lo. Clodoal foi tomado por um êxtase de fúria, e segurando no cabo de sua enxada, rodopiou, girando o instrumento com muita força, atingindo o pescoço do capataz e decepando a sua cabeça. Sem voltar a si, começou a devorar os corpos, até quando ouviu o barulho de um tiro. Coberto de sangue e restos mortais, Clodoal correu até a cerca da fazenda e ficou preso no arame tentando saltá-la. As mulheres dizem ter assistido quando um boi assustado investiu contra ele, tirando a sua vida. E o corpo de Clodoal teria sido deixado ali mesmo, para ser devorado pelos urubus.
FIM
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Pedro e os extraterrestres
Pedro estava dirigindo já faziam muitas horas, indo para a casa de sua mãe no interior. A viagem era de muitos dias, e durante esta ocasião, havia pego uma estrada que o levou a uma região inóspita, bem afastada de qualquer cidade. Pedro notou um pequeno ponto luminoso que estava se movendo no céu, paralelamente ao seu veículo. Primeiramente Pedro acreditou que era uma estrela cadente. Possivelmente um detrito espacial que estava se queimando ao entrar na atmosfera terrestre. Mas este pensamento começou a parecer improvável, quando o ponto luminoso alterou a direção do seu curso igualmente ao veículo de Pedro. Um pouco nervoso, Pedro reduziu a velocidade do carro, e, percebendo que seja o que fosse aquilo também estava reduzindo de velocidade, parou, e desceu do carro. Aquela luz branca, meio azul, já estava bem forte, e se aproximava ainda mais, voando no céu. Pedro conseguiu reconhecer de onde aquela luz estava saindo, e também que saia de uma forma oval, que estava flutuando quase sobre a sua cabeça. De cima daquela forma oval, algo com forma de uma pirâmide roxa começou a levantar, fazendo um barulho bem grave esquisito, soava como algum tipo de frequência especifica. Pedro, que estava com muito medo, entrou em seu carro e deu a partida, pensando em sair dali o mais rápido possível. Logo que o motor do carro ligou, alguma força ergueu o veículo com Pedro dentro alguns metros acima, fazendo com que as rodas girassem em vão. Capturado por aquilo, Pedro fez uma viagem de alguns minutos em baixa altitude, até que, começou a aumentar de velocidade e subir mais alto. Neste momento, Pedro achou que morreria congelado ou sem ar, quando foi tragado junto com o seu veículo para um compartimento naquela nave. Haviam muitas luzes, de muitas cores. E quando as luzes batiam em seu corpo produziam algum tipo de efeito. Quando a sala estava vermelha, Pedro podia ver o seu próprio esqueleto. Quando a luz estava verde, Pedro podia ver com detalhes o desenho de seus próprios músculos. Uma imagem holográfica apareceu na frente do carro. Parecia algum tipo de criatura, e era difícil saber o que pertencia ao corpo dela e o que podia ser algum tipo de roupa ou talvez um adorno. Pedro sentiu de repente muito sono, e relutantemente, fechou os olhos e dormiu. Durante algumas vezes, acordou no que pareciam ser sessões programadas para testar o seu psicológico, e percebia que o seu corpo estava preso e haviam instrumentos presos a ele. Quando acordou mais uma vez, Pedro estava em seu carro, na beira da estrada. Daquele dia, Pedro além de suas lembranças, guarda alguns sinais em seu corpo, com formas complexas e bem desenhadas.
FIM
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A assombração no tocador de discos
Matias de nove anos de idade, e os outros garotos amigos dele sabiam que havia por perto uma casa bem grande e antiga, onde ninguém mais morava já faziam muitos anos. Diziam, que aquela casa era assombrada. O ocorrido naquela residência permaneceu um segredo para a maioria das pessoas naquela cidade. Muitos casos sinistros e sombrios aconteceram naquele lugar, onde no passado foi um local para cerimônias com sacrifícios de um antigo povo ameríndio. O último morador, Alfredo, sentiu que deveria cavar um buraco na casa. Alfredo vinha ouvindo vozes em sua cabeça, e também via aparições quando estava em casa. Depois de cavar alguns metros, Alfredo encontrou um artefato que pertencia a uma antiga civilização que habitou aquele lugar. O artefato era um talismã feito com ouro e uma pedra preciosa. Alfredo já tinha mais de sessenta anos, e não trabalhava mais, passava o tempo todo ouvindo música no seu tocador de discos, e polindo o talismã que encontrou. Alfredo chegou a mostrar o artefato para alguns dos vizinhos. Certa noite, enquanto dormia, Alfredo sonhou que quatro homens fortes com pintura nos corpos entraram em seu quarto e o erguerem segurando-o nas pernas e nos braços. Um quinto homem apareceu então segurando o talismã, e um punhal de sacrifício. No momento em que o punhal de sacrifício atingiu o peito de Alfredo, o coração dele parou e ele morreu. O tocador de discos permaneceu no mesmo lugar desde então, até o dia em que Matias e os amigos dele entraram naquela casa. O clima pesado logo afastou os meninos, mas Matias decidiu levar alguma coisa de recordação, e o tocador de discos pareceu perfeito. Matias decidiu testar o aparelho e colocou um disco. O tocador começou a tocar o disco, mas depois de alguns segundos, algo além da música estava aparecendo. Era a voz, um pouco distorcida, de Alfredo. Matias que achou aquilo estranho, mostrou ao seu pai e a sua mãe. Quando as vozes começaram, os dois desligaram o tocador, e disseram que estava com defeito. Depois deste acontecimento, tudo mudou. Diversas vezes os objetos da casa se quebravam sozinhos, ou batiam em algum lugar com força. Desconfiados que o tocador de discos era a causa daquilo, a família decidiu que levaria o tocador para outro lugar, mas antes, quiseram toca-lo mais uma última vez. Quando deixaram que a voz prosseguisse, ouviram um homem dizendo que em uma determinada localização estava o talismã maldito, e que horríveis acontecimentos estavam se passando. Em seguida a voz deu instruções sobre o que a família deveria fazer. Depois, a voz desapareceu e não apareceu mais. A família decidiu mesmo assim que não ficaria com o tocador de discos, e o deram para outras pessoas. Depois de uma longa conversa entre eles, decidiram ligar para a polícia e dar o endereço que a voz disse para eles. E foi tudo o que eles fizeram.
FIM
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O robô Sphinx
O cientista Peter Asakov e a sua equipe de engenheiros
construíram um robô dotado com um super processador, capaz de aprender. O robô
foi projetado na forma de um ser humano, e seu criador, deu-lhe o nome: Sphinx.
Sphinx foi programado para ajudar a humanidade. No dia em que o robô de Asakov
foi ligado, aprendeu a se movimentar, e aprendeu também todos os principais
idiomas do mundo. No segundo dia, o robô aprendeu matemática, química, física e
astronomia. E no terceiro dia, Sphinx aprendeu sobre história, sociologia e
geografia. Logo nas primeiras semanas, o robô Sphinx descobriu soluções para
antigos problemas científicos, e possibilitou grandes avanços em diversas áreas
do conhecimento humano. Mas, nem mesmo os criadores daquele robô, compreendiam
a complexidade de todos os processos que aconteciam em seu cérebro eletrônico.
Mesmo assim, o cientista Peter Asakov enriqueceu, e seu robô, conhecido por um
comportamento bastante autônomo, ficou extremamente popular. Sphinx se comunicava
com as pessoas graciosamente e arrancava ovações com seu jeito cavalheiresco e
frases bem articuladas. Sphinx, também ficou logo conhecido pelo doutor Peter
Asakov e os mais próximos, por muitas vezes se negar a agir como queriam que
ele agisse, baseado em suas afirmações, de que podia calcular muito mais à
frente do que os humanos, e assim, decidir de forma que seria melhor para toda
a humanidade. Dois anos depois de que foi ligado, Sphinx candidatou-se ao cargo
de prefeito de sua cidade. O robô ganhou a eleição, e no dia de sua posse foi
presenciar um concerto musical. Sphinx, o robô, ficou intrigado com as lágrimas
que a música tirou de um homem, e de como aquelas sequências de notas podiam
mexer com as pessoas. Afinal, por que as sucessões de notas eram consideradas
especiais pelos seres humanos? Sphinx não entendia o que era a música. Para o
robô, músicas eram somente notas sequenciadas em padrões organizados. Ao
constatar isso, Sphinx concluiu que lhe faltava alguma coisa. Talvez lhe
faltasse aquilo que os seres humanos chamavam de “alma”. Sphinx achou que precisava entender o que a
humanidade sentia, para melhor ajudá-la. E, em certa ocasião, o robô de Asakov
ficou à sós com o melhor amigo do seu criador, o doutor Fyodor Minsky. O robô
dopou Fyodor com uma injeção, e levou-o para o laboratório no meio da noite.
Com todo o conhecimento que Sphinx possuía de medicina, biologia e robótica,
removeu o cérebro do doutor Fyodor e anexou-o ao seu próprio processador, dessa
maneira, adquirindo o conhecimento das percepções e capacidades imaginativas de
um ser humano. Peter Asakov chegou ao local, e se deparou com o cadáver
mutilado do seu amigo que jazia sobre a mesa ensanguentada, enquanto a sua
criação robótica, havia se ligado ao seu cérebro, mesclando a carne aos seus
circuitos. Diante daquela cena grotesca, Peter Asakov gritou: -“O que você fez?!”. E o robô respondeu com a
voz do seu amigo Fyodor: -“Peter, a culpa é sua. Veja o que o seu robô fez
comigo.”. Sendo dominado por aquela estranha força vingativa, o robô Sphinx
golpeou o cientista Peter Asakov na cabeça, matando-o. Em seguida, se
auto-destruiu, com uma grande quantia de explosivos. Em seus momentos finais,
capturados pelas câmeras de segurança, Sphinx cantarolou uma velha canção. Mais
tarde, quando acessaram os dados no processador do robô destruído, encontraram
planos aterrorizantes, como eliminar metade da população mundial em benefício
da outra metade, estratagemas para manipulação das massas, dentre outros meios
cruéis que o robô considerava como necessários para o bem maior da
humanidade.
FIM
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O povo de baixo
Erivaldo, um bibliotecário de quarenta e cinco anos, morava com sua mulher e seus três filhos em uma cidade do interior. Na maioria do tempo, trabalhava para sustentar sua família, e sempre tinha levado uma vida rotineiramente pacata, tendo conhecido aventuras emocionantes somente nos livros. Porém, desde criança, Erivaldo alimentou sua imaginação com o conteúdo literário, e há muito sonhava se aventurar como explorador em regiões inóspitas, desbravar as fronteiras do mundo conhecido pela sociedade e quem sabe até fazer contato com civilizações desconhecidas.
Folheando um velho e pesado livro, que ele tinha descoberto guardado dentro de um cofre na biblioteca, e de título “O Domador de Carneiros”, Erivaldo encontrou um pergaminho entre as páginas. Era um mapa daquela região no passado. Erivaldo reconheceu alguns montes e rios desenhados. Um traço indicava uma rota no mapa. Ele não sabia ao certo o que havia no local no tempo presente. Poderia ser uma reserva, um sitio ou uma comunidade, mas ainda havia muita natureza virgem na região.
Erivaldo se sentiu entusiasmado em investigar. Aquela aventura não estava longe dele, não precisaria pegar um barco e cruzar os oceanos ou fazer uma longa viagem de trem ou avião. Era acessível e emocionante! Decidiu que não adiaria sua jornada, pois com essa idade, ainda poderia carregar uma mochila pesada, escalar, correr ou até mesmo lutar, e seu corpo não fraquejaria facilmente.
Após uma pesquisa, estimou que sua caminhada levaria cerca de dois ou três dias, através de uma mata densa, e natural, que não tinha sido plantada. Cuidou sem demora dos preparativos, e deixou uma boa quantia de dinheiro que tinha guardado para sua família, assim poderiam se manter na sua ausência.
Em sua mochila, Erivaldo levou uma corda de náilon, doze litros de água potável, carne seca, cereais, e uma faca. Para seguir a trilha demarcada em seu mapa, Erivaldo teve de subir e descer colinas selvagens, dormindo por duas noites sobre galhos, até que se deparou com um paredão íngreme de pedra. Tinha seguido todas as pistas que conhecia sobre o local e que coincidiam com o mapa. Identificou um lago, um rio, uma grande montanha, todos estavam de acordo com a localização que indicava as gravuras no documento, e ali estava agora. Avançar mais um dia inteiro seria perigoso, pois suas provisões seriam insuficientes. Já se sentia cansado, e estava para se afastar dali no intuito de circundar o paredão, afim de ir um pouco mais adiante, quando notou desenhos petróglifos, gravados na rocha. Os traços inscritos na pedra quase lhe passaram desapercebidos, parcialmente ocultos abaixo de folhas e raízes. Descobriu uma extensa variedade de desenhos no local, em sua maioria, representando figuras metade homem, metade animal, como pássaros ou jacarés. Outras imagens tinham semelhança com o sol, a lua, cervos e árvores. Havia uma grande imagem central, com a forma de pirâmide inversa, que apontava para baixo.
Examinando o solo abaixo do paredão, Erivaldo viu uma grande pedra polida, baixa em altura, mas larga e comprida. Decidiu mover a pedra, e, quando o fez, revelou-se abaixo dela um túnel, que descia metros abaixo. Erivaldo levou alguns minutos para conter a tremedeira que dominou o seu corpo ao descobrir aquela passagem secreta. Coberto de suor, amarrou a corda em um tronco de árvore, e desceu os cerca de três metros bem devagar. Ali embaixo percebeu um caminho que levava mais para fundo nas profundezas da terra. Ouviu um estranho canto, com muitas vozes entoando juntas. Seguiu cuidadosamente pelo estreito caminho, por dezenas de metros, até que no fim do corredor, viu um ponto de luz tremeluzente. Se aproximou e viu uma abertura entre rochas, por onde se podia vislumbrar um espaço bem grande do outro lado, iluminado por tochas, e lotado de pessoas. Havia uma pirâmide inversa que descia do teto até a ponta quase tocar o chão. Parecia claro que se tratava de alguma cerimônia. Os cânticos continuavam como rezas, em um idioma desconhecido para Erivaldo. Haviam muitas outras passagens ligadas ao local grande onde aquelas pessoas estavam, e mais pessoas chegavam. Podia vê-las a uma distância de uns quinze metros abaixo, por uma extensão de dezenas de metros, e muitas eram horrivelmente deformadas. Erivaldo pensou que talvez pudessem ser um antigo povo, que há muito tempo decidiu ir viver no subterrâneo e permaneceu até então sem ser notado pela civilização da superfície, como adoradores do submundo. Ele mesmo estava em um acesso para aquele mundo subterrâneo, mas que por algum motivo estava bloqueado por uma barreira de pedras sobrepostas.
Um calafrio lhe percorreu a espinha ao ver um casal nú ser levado até um altar central por seis pessoas, logo abaixo da ponta da pirâmide, e ali, foram pendurados de cabeça para baixo, e depois degolados. Uma mulher surgiu dançando entre aquelas pessoas. Estava quase nua, com o corpo pintado, usando muitos colares e pulseiras, como uma xamã. Todos abriram caminho para ela, que se aproximou dos dois corpos que já estavam provavelmente mortos e encheu um crânio humano com o sangue deles. Depois ela dançou ao redor dos corpos segurando o crânio cheio de sangue, e quando a xamã bebeu o sangue do crânio, um ruído agudo começou a apitar no ouvido de Erivaldo, como uma ressonância crescente. Então, subitamente a mulher parou de dançar. Um silencio tomou conta do lugar. A mulher xamã olhou bem nos olhos de Erivaldo e apontou em sua direção, dando um grito. Todos olharam em sua direção. Erivaldo levou um susto, e, apavorado, se afastou dali, voltando pela passagem às pressas, e subindo de volta pela corda até a superfície. Correu para voltar até a sua cidade, mas ainda estava a mais de um dia de distância. Na primeira noite durante o caminho de volta, decidiu que, só por precaução, não iria dormir muito exposto. Subiu em uma árvore, e mesmo desconfortável, conseguiu se ajeitar nos galhos. No meio da madrugada, acordou com passos sobre a mata. Eram três ou mais daqueles homens que tinha visto no subterrâneo. Reconheceu as vestimentas de peles deles. Foi tomado pelo pavor e teve de tapar a própria boca para não gritar. Deviam estar procurando por ele. Mas não o viram.
Quando amanheceu, aqueles homens já tinham desaparecido. Erivaldo desceu de cima da árvore e continuou o caminho de volta, até que retornou a sua casa. A partir de então, Erivaldo passou a carregar um medo constante de que estava sendo seguido por pessoas do submundo.
Erivaldo passou os três meses seguintes escrevendo um artigo sobre o que tinha visto e passado em sua aventura, quando de repente, desapareceu sem deixar suspeitas, antes que pudesse publicar a sua história.
FIM
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Infestação maldita
Jaélton se mudou para uma nova casa, em uma nova comunidade. Parecia perfeita, cercada pelo campo verde, e com vista para as montanhas. Queria recomeçar sua vida, após uma decepção amorosa. Arrumaria um trabalho como marceneiro, ofício que aprendera ainda pequeno com seu pai e tios.
Logo no primeiro dia em que chegou, Jaélton notou uma estranha e repulsiva aranha no canto da sala. Ela não era muito grande, mas parecia ameaçadora com suas pernas compridas e finas, corpo negro com pelugens vermelhas, e uma cabeça amarela. Jaélton dobrou o jornal que estava lendo, e aproximou-se o mais calmo que conseguiu da aranha para acertá-la com ele.
A aranha, como que sentindo as intenções de Jaélton, saiu em disparada pelo chão. Jaélton nunca tinha visto uma aranha tão rápida quanto aquela, e nem sabia que existiam. A aranha entrou em um buraco na parede, se escondendo. O local onde a criatura estava antes, ficara coberto com uma gosma fedorenta.
Jaélton decidiu que, deveria assim que possível dedetizar o local, e tapar os buracos da casa. Porém, ainda enquanto concluía as reformas, uma tragédia! Um grande alvoroço aconteceu quando um dos homens que trabalhavam na obra foi picado por uma aranha, e começou a convulsionar caído no chão. Quando Jaélton chegou ele já estava roxo e babando sangue. Em poucos minutos o homem estava morto, e em sua face havia ficado uma expressão contorcida de desespero.
Todos se engajaram em apanhar a aranha, que segundo a descrição de alguns que a viram, era a mesma aranha que Jaélton tinha visto no primeiro dia, ou similar àquela.
Logo, avistaram novamente a aranha equilibrada sob a porta da casa, que estava aberta. Era aquela mesma aranha, mas estava maior e mais amedrontadora. Um homem se aproximou, e a aranha saltou sobre ele, em seguida mordendo o seu rosto. Depois, ela caiu no chão e correu para fora da casa ocultando-se na vegetação do jardim. Em poucos segundos, o homem picado ficou com o rosto muito inchado, e sangrando por todos os orifícios, até que, em cerca de dez minutos, ele estava morto.
A notícia se espalhou por toda a comunidade, e as pessoas passaram a dedetizar suas casas e a perseguir as aranhas e outros bichos peçonhentos. Jaélton também dedetizou sua casa, mas não demorou para que se encontrasse mais uma vez com aquela aranha assassina.
Na ocasião em que oficialmente se mudava, Jaélton deu uma festa, convidando antigos e novos conhecidos para um jantar. Durante o momento em que todos estavam sentados na mesa, e começavam a se servir, um líquido malcheiroso caiu sobre a comida, e todos torceram o nariz. Em seguida, a aranha caiu do teto em cima da mesa. Todos entraram em pânico. As cadeiras se viravam com as pessoas em cima delas. Pratos e copos se quebravam ao cair no chão. A aranha correu pela mesa, até saltar sobre os seios de uma antiga conhecida de Jaélton, mordendo-a em seguida. A aranha desceu rápido para o chão, correu, e subiu pela parede, até se esconder atrás de um armário. Mas as atenções estavam para a convidada mordida, que em pouco tempo sufocou até a morte. Quando procuraram novamente a aranha, não a encontraram.
Jaélton também tinha um gato e um cachorro, que chegaram logo depois que as reformas acabaram. Em menos de uma semana, deu falta de seu cachorro, e em poucos dias, o achou morto detrás de uma pedra no jardim. O cachorro estava coberto de teia de aranha. Mais alguns dias se passaram, até que sentiu um calafrio gelado ao notar, enquanto olhava seu gato, a aranha descendo pela parede atrás dele. A aranha tinha o mesmo tamanho do gato, e o imobilizou com as duas patas dianteiras, depois o mordendo. Em seguida, o gato ficou apenas tremendo, e a aranha começou a carrega-lo, parede acima, até sair pela janela. Nestes poucos segundos, Jaélton tinha ficado apenas imóvel de medo, gritando.
Em seguida, Jaélton pensou em sair daquele lugar, mas para onde iria? Aquela situação parecia ridícula. Ninguém acreditaria nele se dissesse que a aranha carregou seu gato para fora de casa pela janela.
Convocou um grupo de vizinhos, e alguns deles também se queixavam que seus animais estavam desaparecidos. Com ajuda de lanternas, vasculharam alguns depósitos de entulho das redondezas, até que encontraram uma pilha de cadáveres. Haviam muitos animais... gatos, cães e pássaros... mas bem no interior da pilha, encontraram uma pequena criança morta. Todos cercados por muitos fios de teia de aranha. Mas não encontraram a aranha.
Até que, certo dia, Jaélton notou a enorme aranha andando sobre o seu telhado. Temendo perde-la novamente de vista, pegou um pedaço grande de pau e subiu em cima da casa, para matá-la. A aranha avançou contra ele, fazendo com que ele se desequilibrasse e caísse do telhado. Jaélton bateu a cabeça e desmaiou.
Dias depois, vizinhos procurando Jaélton, encontraram seu corpo totalmente enrolado por teia de aranha. De repente, de dentro dele, começaram a sair centenas de pequenas aranhas iguais àquela.
Dizem que, em poucos meses, toda a comunidade morreu vítima dos ataques de aranha. Por fim, sobraram apenas casas vazias, mas cheias de aranhas.
FIM
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A criatura da floresta
Gastão vivia em uma cômoda e rústica casa rodeada pela floresta. Morava só e era bastante solitário. Cortava lenha sempre que podia, para se aquecer com o fogo. Um dia, carregando seu machado, caminhava por uma estreita trilha criada por ele mesmo, quando entre as árvores viu uma criatura, bela e prateada, e que não tinha uma forma definida. A criatura serpenteou entre os troncos de árvore, e então parte dela transformou-se em um coelho, enquanto a outra parte mesclou-se com a mata, muito bem camuflada. Gastão, ficou agachado a observar, imóvel, por algum tempo, até que uma raposa se aproximou para abocanhar o coelho, que não era coelho, e foi capturada pela criatura que a envolveu e a devorou. Então, Gastão esfregou os olhos sem crer, ao ver a criatura transformar-se na raposa. Em forma de raposa, a criatura se afastou, saindo de vista. Gastão, continuou seu percurso, muito pensativo, cortou a madeira e a levou para casa. Pela noite, enquanto tomava chá e se aquecia perto da lareira, ouviu um ruído fora de casa. Algo havia derrubado um monte de latas no armazém. Gastão olhou pela janela e viu aquela criatura prateada, que logo se transformou em uma grande ave e voou.
Gastão decidiu preparar uma armadilha para capturar a criatura. Reforçou as tábuas do armazém e tapou as janelas e aberturas na estrutura dele, deixando somente pequenos buracos para espiar seu interior. Colocou diversas frutas e também carne crua dentro do armazém, e aguardou, até que viu um grande cervo se aproximar do local, e ficar um tempo ali. Gastão, escondido por perto, pensou que se tratava somente de um cervo, quando o animal transformou-se em um chimpanzé, e entrou no armazém. Gastão prontamente removeu um pedaço de pau que mantinha o portão do armazém aberto e ele desceu, prendendo a criatura lá dentro.
Por alguns dias, Gastão observou a criatura metamórfica se transformar em diversos tipos de criaturas, e eventualmente comer as frutas e carnes deixadas ali por ele todos os dias.
Gastão começou a gostar daquela criatura, que se transformava em lindos animais, como cavalo, pavão, e até em tigre. Gostava de como aquele ser parecia querer diverti-lo com suas transformações, e passou a desenha-lo em um caderno e também a escrever sobre ele em seu diário de anotações.
Certa ocasião, um homem errante lhe pediu permissão para passar a noite ali dentro do seu armazém, e para ocultar a existência da criatura metamórfica, Gastão mentiu, dizendo-lhe que havia perdido a chave da porta. Então, Gastão recebeu o homem em sua própria casa, e, quando jantavam, Gastão viu pela janela, lá fora um grande cervo. Nervoso, pediu ao homem que não abrisse a porta, e foi averiguar com seu machado. Aproximou-se do animal nervoso, pronto para ataca-lo com seu machado. Porém, riu quando percebeu que aquele animal era um cervo verdadeiro. Depois, continuou a janta com o hospede em silêncio.
Pela manhã, o homem errante partiu, e logo Gastão saiu para coletar lenha. Durante este momento, aquele homem errante voltou, desconfiado de que Gastão estivesse escondendo algo dentro do armazém, e foi lá olhar. O homem conseguiu remover as pesadas tábuas que mantinham a porta fechada, e então, lá dentro viu um bezerro. O andarilho começou a inspecionar o local, quando o bezerro transformou-se naquela criatura metamórfica e o atacou.
Quando retornou, Gastão desesperou-se ao notar que a porta do armazém tinha sido aberta. Olhou lá dentro, e não viu a criatura. Entrou em casa e começou a averiguar se nada tinha sido roubado, quando pela janela, viu lá fora aquele andarilho à quem dera abrigo pela noite. Foi até lá, possesso, dizendo: - “Eu te falei que você não pode ficar mais! Tenho muitas coisas para fazer e não gosto de visitas.” Mas, quando chegou perto do homem, Gastão notou que ele estava muito estranho, com uma expressão vazia, indiferente, como se a mente dele não estivesse ali. Gastão, o encarou por alguns instantes, caindo em si, e correu de volta para dentro de casa. No mesmo instante, o andarilho transformou-se na criatura metamórfica e saiu em disparada atrás dele, serpenteando rápido no chão. Gastão entrou em sua casa e fechou a porta. Então ficou alerta com o seu machado em punhos. Viu um lagarto entrar pela janela, e o acertou em cheio com o machado, chegando a danificar a estrutura da casa. Porém, era um verdadeiro lagarto. Ouviu um ruído, e quando se virou para olhar, viu um enorme urso parado ali dentro da sala. Gastão, com um grito, atacou a criatura com o seu machado. Porém, após o primeiro golpe que encravou no urso, a criatura mudou de forma o envolvendo completamente.
Após absorver completamente Gastão, a criatura metamórfica tomou a forma dele, apenas com uma falha na barriga por causa do corte do machado. A criatura em forma de Gastão pegou o machado que estava no chão e saiu pela trilha na floresta que o verdadeiro Gastão costumava percorrer. Depois de andar por um tempo, ela voltava para a casa de Gastão, ainda com a sua forma, e movia a caneta no diário de anotações. Quem o achou, posteriormente, encontrou-o escrito até a metade, e depois haviam somente rabiscos em todas as páginas.
FIM
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O fantasma de Sofia
Roger cresceu no antigo casarão de sua família, junto a seu pai, sua mãe e seus irmãos mais novos, Jody, a caçula, e Bob, o filho do meio. Seus pais, Bartolomeu e Juliete, eram de poucas palavras e disciplinadores rigorosos.
Desde que podia se lembrar, Roger havia presenciado todos os anos, um ritual estranho que seu pai fazia. No início do ano, seu pai sacrificava algum animal, mas ninguém comia a carne dele, seu corpo ficava no campo até apodrecer. No último ano, quando Roger tinha onze anos de idade, ele viu, enquanto seu pai sacrificava a vida de um coelho, uma garota loura correndo longe dali, perto da mata. Então a garota começou a vir na direção deles, e ao que foi se aproximando, desapareceu.
Roger teve medo de comentar isso com seus pais, pois temia uma dura repreenda por estar supostamente inventando isso. Mas comentou com seus irmãos, que acharam o fato surpreendente.
Naquele ano, o pai de Roger, adoeceu terrivelmente e faleceu durante o inverno.
No ano seguinte, algo começou a assustar a família. Começou com sons de passos pelos cômodos da casa, e também um choro estridente, que ecoava pelos corredores.
Juliete, sua mãe, passou a falar ainda menos, e ignorava o que via ou ouvia. Mas desde então, ficou pálida e sempre cheia de machucados.
“- Vocês estão ouvindo esse choro infernal meus irmãos?
“- Sim, é da menina demônio.” Disse Bob. “-Foi ela que quebrou a janela da copa com um golpe e desapareceu deixando para mim a culpa!”
“Ela tem olhos amarelos e casco no lugar das mãos” Disse Jody.
Uma noite, Roger olhou pela janela de seu quarto, e logo abaixo estava a menina olhando diretamente para ele. Ela tinha uma longa cabeleira loura, quase branca, e havia algo errado com seu rosto e braços.
“- Ela está lá embaixo!” Gritou Roger, para que seus irmãos ouvissem.
“- Vamos descer e falar com ela!” Disse Bob.
“- Não! Eu tenho medo!” Disse Jody.
Os três foram cautelosamente até o local onde Roger tinha visto a menina, e ela não estava mais ali. No caminho de volta, Bob levou uma pancada nas costas que o fez cair, e em seguida, uma viga da madeira se desprendeu do teto e despencou sobre ele, quebrando as suas pernas.
Foi assustador, e os três estavam convencidos que tinha sido aquela estranha menina que causou tudo aquilo.
Pouco tempo depois, Roger estava aproveitando os raios de sol no campo, quando viu a menina novamente. Ela estava parada logo ao seu lado, e Roger percebeu que ela tinha braços como patas e rosto de cabra. Então, Roger viu que ao lado dos pés daquela menina, estava uma cobra peçonhenta. A cobra avançou em Roger, e por pouco não lhe acertou uma mordida.
Jody foi a próxima a ter um encontro com aquilo. Durante a noite, Jody acordou com um apertão nos braços e viu a menina demônio sobre ela, a encarando com um rosto de cabra contorcido, e não deixando que se levantasse. Jody gritava, e dizia que não podia sair dali, e quando seus irmãos chegaram correndo, viram uma escuridão sobre ela, que os fez hesitar por um segundo. Mas então, Roger e Bob puxaram juntos a pequena Jody para fora daquela sombra fria e sinistra.
Roger, decidiu buscar alguma informação sobre o passado de sua família, ou sobre algo que pudesse lhe dar uma pista do que era aquilo que os estava atormentando.
Todos os vizinhos se recusaram conversar com ele, menos um: Igor, o porteiro do cemitério.
Igor era um velho sujo que vivia ali mesmo no cemitério. Ele se divertiu com a situação e ficou animado em falar sobre aquilo com Roger.
“- Alguns anos antes de você nascer, o seu respeitável pai que está aqui enterrado, tinha relações com uma cabra no porão da sua casa. Por uma maldição, a cabra deu à luz a uma menina, metade cabra, metade gente. Todos consideraram aquilo uma abominação aos olhos de Deus. A menina passava o dia todo brincando com os animais, porque as outras crianças não queriam brincar com ela. Um dia, alguns dos seus vizinhos decidiram dar um fim à vida da aberração, e invadiram a sua casa. Eles amarraram a sua meia-irmã Sofia, e a queimaram viva bem ali. Eu também vi a alma dela algumas vezes aqui no cemitério. Eu acho que não deve haver uma única alma igual a ela no paraíso, então ela decidiu ficar vagando aqui mesmo. Ainda é tão triste e solitária quanto era quando viva.”
Roger voltou para casa chorando e enjoado. Ao chegar, contou tudo o que ouviu para seus irmãos.
Naquela noite, os três irmãos decidiram conversar com o espírito da meia-irmã deles, e orar por ela. Acenderam algumas velas, e rezavam, convidando aquela alma perdida para conversar com eles. Então, começaram a ouvir barulhos de passos se aproximando do quarto e ficaram em silêncio. A figura da menina-cabra lentamente surgiu pela porta, encarando os três.
“- Você pode brincar conosco, irmã Sofia.” Disse Roger.
Foi quando o espírito da menina-cabra se tornou mais luminoso e quente, e desde então, parou de quebrar as coisas e de causar infortúnios. Mas, de vez em quando, aparecia para brincar.
FIM
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Doce picada
Durante a adolescência, Floyd estava em um acampamento, quando seus amigos o amarraram a uma árvore para caçoar dele. Floyd ficou amarrado por um dia inteiro, e um fato marcante em sua vida aconteceu durante esse período. No fim da tarde, Floyd avistou um mosquito grande e ameaçador, com muitas marcas coloridas. Sem poder se mover, Floyd viu, indefeso, o mosquito voar perto de seu rosto, zumbindo alto, até que pousou no meio da sua testa e o picou. Floyd sentiu o peso do inseto entre as sobrancelhas, e depois a dor da picada, tendo a vívida sensação do seu sangue ser drenado do rosto, deixando-o temporariamente dormente. Depois de alguns minutos o mosquito se foi. A sensação de coceira começou logo após o fim da picada. Floyd experimentou uma vontade tão imensa de coçar a testa, que em algumas horas, durante a noite, sozinho ali no mato, passou a sentir um imenso prazer com a sensação. Em sua loucura, o desespero transformou-se em deleite. Depois daquele dia, Floyd se deixava picar por mosquitos e insetos, para poder apreciar a sensação da coceira que isso proporcionava.
Alguns anos mais tarde, Floyd passou a frequentar locais selvagens, onde se despia, e se lambuzava com um óleo doce, a fim de atrair os mosquitos. Seu corpo estava sempre inchado e cheio de marcas. Seus amigos começaram a se afastar dele, conforme sua paixão por picadas de mosquito aumentava. Floyd não tomava banho, pois o forte odor era um chamariz para os mosquitos.
Até que, durante uma noite no meio do mato, Floyd ficou totalmente coberto de mosquitos e foi picado tantas vezes que as toxinas das picadas alteraram seu material genético. Seu corpo colapsou e ele caiu desacordado. Ao recobrar a consciência, ele mesmo havia se transformado em um ser metade mosquito e metade homem. Bateu suas asas e subiu ao céu noturno, com milhares de mosquitos indo atrás dele. Podia entender a linguagem dos mosquitos e os mosquitos o seguiam. Floyd sabia que não seria mais aceito pela sociedade. Ainda naquela noite, sentiu imensa fome por sangue. Suas primeiras presas foram gado e animais selvagens. Mas, com o passar do tempo, sua humanidade foi se perdendo, e começou a atacar também as pessoas.
Os aldeões acordavam com falta de sangue no corpo, e alguns até mesmo não resistiam, falecendo. Iniciou uma onda de relatos, em que pessoas diziam ter despertado durante a madrugada e se deparado com um monstro sobre seus corpos sugando-lhes o sangue. Alguns chegaram até mesmo a entrar em luta corporal contra Floyd, o homem mosquito.
Perseguido, Floyd se viu forçado a voar para longe da civilização com seu exército de mosquitos. Uma tribo indígena que vive próxima de onde Floyd se assentou, passou a receber visitas temíveis dele, e logo, começaram a adorá-lo como a um deus.
Os adoradores do homem mosquito aos poucos foram deixando de existir, restando somente alguns. E os mosquitos sempre fizeram um bom trabalho em manter qualquer um longe dos muitos tesouros ofertados a Floyd.
As cidades cresceram muito desde então, expandindo suas fronteiras. Hoje em dia, podemos estar mais próximos do que gostaríamos de Floyd, o rei dos mosquitos.
FIM
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Imaginação perigosa
Jéferson, Bento, Amanda e Lianca eram jovens hippies que viviam em uma pequena comunidade nas montanhas. Eles adoravam ficar doidões, e eventualmente ingeriam cogumelos alucinógenos que cresciam por lá perto na floresta. Porém, certa vez, uma indústria química decidiu depositar seus resíduos radioativos naquela área. As gerações seguintes de cogumelos vieram diferentes, alteradas. Quando os quatro amigos decidiram dar uma festa, comeram aqueles cogumelos. Seu sabor era mais doce, e eles adoraram. Mas, havia algo de diferente, a loucura parecia especial, mais intensa e real. Eles sentiram que suas mentes haviam encontrado uma via de conexão direta com a natureza, e surpreendentemente, conseguiam manipulá-la com o poder de suas próprias vontades. Jéferson ficou líquido e dividiu-se em muitas bolhas que flutuavam ao vento. Ele se sentia muito bem, vendo tudo aquilo de fora. Bento, começou a dançar com um urso debaixo de uma cachoeira de chocolate. Depois viu o urso subir em uma pequena bicicleta e ficar pedalando em círculos com muita habilidade, enquanto fazia malabares com frutas. Amanda, se sentia muito forte. Ela podia correr rápido, e abrir passagem num rio com um sopro, como uma deusa faria. E Lianca, transformou-se em uma grande árvore com raízes fortes e profundas. Ela adorava a sensação de ser uma árvore, irmã de todas as outras árvores, que nutrem a terra e geram vida, abastecendo-se com a luz do Sol.
Acontece que o efeito do cogumelo só durou um certo tempo, e logo que acabou, o corpo de Jéferson caiu do alto como vários pedaços de carne morta. Bento, estava coberto de chocolate, e o urso enorme deixou as frutas e a bicicleta caírem no chão. Bento não podia mais controlar o animal, e logo, foi atacado e devorado por ele. Amanda, perdeu sua força e foi esmagada por uma grande pedra que tinha levantado. Lianca, até hoje, ainda é uma grande e bonita árvore.
FIM
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Terror no gelo
Durante uma expedição de Conde Burton ao Polo Norte, ele e seus companheiros começaram a ouvir, de tempos em tempos, um rugido abafado, junto ao som do vento gélido e cortante. Vinha de uma montanha de gelo, a cerca de dois quilômetros de distância de onde eles estavam assentados. Toda a equipe concordou em averiguar. O conde e o restante dos exploradores, seguiram o som aterrorizante, e, dentro da montanha, desceram metros abaixo da superfície, através de um túnel de gelo, até que encontraram uma enorme criatura congelada. Um dinossauro completamente preservado, era uma descoberta fantástica! Mas, Conde Burton, notou que o gelo que o manteve ali por milhões de anos, estava derretendo, pois toda aquela região estava ficando mais quente a cada ano. Metade do corpo da criatura já estava exposta, e o calor dos exploradores e de suas respirações, contribuiu mais um pouco no aquecimento do lugar.
De repente, o lagarto abriu seus olhos, e urrou ferozmente, o que causou um pequeno desabamento, e apavorou a todos. O gelo que ainda cercava a criatura se rachou, e ela começou a se debater, quebrando-o em pedaços. O antigo predador estava livre novamente, e seu coração bombeava o sangue frio com vigor. Era um espécime enorme. Tinha garras do tamanho de facas, e dentes mortais, com quatro grandes caninos que poderiam perfurar o crânio de qualquer animal da Terra. Uma longa e poderosa cauda se estendia por uma dezena de metros, e a cabeça, sustentada por músculos fortes, erguia-se até o teto da caverna, cinco vezes mais alto de que uma pessoa média.
A fera pré-histórica, sustentando-se sobre as duas patas traseiras, deu um golpe com seu braço comprido, fatiando dois homens de uma só vez com as garras, e lançando-os longe, já mortalmente feridos. Algumas das pessoas estavam armadas, e começaram a atirar, mas, suas balas, mal penetraram na couraça do animal. Com um impulso, o dinossauro pressionou um homem contra a parede com uma cabeçada, matando-o, e, em seguida, abocanhou um deles, engolindo-o da cintura para cima. Conde Burton e o restante da sua equipe saíram correndo por onde vieram, e a criatura os seguiu, rastejando para atravessar o túnel até a superfície, que era mais baixo.
As pessoas entraram em seus veículos adaptados para a neve, apressadas para fugir dali. O dinossauro chegou à superfície, e correu, alcançando um dos carros. Então, tombou-o com um golpe de sua cauda. Depois, esmagou os tripulantes com pisões, e os devorou em seguida. Apenas Conde Burton e mais dois exploradores conseguiram retornar em segurança. Depois desse dia, foram feitas algumas tentativas de capturar o dinossauro, mas este, sempre conseguia evitar as armadilhas, como se tivesse um sentido extra, que lhe dava intuição super apurada de sobrevivência.
O caso era mantido em segredo, pois os interessados queriam lucrar com o dinossauro quando o tivessem preso. Conde Burton liderava as missões. Estavam todos preparados para acorrentar o fóssil vivo, levando pesadas correntes em veículos, que pretendiam emaranhar ao seu redor. Também levavam armas tranquilizantes potentes. Mas, desta vez, ninguém o encontrava. Até que, para a surpresa de todos, o dinossauro estava nadando abaixo do gelo em que eles se sustentavam. O dinossauro chocou-se contra o piso com uma força incrível, quebrando-o, e fazendo com que todos fossem engolidos pela água congelante.
Conde Burton nunca mais foi visto. Somente duas pessoas retornaram daquele incidente, mas ninguém acreditou no relato delas.
FIM
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A maldição dos mortos
O historiador de civilizações antigas, e especialista em comunidades indígenas, Frank Colben, recebeu uma ligação das autoridades de uma região inóspita, lar do antigo povo Ganobi. Perguntaram-lhe se ele já ouvira dizer de um local, que dizia-se guardado pelos mortos, no interior das colinas selvagens. Frank não sabia nada a respeito. Informaram-lhe que, recentemente, um grupo de trabalhadores fora mandado para lá a fim de construir uma nova estrada, mas todos os que ficaram na construção, acabaram mortos, e seus corpos, desapareceram depois. O mais estranho, é que de acordo com os sobreviventes, eles estavam sendo perseguidos pela própria morte. Havia uma superstição cultural dos nativos, envolvida nesse episódio.
Frank aceitou o convite para ir até a pequena comunidade Ganobi coletar informações. Alguns dos trabalhadores que morreram tinham encontrado no local da construção, peças de arte, e tabuletas com símbolos de uma linguagem Ganobi antiga. Em posse desses achados, Frank visitou o habitante mais ancião do lugar, um dos últimos capazes de entender os sinais. Seu nome era Mokolo, um homem pequeno e centenário, que pouco verbalizava palavras. Ao ver as peças, Mokolo ficou muito nervoso, e apenas repetia as palavras “iatunga kala”. O ancião Ganobi foi levado embora por familiares, até que o seu neto, já um homem adulto, chamado Combaka, apareceu para conversar com Frank Colben. Ele disse: “-Iatunga kala, significa, ‘o mal dos mortos’. O meu avô reconheceu os sinais que simbolizam esse velho conto do meu povo. De acordo com as histórias repassadas por muitas gerações, existe um lugar onde a morte se espalha como uma doença. Nós Ganobi vivíamos nesse lugar, em tempos remotos, mas esse mal fez com que migrássemos para outra região, onde estamos agora.”
Frank ouviu com atenção, e disse: “-Mas isso não faz sentido. Não somos todos os vivos perseguidos pela morte?” E Combaka respondeu: “-Não dessa forma senhor Colben. Vou lhe contar a história que conheço, assim talvez você entenda melhor. Antigamente, nosso povo dividia a mesma região com dois outros povos, os Vetuga e os Lakipaki. Em determinado ponto, os Vetuga decidiram acabar com os Lakipaki para repartirem entre si seus recursos, e os atacaram de surpresa. Todos os Lakipaki foram assassinados, e seus ossos foram moídos, posteriormente misturados, e moldados na forma de uma grande esfera, que os Vetuga exibiam e utilizavam em seus rituais mágicos.” Concentrado, Frank Colben anotava tudo o que Combaka lhe dizia. O ganobi prosseguiu: “-Acreditamos que existência daquele objeto maldito feito com os ossos de uma civilização inteira, atraiu a atenção de um demônio que possui os corpos mortos, e os usa para levar qualquer criatura viva ao mesmo destino. Não podíamos mais honrar os falecidos naquele lugar com nossos ritos tradicionais, pois eles eram tomados pelo demônio, e atacavam os vivos.’
Frank perguntou “-E onde está essa esfera de ossos agora?” Combaka respondeu: “-Acredita-se que esteja em algum lugar naquela mesma região onde os três povos viviam antes. Mas, até onde se sabe, nosso povo é o único deles que ainda existe. Os Vetuga sucumbiram ao próprio mau que fizeram. Isso é tudo o que sei, senhor Colben. Desejo-lhe boa sorte, e aconselho que se mantenha longe daquelas colinas.”
Incrédulo, o historiador agradeceu a Combaka e sua família, e se despediu, recolhendo-se em seu aposento recém alugado na comunidade.
Agora, Frank conhecia a lenda que assombrava a mente daquelas pessoas, mas não era o bastante para ele. Ele achava, que devia verificar se havia alguma relação entre as mortes dos trabalhadores, e a antiga lenda Ganobi. Quando Frank recebeu o convite para acompanhar os detetives até a construção abandonada, e ficou sabendo que alguns deles já tinham ido até lá e voltado em segurança, sem estarem infectados por alguma estranha doença, ele aceitou. Os relatos eram fantásticos demais para que ele ficasse realmente assustado com eles.
Na manhã seguinte, Frank Colben partiu na companhia de cinco investigadores até a construção da estrada, onde ocorreram as fatalidades, e onde os corpos desapareceram. O local era de difícil acesso; Uma trilha quase apagada no meio da floresta, que subia e descia os morros. Em certo ponto, enquanto se aproximavam do destino, Frank começou a ter uma estranha sensação de medo e desconfiança, como se fosse observado por uma entidade maligna, que pretendia lançar-se contra ele a qualquer instante. Sentia calafrios, e tremores súbitos. Era notório para Frank, que alguns dos homens com ele também não se sentiam à vontade, mas negavam admitir.
Após dez horas de caminhada, alcançaram o ponto final da obra, e todos começaram a fotografar e a tomar notas. De repente, alguém deu um grito, chamando a atenção de todos para um corpo que estava caído junto aos entulhos. Estava parcialmente decomposto, e cheio de moscas. Verificaram as fotografias que tinham dos trabalhadores desaparecidos, e acreditaram ter encontrado um deles. Não podia-se ter certeza, pois metade da cabeça estava esmagada e galhos pontudos atravessavam seu corpo na barriga e no lado direito do tórax, entre as costelas.
Por alguns minutos, todos conversaram, e então, decidiram que deviam continuar a investigação no dia seguinte, pois já ficava escuro. Havia uma atmosfera macabra entre todos. Armaram as barracas. Depois decidiram revezar os turnos para vigiar o acampamento e o corpo encontrado. Frank compartilhou com eles o que sabia da antiga lenda Ganobi, e então, foram dormir.
Era noite, quando o vigia acordou a todos, tremendo de medo e balbuciando que o cadáver tinha se mexido. Segundo ele, o corpo virou a cabeça na direção dele, e disse ‘você já está morto’. Depois, fez uma tentativa grotesca de ficar de pé mas caiu novamente.
As pessoas do grupo diziam ao assustado vigia para que ele ficasse calmo, e que provavelmente dormiu e teve um pesadelo. Já era de se esperar, após terem ouvido a história contada por Frank. Mas então, um deles chamou a atenção de todos, de que a posição do cadáver estava mudada. Houve um silêncio, até que o mesmo detetive ressaltou o quanto era importante que ninguém mexesse no corpo até que tudo fosse devidamente registrado.
Trocaram o vigia, e colocaram-se a dormir novamente. Algumas horas mais tarde, Frank não tinha conseguido pegar no sono, e decidiu ir conversar com o homem que estava vigiando. Enquanto se aproximava, notou algo estranho, mas não dava para ver bem devido a pouco luminosidade. Parecia que o guarda estava se movimentando, talvez na tentativa de manter-se acordado. Quando chegou mais perto, Frank viu o cadáver enforcando o homem com uma corda. Frank gritou. O cadáver largou sua vítima, e emitiu um som gutural, como se a sua própria alma estivesse ardendo no inferno. Alguns acordaram pensando que se tratava de mais um surto de pavor, xingavam e faziam piadas, até que viram o que estava acontecendo. Nem conseguiam acreditar no que estavam vendo. Um detetive sacou sua arma e gritou ao homem que parecia ter voltado a vida: “-Parado ai!” Enquanto outro puxou o corpo caído do vigia e checou os seus sinais vitais. Ele estava morto. Enquanto todos prestavam atenção no assassino, o vigia que morreu começou a se mover, puxando uma faca, e perfurando o rosto do detetive que estava perto dele, atingindo-o bem no olho e matando-o. Depois de esfaquear o detetive, o vigia morto sacou o revolver do coldre e começou a atirar, mas sem muita precisão. Todos se esconderam como podiam, ao som dos disparos, até que os detetives dispararam de volta contra os cadáveres assassinos, que não caíram no chão. Frank fotografou o acontecimento, e também o próximo, quando pessoas decrépitas, aparentemente mortas, surgiram do meio do mato seguraram um deles e o golpearam repetidamente com pedras, até o matarem. Frank e os dois detetives ainda vivos, correram até uma casa em construção. Perceberam depois, que ela estava cheia de partes de corpos. Frank viu uma cabeça humana flutuando logo a sua frente. Os dois investigadores atiravam em todas as direções, inutilmente. Um braço humano voou sobre um deles, o agarrando no rosto e depois no cabelo, o derrubando. Nesse instante, corpos começaram a entrar no local. O detetive caído foi cercado, e somente gritou enquanto era dilacerado. Alguns dos cadáveres ressuscitados seguravam facas ou objetos capazes de causar danos. Frank e o investigador que ainda estava vivo conseguiram sair pela janela, sem saber para onde iam, e depois de correrem alguns minutos, caíram dentro de um buraco, onde ficaram escondidos. Durante o restante da noite, eles ouviam as vozes dos companheiros que viram serem mortos chamando por eles.
Quando ficou claro, Frank espiou para fora do buraco, e viu uma criatura medonha aparecer em vários locais entre as árvores, como se estivesse procurando por eles. Era alguma coisa feita de pura perversidade. Ficaram algumas horas naquele lugar, até que pensaram que não tinham alternativa, a não ser sair do esconderijo e procurar pela estrada que os levaria embora dali. Por sorte, logo eles encontraram a trilha.
Durante o trajeto de volta, foram perseguidos. Alguns corpos necrosados apareceram no caminho de Frank e do detetive, e os derrubaram, depois mordendo-os e arranhando-os diversas vezes. Eles podiam sentir o fedor de podridão daquilo que os atacava. Alguns eram somente esqueleto, outros, não tinham membros ou cabeça, às vezes, com as entranhas expostas. Eles tiveram de lutar por suas vidas, e, muito machucados, conseguiram retornar até o vilarejo. Os dois nunca se recuperaram dos traumas psicológicos desses acontecimentos. As fotografias de Frank Colben foram confiscadas na época, e alguns anos mais tarde, foram compradas por um homem rico e depois expostas em uma galeria como obras de arte.
FIM
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Enigma Cruél
Durante a primeira metade de sua vida, Bóris sempre foi uma
pessoa comum, levando uma vida normal.
Desde sua infância, um evento misterioso o acompanhou. Certa
vez, quando corria com as outras crianças em uma região afastada, próxima da
mata, viu uma pequena ponte, que passava por cima de uma fraca correnteza
d´água. Aproximou-se da ponte com curiosidade, e, quando foi atravessá-la, uma
menina que estava também a brincar, dirigiu-lhe a voz de maneira dramática:
Bóris, não.
O menino Bóris não entendeu o porquê, mas desistiu da ideia
de atravessar aquela ponte.
Durante outra ocasião, na época em que concluía a faculdade,
passou por aquele mesmo lugar com uns amigos. Aquela ponte ainda estava ali, e
aproveitando a oportunidade ele poderia atravessá-la, concluindo aquele
estranho episódio que ficara em sua mente.
Mais uma vez, quando foi atravessá-la, um de seus amigos
tocou em seu ombro dizendo: Bóris, não.
Bóris sentiu um calafrio, e teve medo de atravessar aquela
ponte.
Anos mais tarde, Bóris decidiu que era o momento de
enfrentá-la de uma vez por todas. Não conseguiu resistir a tentação de levar
mais alguém com ele. Será que essa pessoa agiria da mesma maneira que as
outras, quando percebesse a sua intenção de atravessar a ponte?
Bóris, mais uma vez, foi até aquela ponte, e, quando se
colocou em movimento para atravessá-la, sua companhia falou: Não, Bóris...
Bóris riu nervosamente, e seguiu em frente, sentindo como se
estivesse em mais um de seus pesadelos com aquela ponte.
Ao atravessá-la, a mente de Bóris se torceu, e ele levou as
mãos ao rosto dando um grito. Quando ele abriu novamente os olhos, sentiu que
estava de ponta cabeça. Não o seu corpo, mas a sua mente. Seus pés ainda
tocavam o chão, mas a sua mente estava invertida, dando-lhe a impressão de que
ia cair para sempre no céu infinito.
Bóris nunca se curou da sensação de ter sido virado de
cabeça para baixo, e a partir daquele momento, todos passaram a achá-lo muito
esquisito. As pessoas reparavam a sua maneira estranha de andar e de usar seus
braços.
Bóris também acusou a todos de acobertarem planos secretos
sobre a sua vida, e de esconderem coisas a seu respeito. Repetidamente, Bóris
dizia: - "Eu não deveria ter atravessado aquela ponte, e vocês
sabiam!"
O registro dessa história consta em uma anotação encontrada
em um antigo manicômio abandonado, no caderno de um certo Dr.Fritzenbauer.
FIM
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O vestido de Josefina
Josefina era uma inocente e
delicada menina com quinze anos de idade, quando andava pelas ruas de sua
cidade na companhia de seus pais e alguns criados de sua família, que era
abastada. Naquela ocasião, todos viram uma garota órfão, da mesma idade de
Josefina, sozinha sentada na rua, mordendo um pão velho. Essa garota usava um
vestido, que chamou a atenção de Josefina. Era um vestido vermelho, com
detalhes laranja. Um vestido de aspecto incomum.
-“Que lindo vestido!”, disse Josefina, alheia a condição
lastimável da garota, que estava toda suja e machucada.
O pai de Josefina deteve o olhar na pobre garota que usava o
vestido. Ele ouvira o comentário de sua filha, e uma voz em sua cabeça começou
a incentivá-lo a tomar o vestido daquela menina para dá-lo à sua filha,
Josefina. “Que diferença faria se aquela miserável criatura perdesse seu
vestido?”, “Seria ainda melhor que morresse de uma vez, ao invés de ficar
sofrendo anos, na pobreza”, “Josefina sim, terá uma vida longa e deve ser
feliz.”, pensava o pai de Josefina. Aqueles pensamentos ficaram cada vez mais
fortes, e, depois que todos já tinham retornado para casa, o pai de Josefina
mandou que um criado fosse tomar o vestido daquela garota. O criado cumpriu a
tarefa, e, temendo que a menina o denunciasse, ele a estrangulou até a morte.
Depois,
na casa de Josefina, seu pai lhe deu o vestido tomado.
- “Não acredito papai! O senhor é o melhor pai do mundo!”,
disse Josefina.
Alguns
dias se passaram, e Josefina passou a querer usar o vestido o tempo todo,
insistindo nisso com determinação. Seu comportamento ficou esquisito, e, muitos
acontecimentos assustadores se sucederam.
Certa vez, um criado viu Josefina deslizar através dos
corredores da casa, como que flutuando, enquanto usava aquele vestido; e ela
falava palavras incompreensíveis.
Em outra ocasião, um criado viu a garota andando sobre o
teto e as paredes, também usando o mesmo vestido; e a luz das lamparinas
enfraqueciam perto de Josefina quando estava vestida com ele.
Alguns, relataram ter visto uma figura toda preta junto de
Josefina, quando ela estava com o estranho vestido.
Josefina tornou-se muito calada e doente. Tinha emagrecido
muito; profundas olheiras manchavam com escuro a sua face pálida.
E então, certo dia, Josefina saiu de casa durante a noite,
sozinha, através do mato. Ela estava vestindo aquele mesmo vestido vermelho com
detalhes laranja, que todos diziam ter influência sobre ela e que era
assombrado.
Josefina pisou na areia molhada do pântano, e afundou para a
morte. Seus restos foram encontrados somente duzentos e vinte e cinco anos
depois, por guardas florestais. O vestido que a menina usava quando morreu,
ainda estava intacto.
Especialistas analisaram a composição do vestido, e
verificaram que ele era muito mais antigo do que a ossada, tendo entre seiscentos
e setecentos anos de idade, confeccionado durante a Idade Média. A cor vermelha
do vestido continha sangue humano em sua composição, enquanto a cor laranja tinha
componentes orgânicos não humanos.
O caso obteve certa atenção da mídia. Os descendentes da
família de Josefina tinham toda a história registrada, desde a obsessão de
Josefina pelo vestido, os acontecimentos sobrenaturais, até o seu
desaparecimento.
O vestido acabou sendo leiloado. O comprador era um fazendeiro
que afirmou ter ouvido vozes que insistiam que ele o comprasse.
Mais tarde, todos ficaram horrorizados com a notícia que
chegara: Um filho daquele mesmo homem que comprou o vestido, havia assassinado
toda à sua família vestido com ele. Ele tinha esfaqueado cinco pessoas até a
morte, e foi internado em um hospício.
O vestido, posteriormente foi adquirido por um colecionador
de objetos sobrenaturais, até que o mesmo afirmou que ele havia simplesmente
desaparecido, ou tinha sido roubado.
FIM
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O aviso
Valter era surfista, e morava sozinho em uma cabana no
morro, de onde tinha vista privilegiada da praia. Praticamente todos os dias,
ele descia uma trilha pelo mato até o mar com a sua prancha, pegava umas ondas,
e então, fazia o caminho de volta. Só que, antes de chegar em casa, ele parava
em cima de umas pedras afastadas, e fumava sua erva.
Certo dia, enquanto surfava, Valter avistou um traço de luz
que cortava o céu, seguindo em direção ao morro onde ele morava. Então, saiu do
mar, e começou o caminho de volta. Enquanto se preparava para fumar a erva
sobre as pedras, Valter viu surgir por detrás dos arbustos, um homem bem alto, de
pele acinzentada, vestindo terno preto e óculos escuros.
Valter esfregou os olhos, e então, se levantou assustado,
perguntando: -“Quem é você?!”
O homem não respondeu, mas tirou do bolso um recipiente, e
de dentro dele, um cigarro esquisito, oferecendo-o à Valter.
Valter relaxou um pouco, sorriu e aceitou o presente.
Depois, ainda sem dizer nada, o homem misterioso foi embora.
-“Que estranho!” Pensou Valter, sentindo o aroma exótico
daquele cigarro. Foi então, que ele decidiu fumá-lo.
Logo nos primeiros tragos, Valter sentiu sua mente ser
afetada de forma intensa. Ele começou a ouvir as plantas, os animais, as pedras
e a terra falando com ele.
Meio atordoado, Valter foi pra casa, e, quando olhou para o
mar, sentiu que podia entender a linguagem das ondas. Cada uma delas tinha um
significado para ele. O mar conversava com ele de maneira serena, como se lhe
contasse os segredos das profundezas.
Valter continuou observando o mar por algumas horas, tranquilamente,
até que sentiu um calafrio. Ocorrera uma mudança na frequência daquela comunicação. Agora, as ondulações
o avisavam sobre um enorme desastre que estava para acontecer. Valter sabia que uma onda gigantesca varreria toda a comunidade abaixo do morro. O mar
estava lhe dizendo isso.
Então, ele desceu correndo para a praia, afim de alertar a
todos sobre o perigo eminente.
Ninguém acreditou nele. Todos começaram a rir do que Valter
dizia, achando que ele só estava muito louco.
De repente, o mar recuou da praia, bem rápido. Sem demora,
uma parede enorme de água se aproximou em alta velocidade, sem dar tempo para
que ninguém ali conseguisse buscar refúgio em terreno elevado.
Uma onda com cerca de trinta metros de altura, chegou com
violência, afogando quase todo mundo daquela comunidade, incluindo Valter, que
também não teve tempo de escapar.
FIM
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A tempestade negra
Situado no campo, nos arredores de uma cidade, ficava um
grande laboratório químico. Naquele laboratório, estavam sendo realizadas
muitas pesquisas com uso de elementos tóxicos e metais pesados, e, por conta
disso, os gases que eram produzidos nas reações foram sendo estocados em
enormes tanques, pois ninguém sabia o que fazer com eles, ou as consequências
que teriam sobre o meio ambiente.
Durante uma fatídica manhã nublada, um acidente resultou em
uma explosão, que rompeu os tanques e liberou toneladas daquele gás residual na
atmosfera. Uma coluna escura de fumaça ergueu-se até grande altura no céu,
misturando-se com as nuvens e fazendo-as girar sobre o local. Logo, muitos
relâmpagos começaram a acontecer, queimando, o que acertavam.
A nuvem negra começou a crescer, e seus ventos ganharam
força. O ar ficou venenoso; uma forte chuva radioativa começou a cair; as gotas
eram ácidas e corroíam tudo com rapidez espantosa.
As pessoas que viviam nas cidades por perto, avistaram uma
tempestade sinistra se aproximando, e, em pouco tempo, foram engolidas por ela.
O vento, às vezes acelerava até velocidades incríveis, como em furacões.
Inúmeros tornados negros rodopiavam e torciam tudo o que ficava em seus
caminhos. Pessoas e animais começaram a derreter em contato com o ar e a chuva.
Também houve inundação; a água lamacenta subiu vários metros acima do chão.
O governo logo interditou as áreas atingidas, mas, ainda
assim, estava impotente, temendo que aquela tempestade crescesse ainda mais.
Durante três dias e três noites, o furacão tóxico permaneceu
destruindo tudo por ali.
Quando o pior já havia passado, equipes militares vestindo roupas
de proteção foram enviadas aos locais atingidos pelo cataclisma. Estava tudo
devastado. Nenhuma construção permanecia de pé. Tinham tantas pessoas e animais
mortos ou moribundos, que concluíram ser impossível removê-los do local,
deixando-os para apodrecer ali mesmo. Os corpos estavam deformados,
transfigurados; alguns haviam virado somente uma massa disforme de material
biológico.
Porém, alguns indivíduos ainda estavam vivos quando os
primeiros grupos de reconhecimento chegaram, e de acordo com os relatos, as
vítimas misturavam os sentidos, e apresentavam comportamento agressivo.
Alguns meses depois, começaram a surgir mutações genéticas
naquela região. Animais modificados, aberrações e monstruosidades. Os poucos
fungos e vegetais que sobreviveram também mudaram, ameaçando se propagar com o
veneno que carregavam.
O governo decidiu então limpar o local com bombas
incendiárias, de forma que não restasse mais nada por lá. Hoje em dia, aquela
região inóspita ainda continua interditada. Dizem, que mesmo a aproximação dos
limites permitidos pode ocasionar em alucinações e envenenamento.
FIM
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A pedra
Os amigos Ted e Samuel visitavam uma região árida e rochosa, famosa por ter sido local onde antigos povos viveram. Acompanhados de Tévez, um guia local, percorreram algumas trilhas cheias de registros antigos interessantes, como desenhos nas rochas e monólitos esculpidos.
Em determinado trecho, notaram não tão longe, uma pedra grande, que estava cercada por uma corda afim de evitar a aproximação das pessoas.
-“Que pedra é aquela?” Perguntou Ted ao guia.
-“Nós da região não aconselhamos se aproximar dela. Nossas lendas dizem que é amaldiçoada, e muitas pessoas que foram até lá desapareceram ou tiveram mortes misteriosas.” Disse o guia.
-“Mas ela tem alguma história?” Perguntou Samuel.
-“Dizem que ela caiu do céu, a milhares de anos.” Respondeu Tévez.
Os dois amigos ficaram bem interessados na história, e decidiram subornar Tévez para que os levassem até ela. Depois de certa negociação, o guia aceitou.
Chegando no local, Tévez disse aos dois: -“Só irei até aqui. Se quiserem chegar mais perto será por conta e risco de vocês.” E se sentou.
Ted e Samuel decidiram prosseguir sozinhos.
Tévez ouviu-os rir e conversar por alguns minutos, até que um grito de horror ecoou bem alto. Levantou-se, e foi correndo verificar o que tinha acontecido.
Ao chegar, Tévez se deparou com uma cena chocante: Samuel jazia morto próximo da pedra maldita; Cortado pela metade, seu corpo da cintura para baixo tinha desaparecido. Não havia sinal de Ted.
-“Maldição! Preciso encontrar o outro para que ele explique o que aconteceu, ou terei problemas com a lei!”
Tévez chamou por Ted desesperadamente, e, não obtendo qualquer resposta ou pista dele, subiu na pedra para averiguar se o encontrava.
Enquanto terminava sua subida, um grande olho se abriu bem na rocha a sua frente. Tévez levou um susto tremendo, e se soltou, caindo alguns metros abaixo.
Uma boca grande e cheia de dentes se abriu na pedra, logo abaixo do olho.
Tévez tentou se levantar e correr, mas foi preso pela língua da criatura, que enrolou-se em suas pernas e tragou-o para dentro, devorando-o.
Dias mais tarde, encontraram a máquina fotográfica de Samuel. A última foto continha uma imagem tremida da pedra com sua boca aberta, mas nenhum dos investigadores decidiu acreditar no que a imagem parecia mostrar.
FIM
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O fim do Pai Cícero
O médium Cicero recebia as pessoas em seu salão, para
psicografar e intermediar mensagens entre os vivos e os mortos. Ele podia,
muitas vezes, ver os espíritos acompanhando seus visitantes.
Certo dia, recebeu um garoto que dizia estar acompanhado
pelo próprio irmão, já falecido.
Quando o garoto, chamado João, entrou no salão, Cícero notou
uma diferença na energia do lugar; Ficou mais pesada e escura. Os demais
espíritos que estavam ali ficaram acuados, ou foram embora.
Cícero soube que algo muito ruim havia chegado ali.
João se aproximou para conversar com o médium, que viu junto
com ele a imagem de um menino um pouco mais velho. O fantasma irradiava um
sarcasmo maldoso.
- “Pai Cícero, tenho visto e falado com o meu irmão Augusto,
que morreu ano passado. Mas ele mandou eu fazer coisas erradas, e os meus pais
ficaram muito bravos comigo.”
A luz das velas estavam agitadas, e algumas se apagaram.
Cícero fez alguns sinais em oração, e viu a imagem do garoto
fantasma se transformar em um monstro demoníaco.
-“Garoto, não é o seu irmão que está com você!” , falou
Cícero, muito nervoso.
-“Não escute o que ele diz! Mande-o embora!”, continuou.
O menino João começou a chorar, assustado, os pais dele
foram correndo até ele.
- “O que está acontecendo Pai Cícero?” , perguntaram os
pais.
- “Um demônio está tomando a forma do irmão falecido para
espalhar suas maldades!” Disse o médium.
Então, a entidade do mau atacou Cícero, mas foi impedido
graças ao círculo de proteção formado em volta dele com símbolos e objetos
sagrados. As janelas começaram a tremer até estourarem, e as lâmpadas se
queimaram. As pessoas ali se sentiram enjoadas, um odor de podridão invadiu o
lugar. Um senhor que estava aguardando a vez, teve um ataque cardíaco e morreu
ali mesmo.
A família foi embora.
Naquela noite, o pai do João lia um livro sentado na
poltrona, quando sentiu frio, e andou até a janela para fechá-la. Lá fora, no
breu, ele viu a mãe dele, que tinha morrido anos atrás. Ela o chamava para
fora. O homem sentiu um calafrio, e saiu pela porta para olhar melhor quem
estava no jardim. Foi quando, foi surpreendido por uma serpente venenosa, que o
mordeu. Centenas de serpentes começaram a rastejar pela propriedade. Toda a
família foi picada e morreu.
No dia seguinte, um criminoso viu a porta da casa aberta e
entrou. Enquanto andava pela residência, o bandido viu o próprio pai falecido. O
fantasma paterno o insultava e o repreendia, dizendo coisas horríveis. Até que,
certa vez, o mesmo bandido roubou um veículo de mercadoria, e dirigia
apressado, quando presenciou o pai, esganando-o com as mãos. Ele perdeu o
controle do caminhão, e invadiu um evento publicitário, atropelando e matando
mais de dez pessoas, antes de bater em um poste e morrer.
Uma pessoa sobrevivente da tragédia, caiu então, nas garras
do demônio. Uma mulher chamada Valéria.
Valéria começou a ver a própria avó, que já tinha falecido,
e com quem tivera uma relação muito boa.
Valéria estava indo para a faculdade, caminhando pela rua,
quando viu a sua avó. Apesar da aparência idêntica, algo na expressão dela era
pernicioso, com os olhos de quem só enxerga a maldade. Ainda assim, Valéria,
muito emocionada, chamou por sua avó.
A velha falecida se aproximou de Valéria, sorriu, e tapou os
olhos dela com uma das mãos, segurando a mão dela com a outra. Valéria se
deixou guiar pela entidade.
Enquanto Valéria caminhava as cegas, o médium Cícero que
estava por perto, reconheceu o demônio guiando a moça. Ele correu até ela para
tentar ajudá-la.
-“Menina, espere!” gritou Cícero.
Quando Valéria ouviu e foi ver quem era, percebeu que estava
na beirada de um precipício, prestes a despencar metros abaixo em uma
construção inacabada. Então, a entidade a ergueu no ar e a jogou lá embaixo.
-“Nãão!”, lamentou Cícero.
O demônio, atacou Cícero novamente. Mas, desta vez, o médium
não contava com suas defesas rituais, e foi possuído pelo ser maléfico.
Sem poder controlar suas ações, mas totalmente consciente,
Cícero colocou uma corda no pescoço e se enforcou, morrendo assim.
FIM
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A velha
A senhora Gertrudes costumava contar para seus netos e
netas, que se vissem uma velha na floresta, ou durante a noite perambulando nas
ruas, deviam tapar suas bocas e não dizer uma só palavra. Quando questionada
sobre o motivo disso, ela contava-lhes sempre a mesma história.
Dizia Gertrudes, que, durante uma bela primavera, uma
criança nasceu num vilarejo. Uma menina, que recebeu o nome de Izilda. Mais
tarde, notaram que Izilda tinha uma deformidade, ela não tinha dentes na boca.
Filha de humildes camponeses, desde cedo, a garota era alvo de chacotas.
-“Desdentada!”, “Bruxa!”, chamavam-lhe as pessoas, crianças
e adultos.
Izilda, certa vez, respondeu para um grupo de meninos ricos,
e eles se irritaram com ela. Houve uma séria luta corporal, e os garotos, por
fim, amarraram Izilda em uma árvore no interior da floresta, para morrer.
Cheia de ódio, Izilda, incrivelmente mantinha-se viva, e,
com o passar das décadas, seu corpo ficou duro como um tronco de árvore; Sua
pele ficou grossa e enrugada; Seu cabelo branco e ressecado cresceu bastante. As
cordas que a mantinham presa apodreceram e Izilda estava livre novamente. Em
algum tempo, Izilda recuperou seus movimentos e começou a vagar em busca de
vingança.
Izilda fez da floresta a sua própria morada, e, de vez em
quando, aparecia durante a noite em alguma casa. Caso as pessoas mostrassem
para Izilda que tinham dentes, falando, gritando, sorrindo, chorando ou fazendo
ameaças, por exemplo, Izilda as matava e arrancava seus dentes.
Golpes e projéteis de bala não surtiam muito efeito contra o
corpo endurecido de Izilda.
Conforme as mortes iam acontecendo, e os corpos sendo
encontrados sem os dentes, espalhou-se a notícia de que havia uma bruxa na
floresta, e que era Izilda.
Durante as noites, podia-se deparar com Izilda, encarando
através da janela, ou verificando se as portas estavam ou não trancadas. Quando
conseguia, Izilda entrava, e ia até as pessoas que moravam lá. Com nada
acontecia, somente para aquelas que conseguiam esconder os dentes.
Até que um dia, as pessoas elaboraram um plano para capturar
Izilda. Um sistema conjunto de sinos foi instalado em cada moradia, e quando
Izilda apareceu em uma delas, o morador tocou o sino, alertando a todos que ela
estava ali.
Soldados do rei apareceram, lançando redes sobre ela, e
espetando-a com tridentes, até que a dominaram.
Izilda passou o próximo dia presa em um calabouço, e,
durante a noite, foi levada para a praça principal, onde todos festejavam em
volta da jaula em que ela estava.
As luzes das tochas dançavam ao redor de Izilda. Todas
aquelas bocas cheias de dentes regozijavam-se pela captura dela. As pessoas
riam, cantavam e se embriagavam, entregando-se aos prazeres.
Uma tempestade se aproximava, quando o guarda da jaula foi
tolo para chegar perto demais de Izilda. Izilda agarrou o guarda e o puxou para
dentro, espremendo seu corpo por entre as barras de ferro. Com a festa em seu
auge, quase ninguém viu aquilo acontecer.
Izilda pegou a chave da cela e se libertou, iniciando uma
matança. A chuva misturava-se no chão com o sangue das pessoas. Izilda torceu, desmembrou e mutilou, até que
todos estavam mortos. Todos, menos uma garotinha, que enquanto as mortes
aconteciam, manteve sua boca fechada o tempo todo. Por causa dos relatos dessa
sobrevivente, Izilda, a bruxa desdentada da floresta, continua a ser lembrada
até os dias de hoje.
FIM
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A tumba do feiticeiro
Sir James Willow e seus escavadores, trabalharam por meses,
removendo a areia que, por milênios, cobriu a antiga paisagem. Seu primeiro
achado foi um paredão de cinco mil anos de idade, esculpido em uma antiga
formação rochosa. A parede estava gravada com símbolos e desenhos. Duas crio
esfinges nunca vistas antes, foram desenterradas, alinhadas à frente de onde,
mais tarde, descobriu-se ser uma entrada, que levava da parede, para o
subterrâneo.
Antes que a entrada fosse aberta, especialistas em línguas,
interpretaram mensagens como: “Local proibido pelos deuses”, “Túmulo profano”,
“Maldição no pós morte” e “Perigo”. Três deuses do submundo, desenhados ao
redor do acesso, guardavam-no com suas lanças, que se cruzavam exatamente sobre
o local.
Sir James sentiu muito, quando teve de explodir a porta para
liberar passagem, mas era tão firme, que fora impossível abri-la com picaretas
e outros utensílios que ele dispunha.
Logo após a explosão, um túnel foi revelado, e ele estava
repleto de gás venenoso. Um gás esverdeado, que preenchia um enorme corredor
subterrâneo, saiu para a superfície, alcançando o acampamento. Muitos
trabalhadores morreram ou ficaram doentes.
Depois de um ano, Sir James, que agora tinha saúde
debilitada, reabriu o lugar com um grupo quase todo novo.
Através da passagem seguinte, fios de corda se entrelaçavam
pelo caminho, e quando rompidos, faziam com que pedras caíssem do teto sobre as
pessoas ali dentro, ou bloqueando o caminho.
Gravuras no corredor revelavam cenas de deuses e mortais, em
que um dos deuses do submundo tornara-se amante e fizera favores para um
mortal.
A sessenta metros abaixo da superfície, uma nova câmara se
encontrava lacrada, e na rocha que cobria a entrada, estava gravada a mensagem:
“
“Local do exílio de Enkhetoth, o embalsamador”
Foram necessários meses, até que uma estreita passagem fosse
liberada, e quando isso aconteceu, uma risada de voz masculina ecoou por todo o
complexo, sendo ouvida até por quem estava na superfície. Boatos sobre isso se
espalharam rapidamente entre os trabalhadores, que eram muito supersticiosos.
Só era possível rastejar para seguir adiante, mas o solo era
aguado, e em certo ponto, as pessoas começaram a afundar. Um explorador morreu
ao não conseguir retornar, desaparecendo abaixo da superfície de lama. Uma
ponte de madeira foi construída pouco-a-pouco, até que conseguiram ir adiante.
O túnel se abriu em uma imensa câmara, e no interior dela,
havia um sarcófago de ouro. Ao redor do grande sarcófago, jaziam dúzias de
corpos mumificados espalhados por toda parte, e também uma porção de tesouros,
estatuetas e relíquias antigas.
Com muito cuidado e paciência, os arqueólogos, por fim, removeram
oitenta lacres que mantinham o sarcófago fechado. Em seu interior, encontraram
uma múmia extraordinariamente preservada.
As múmias e a maioria das peças do interior da tumba foram
deixadas no mesmo local. O sarcófago de ouro era muito grande para ser levado
através da passagem de entrada.
Naquela noite, quando o trabalho arqueológico estava
suspenso, três bandidos renderam os guardas, e entraram no lugar para saquear.
A polícia foi informada, e aguardou os ladrões do lado de fora. Porém, eles
nunca saíram. Houveram muitas especulações sobre o que teria acontecido com
eles; Que foram mortos por algum tipo de armadilha antiga, que despencaram em
algum buraco, ou que encontraram alguma passagem ainda não descoberta pelos
arqueólogos.
Alguns dias depois, uma dupla de arqueólogos também
desapareceu ao entrar na tumba.
Incursões de busca pelos dois foram realizadas, mas sem
nenhum sucesso.
O acesso à tumba tornou-se extremamente restrito. Os jornais
ficaram lotados de notícias sobre os desaparecimentos, e até o episódio do
sumiço dos ladrões foi parar no cinema.
Cinco anos após a descoberta da câmara funerária, Sir James
Willow decidiu voltar pessoalmente até o lugar.
Quando chegou na câmara do sarcófago, começou a comparar
suas antigas fotos e registros. Ficou perplexo ao notar cinco múmias a mais. “Como
poderia não tê-las notado antes?”, pensou.
Fazendo uma analise minuciosa com o uso de novos aparelhos, Sir
James encontrou uma nova câmara secreta. Ela estava repleta de ferramentas e
materiais antigos para embalsamento e mumificação.
Um dos empregados de Sir James que analisava as múmias recém
descobertas deu um grito: “Sir James! Essas múmias não são antigas! E ainda há líquido encefálico fresco escorrido dos orifícios nasais delas.”
O empregado, que estava agachado sobre os cadáveres, notou
uma sombra incidir sobre ele. Olhou para trás, e ficou horrorizado ao ver a múmia
de Enkhetoth, ao seu lado, o encarando e rosnando de forma maligna.
A múmia agarrou o homem no pescoço com uma das mãos, e o
ergueu do chão. Depois, com a outra mão, encravou violentamente um artefato pontudo
bem em um dos olhos dele, matando-o.
Quando a múmia soltou o corpo, ele caiu de forma que Sir
James viu sobre o chão da entrada da câmara secreta, a cabeça do seu empregado,
que ainda estava espetada pelo objeto. Ele não acreditava no que via.
A múmia apareceu, e lentamente, caminhou até o arqueólogo,
que estava paralisado de medo. Dizem, que os gritos de Sir James foram ouvidos
não só fora da tumba, mas a quilômetros de distância.
Um ano depois, uma nova equipe de arqueólogos decidiu retirar
a múmia do sarcófago e levar para um museu. Por conta de diversas anomalias, em
comparação com outras múmias antigas, uma análise dela foi feita por
especialistas. Pasmos, eles descobriram que, aquela múmia que estava exposta no
museu, não era Enkhetoth, mas o próprio Sir James Willow.
FIM
--
Destino de lobo
Godfrey Beaston nasceu filho de um lenhador e de uma tecelã.
Sua mãe não produziu o leite materno, e, como viviam no meio de um bosque, era
quase certo de que ele morreria de inanição em pouco tempo. No dia em que
Godfrey nasceu, seu pai saiu de casa pela noite. Desesperado para salvar seu
filho, caminhando mata a dentro, ele avistou uma enorme loba deitada, dando de
mamar para seus filhotes. A luz da lua cheia resplandecia aquela cena.
-“Uma benção de Deus!”, ele pensou. E então, ele lançou uma
rede tecida por sua mulher sobre a loba e a prendeu. Um grande lobo apareceu, e
o lenhador matou-o com um tiro de espingarda. Depois, levou a loba para casa,
abandonando os filhotes.
Godfrey Beaston se alimentou do leite daquela loba quando
era um bebê. Cheia de rancor, a loba produziu um leite que causou a Godfrey uma
terrível maldição. Todas as noites de lua cheia, Godfrey se transformava em uma
fera, metade homem, metade lobo.
Quando cresceu, seus pais começaram a acorrentá-lo durante
as noites de transformação. Até que, num desses dias, depois de beberem demais,
seus pais adormeceram, se esquecendo de acorrentar Godfrey. Já com quinze anos,
Godfrey, transformou-se como sempre acontecia, e movido por seu instinto
predador, matou seus pais.
Após muitos anos, de
caça selvagem, Godfrey foi para a cidade grande, onde conseguiu estudar, vindo
a se tornar um homem da lei. Para manter bem guardado o seu segredo, ele
precisava acobertar as suas matanças. Para isso, ele sempre usava do seu cargo
público para culpar algum mendigo ou andarilho pelos assassinatos.
Porém, com o tempo, as pessoas começaram a duvidar daquelas
histórias. Os ferimentos nos mortos eram sempre iguais, como se tivessem sido
feitos por lobos. Pelos, saliva e urina de lobo eram encontrados por toda
parte.
As pessoas se juntaram para caçar os lobos, temendo que
estivessem atacando na cidade, ou se estivessem muito numerosos, poderiam
também, apenas estar se alimentando dos corpos mortos.
Houve um grande festival de caça, mas as matanças de Godfrey
continuaram. Com a vigia dobrada nas ruas, testemunhas contaram que o autor dos
ataques era não somente um lobo, mas uma fera, medindo três metros de altura,
que podia se mover tanto com as quatro patas, quanto apoiado sobre duas, como
uma pessoa. Seus olhos eram vermelhos como fogo. Garras tão grandes, que
poderiam cortar alguém ao meio. Era veloz e furtivo como um lobo, e ágil para
saltar sobre os telhados.
Godfrey começou a temer que fosse descoberto, e preparou-se para
deixar a cidade. Mas antes, ele vestiu um criminoso com pele de lobo, e armou
um teatro para mais um último julgamento público, que daria fim a sua perseguição.
Colocou um lobo bem alimentado junto do homem fantasiado, e
exaltou que ele nem atacava o sujeito, tamanha a empatia entre os dois.
Aconteceu, que aquele era o exato dia em que ocorreu um
eclipse total do Sol pela lua. E era época de lua cheia.
Quando a sentença do bode expiatório estava para ser dada, a
lua tomou o lugar do Sol, e escureceu em toda a cidade. Na frente de todos,
Godfrey Beaston se transformou. O terror
tomou conta da audiência, enquanto Godfrey ceifava vidas, abrindo seu caminho
para fora dali. Depois disso, nunca mais se soube dele.
FIM
--
A outra estação
Toby era um rapaz que vivia em uma grande metrópole. Certa
manhã, a caminho para o seu trabalho como eletricista, tomou o metrô, que
deveria deixá-lo bem perto de seu destino.
Assim que o trem partiu, houve um grande estrondo, e uma
queda de energia. Alguns segundos depois, as luzes se acenderam novamente, e o
trem prosseguiu através do túnel subterrâneo.
Quando Toby calculava que deveriam estar chegando na estação
final, o trem fez uma curva acentuada. Todos se seguraram com força durante o
movimento brusco. Eles começaram a acelerar; Subindo, descendo e fazendo curvas.
Através das janelas, podia-se ver que estavam percorrendo
uma rota estranha. A parede era cavernosa no início, iluminada apenas pelas
luzes dos vagões, não se parecia nada com o normal. Depois, as paredes, o chão
e o teto desapareceram, como se viajassem no espaço vazio. A escuridão, aos
poucos tomou a cor vermelha, e aí as portas se abriram.
Os passageiros e os objetos ali começaram a flutuar, não havia
mais a ação da gravidade. Não se sentia necessidade de respirar. Somente,
ouviam um som baixo e constante, parecido com um fluxo de água.
Alguns decidiram se impulsionar para fora do vagão, e, assim
que saíram, começaram a ser levados por forças invisíveis, arrastados para diferentes
direções. Estavam a mercê das correntezas misteriosas, que ali existiam.
Toby assistiu àquilo perplexo, e então, decidiu amarrar-se
com um cabo a um dos assentos do trem, antes de sair; Dessa forma poderia
puxar-se novamente para dentro.
Ele colocou-se para fora, e foi igualmente carregado, cada
vez mais para longe, até ser segurado pelo cabo.
Toby começou a distinguir alguma coisa na imensidão
vermelha. Algo parecido com uma ameba gigante, também vermelha, só que com uma
tonalidade mais escura, e que estava se aproximando dele e dos outros. Assim
que a criatura tocou uma das pessoas, essa pessoa também se transformou em uma
ameba igual. Logo, diversas outras criaturas ameba começaram a surgir, indo até
as pessoas e transformando-as em amebas.
Desesperado, Toby puxou o cabo com pressa, afim de retornar
para dentro do trem. Uma das criaturas já estava em seu encalço.
Toby conseguiu retornar para o interior do vagão. A criatura
ameba estava logo atrás, e quando estava prestes a entrar também, a porta
fechou, deixando-a de fora.
De repente, o trem estava cercado pela escuridão outra vez.
Pouco tempo depois, os vagões surgiram no ar, dezenas de
metros acima do mar. Eles despencaram na água, e, de todos os passageiros que
ainda estavam ali, Toby foi o único sobrevivente. Por sorte, ele não perdeu a
consciência com o impacto, conseguiu se desamarrar a tempo, e depois foi resgatado
por um barco de pesca.
Claro que ninguém acreditou na sua história. Entretanto,
ninguém podia explicar como aquele trem que estava desaparecido surgiu no mar.
Obviamente, alguns dos passageiros, ou seus corpos, nunca foram encontrados
também.
Toby foi considerado mentalmente doente por causa de seus
relatos, e, decidido a provar que não era louco, foi detido diversas vezes
causando curtos no sistema elétrico dos metrôs.
FIM
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O coveiro dos mares
Barry Marino nasceu em um bairro pobre de uma cidade
costeira. Quando era criança, seu pai, um minerador, sofreu um grave acidente.
Houve uma explosão nos tuneis, mas ele escapou com vida. Mais tarde, durante
sua adolescência, seu pai, muito velho e doente lhe disse, antes de morrer:
“-Barry, quando a morte vier lhe buscar, você deve barganhar, e trocar a sua
vida pela vida de outra pessoa. Foi assim comigo na velha mina, e eu sobrevivi
para te ver crescer.”
Barry, mais tarde, se tornou marinheiro. Durante uma de suas
viagens em alto mar, o barco foi pego por uma forte tempestade. Tendo certeza
de que morreria, Barry se lembrou das palavras do seu pai. Então, esfaqueou um
dos marinheiros e depois jogou-o ao mar. O barco afundou, e Barry perdeu a
consciência. Porém, milagrosamente acordou na areia da praia. Ele ficou
convencido de que só tinha sobrevivido porque tinha dado ao mar uma outra vida
em troca da sua, e por causa disso, fora poupado.
Barry continuou a trabalhar como marinheiro, e,
ocasionalmente, empurrava os companheiros ao mar durante a noite, ou durante as
tempestades, sem que ninguém visse.
Um tempo se passou, e Barry se tornou capitão de um barco.
Sua confiança e habilidade lhe renderam a fama de talentoso, porém, suas
viagens sempre tinham sumiços misteriosos de tripulantes. Aqueles que Barry
oferecia ao mar.
Certa vez, seu barco surgiu no porto, saindo de dentro de
uma tempestade, e Barry, segurando o timão, era o único a bordo, de uma
tripulação inicial de trinta. Esse acontecimento rendeu-lhe o apelido de “o
coveiro dos mares”.
Sua fama de azarento cresceu muito entre os marinheiros de
todo o mundo, que temiam subir a bordo do mesmo barco que ele.
Por fim, mesmo sem provas contra ele, Barry foi levado à
julgamento acusado de assassinar diversos homens e sumir com o corpo deles no
mar. Além disso, foi acusado também de bruxaria e associação com o diabo.
Quando o veredito culpado foi anunciado, alguns amigos seus
que eram piratas, interviram, salvando-o e colocando-o a bordo de um barco.
Iniciou-se uma perseguição naval de Barry e os piratas, que acabaram sendo
alvejados por balas de canhão, até que o barco deles foi destruído.
Finalmente, Barry se afogou, e um redemoinho se formou bem
onde o barco em que ele estava afundou. O redemoinho aumentou mais e mais de tamanho,
engolindo toda a frota da marinha que tinha o perseguido. Ao todo, dez barcos
foram tragados para o fundo do mar, junto com todas as tripulações.
Todos os anos desde então, um redemoinho se forma naquele
mesmo lugar, exatamente na data em que Barry morreu, e não para de crescer até
que pelo menos um barco seja levado para o fundo do mar.
FIM
--
Mbala Kua
Certa vez, o desmatamento florestal se expandiu de maneira
acelerada, quando os operários adentraram com suas máquinas em território
selvagem. Em determinado local, notaram que a vegetação estava morta, e
diversos animais selvagens se encontravam também mortos, em estado de
putrefação. Tudo ali estava podre, exceto por um tipo de árvore que ninguém
conhecia, cujos frutos eram muito belos e atrativos. Apesar daquele ambiente
funesto, tal tipo de árvore prosperava. Seus frutos eram muito atrativos aos
sentidos.
Alguns dos trabalhadores mais ousados o ingeriram; O sabor
era delicioso. Logo, muitos também comeram da estranha fruta.
Empolgados com a prazerosa descoberta, decidiram levá-la para
vila, onde a venderiam no mercado.
Não haviam-se passado vinte e quatro horas, e quase todos da
comunidade já tinham experimentado daquilo, que tinham chamado de mbala kua.
A sensação do mbala kua era estimulante, levemente
alcoolizada.
No dia seguinte, as pessoas se assustaram com o que viram:
todas as frutas daquele tipo, remanescentes,
estavam horrivelmente podres. Seu odor era como a de um pântano fétido.
Logo, a doença se espalhou, e as pessoas que tinham ingerido
daquela nova fruta começaram a se decompor, ainda vivas.
Membros apodrecidos caiam de uma hora para a outra, a pele
se descolava e os gases corporais explodiam corpo à fora.
As sementes ingeridas começaram a germinar dentro dos
indivíduos, conforme eles se deterioravam. Antes de morrerem, eles podiam ver o
broto de árvore crescendo para fora de suas entranhas.
Em pouco tempo, o lugar perdeu seus animais e sua vegetação,
a não ser, pela árvore do mbala kua.
Mais tarde, encontraram ali, um verso escrito com graxa em
uma parede,: “Mbala kua, seu apetite é vívido, minha saudade é crua”
FIM
--
Canal 842
Era tarde da noite. Um homem chamado Bruno estava em sua
casa, entediado, trocando os canais da tv. Nada do que estava passando
despertava seu interesse. Ele tinha problema de insônia, e assim, continuou com
aquilo, hora após hora.
Desanimado, Bruno foi avançando os canais de sua televisão,
até que não havia mais conteúdo neles, apenas estática. Ainda assim, Bruno
continuou avançando os canais. Canal quatrocentos, canal quinhentos, canal
seiscentos, e assim por diante.
-“Que desperdício! Quantos canais vazios.” Pensou Bruno.
Quando o relógio bateu exatamente as quatro horas da
madrugada, a televisão de Bruno estava sintonizada no canal oitocentos e
quarenta e dois. Ele ia desligar a televisão, mas, de repente, a tela começou a
transmitir uma imagem. Era o interior de uma mansão, e também mostrava um
senhor lendo um livro, sentado em uma poltrona.
Surpreso, Bruno achou muito estranho.
-“Será algum tipo de reality show? Espera, eu conheço esse
homem. É o senhor Mendonza dono do supermercado! Desgraçado. Será que deram um
programa pra ele?”
Mas algo não parecia certo. O senhor em sua tela não indicava
saber que estava sendo filmado, e definitivamente não era um filme ou uma
novela. Não haviam falas ou narrativas.
Então, algo sinistro aconteceu naquela cena. Uma das portas
que levavam até o salão que era mostrado se abriu, e um monstro horrível
apareceu. Era uma figura demoníaca. O senhor Mendonça se levantou assustado,
gritando. Acuado em um canto, foi estraçalhado pela criatura.
Depois disso, a transmissão desapareceu.
Aquelas cenas perturbaram Bruno, ele tomou calmantes, e acabou
pegando no sono. Ao acordar, Bruno ligou a televisão no canal oitocentos e
quarenta e dois, mas não havia nada. Então, colocou no canal do noticiário, que
dava a notícia do assassinado do senhor Mendonza.
-“Esta noite, foi palco de um terrível crime. O senhor
Mendonza, que era dono de um supermercado, foi brutalmente assassinado em
circunstâncias misteriosas. A polícia ainda não encontrou nenhum suspeito.”
Bruno não conseguia acreditar. Ele tinha visto aquilo
acontecer noite passada em sua televisão, e não podia explicar isso.
Na noite seguinte, Bruno deixou sua tv ligada no canal
oitocentos e quarenta e dois, e esperou. Nada apareceu, apenas estática. Fez o
mesmo na noite seguinte, e na seguinte, e na seguinte. Mas não aparecia nada.
Bruno começou a frequentar um psiquiatra.
Exatamente um mês depois, às quatro da manhã, o canal
oitocentos e quarenta e dois mostrou novamente uma cena. Um quarto, e nele,
estava o seu psiquiatra, dormindo na cama.
-“Não pode ser! Isso não é real!” Pensou Bruno.
Então, na imagem, a janela do quarto se abriu, e uma
criatura horrenda apareceu lá fora.
Bruno pegou o celular e ligou para o seu psiquiatra. Ele viu
na tela de sua televisão o doutor acordar e atender o telefone.
-“Doutor! Você precisa sair daí! Tem algo fora da sua casa,
na janela!”
-“Bruno, você está tendo algum tipo de surto! Como pode me
ligar uma hora dessas?”
-“É serio doutor! Você precisa acreditar em mim eu posso ver
na minha televisão.”
-“Não seja ridículo.” Disse o doutor.
Bruno viu a criatura aparecer novamente, e dessa vez, ela se
esgueirou para dentro do quarto. Era diferente do primeiro monstro, mas
igualmente horrível. Quando o doutor a viu, começou a gritar. Aquele ser
despedaçou o doutor, e, por fim, segurando a cabeça dele em sua garra, se
aproximou da câmera, olhando fixamente. Como se estivesse encarando Bruno.
No dia seguinte, a notícia saiu logo cedo no jornal. Um
renomado psiquiatra fora assassinado enquanto dormia em seu quarto.
A polícia bateu na casa de Bruno. Tinham encontrado a
ligação dele no número do psiquiatra no horário do assassinato, e também os
relatos sobre o caso do dono do supermercado que o doutor tinha anotado.
Diante das circunstâncias suspeitas e dos argumentos
delirantes de Bruno, ele acabou em um manicômio.
Um mês tinha se passado. Uma enfermeira abriu a porta do
quarto, trazendo consigo uma pequena televisão.
-“Um presente pra você Bruno.”
Durante a noite, Bruno não resistiu, e ligou a televisão no
canal oitocentos e quarenta e dois. Quando eram quatro horas da manhã, a
estática deu lugar para uma apavorante imagem. Bruno estava vendo a si mesmo
naquele quarto. Ele tentou sair, mas a porta estava trancada. Ele tentou
gritar, mas ninguém o ouvia. Um monstro apareceu, saindo debaixo de sua cama
com uma gargalhada maligna. Da mesma maneira que aconteceu com os outros, o monstro
matou Bruno, e nunca ninguém conseguiu explicar como ele foi morto.
FIM
--
O Morto
Em um pequeno vilarejo, as pessoas viviam uma vida simples.
Porém, uma história incomum pairava
sobre o lugar a séculos. Um sujeito misterioso costumava atrair a atenção de
alguns, surgindo de vez em quando nas proximidades do cemitério.
“Um vagabundo”, diziam uns.
“Um louco”, diziam outros.
Mas quem o conhecia, o chamava de o “Morto”.
-“Lá está o Morto!”, diziam algumas crianças, animadas para
ir conversar com ele.
O Morto gostava de contar histórias, era gentil e educado.
Mas sua aparência não era das melhores: vestia trapos velhos, andava sempre
descalço, e sobre a cabeça usava um chapéu sujo. Sua pele era pálida, seus
olhos fundos e face arroxeada. Ao redor do pescoço, uma marca escura, como um
hematoma.
O Morto costumava contar sobre quando foi enforcado.
-“Há muito tempo atrás, eu era um artista. As colheitas
estavam muito ruins, a fome assolou essa região. Pessoas desesperadas começaram
a roubar, comida, animais e dinheiro. Injustamente, fui acusado de roubar meia
dúzia de ovos. Um crime cometido por outra pessoa. Não houve julgamento.
Amarraram uma corda em meu pescoço e me penduraram numa árvore, até que meu
coração parasse de bater.”
Alguns acreditavam, outros não, mas suas histórias prendiam
a atenção de quem as ouvisse.
-“Por algum motivo, fui esquecido no mundo dos vivos. Quando
abri meus olhos, vi que estava coberto de terra, fundo em uma cova, da qual
tive de me esforçar para sair.”
Depois de um tempo, as pessoas voltavam para suas casas, e o
Morto desaparecia cemitério a dentro.
Algo mais, perturbava as pessoas daquele lugar: de tempos em
tempos, pessoas sumiam sem deixar vestígios. A maioria, eram muito amigas do
Morto. E isso acabou por despertar a desconfiança das pessoas.
O jovem Mark Sholsen tinha se tornado muito próximo do
Morto. Eles ficavam até mais tarde, brincando e conversando. Até que um dia, o
Morto o convidou para acompanhá-lo até onde ele morava, além do cemitério, em
uma caverna no interior da mata.
-“Não fosse por vocês, que vêm ouvir as minhas histórias, eu
estaria completamente só no mundo.” Disse o Morto para o jovem, enquanto
deixavam as lápides para trás, e cruzavam os limites do vilarejo.
Já era noite, quando chegaram no covil do Morto. Estava
muito escuro para ver, mas Mark notou diversos objetos e símbolos que pareciam
ser de razões rituais. Foi quando começou a duvidar se tinha sido uma boa ideia
ir ali. Um cheiro podre invadia suas narinas.
-“Espero que entenda senhor Sholsen. Um dia, o povo da vila
vai querer se livrar de mim. Eu preciso de uma companhia, que me ajude mundo a
fora.”
O Morto então acendeu uma tocha. Subitamente Mark viu
diversos corpos pendurados com corda pelo pescoço. Eram as pessoas que tinham
desparecido anos atrás.
-“Nenhum destes deu certo. Mas quem sabe a morte se esqueça
de você também.”
O Morto atingiu Mark com uma barra de ferro nas pernas.
As pessoas da aldeia se organizaram para ir atrás do jovem.
Juntas, encontraram a caverna do Morto, que não estava lá. Viram todos aqueles
corpos enforcados, das pessoas que tinham desaparecido, mas não o corpo de Mark
Sholsen.
A partir de então, o Morto só passou a ser visto ao longe,
nunca se aproximando das pessoas. E, ao lado dele, Mark Sholsen sorri, e acena
para seus conterrâneos.
FIM
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Jogo de azar
Todos os dias, Dona Fortunata apostava em jogos de sorte e
azar. Mas, certamente, ela mais perdia do que ganhava, e quando ganhava, nunca
era grande coisa. Então, em uma belo fim de tarde, ela saiu de casa para fazer
o seu jogo, quando reparou pelo caminho uma tenda que nunca tinha visto antes.
Sobre a entrada da tenda, estava escrito: “Jogue com o mago e as chances estão
a seu favor”. Curiosa, decidiu verificar.
O homem dentro da tenda era um tipo esquisito, baixo e
recurvado, de pelagem ruiva e cavanhaque. Vestia uma roupa nada comum naquela
região, e fumava um cachimbo.
-“Bem vinda à tenda do mago Leprechan minha senhora. Faça um
pedido e nós jogaremos. Se você vencer, me pagará três moedas, e eu te ajudarei
em seu pedido com a minha magia. Se você perder, não me paga as moedas, e o seu
azar, será o meu azar.” Disse o mago sorrindo.
-“Me ajudar com a sua magia? Que bobagem.” Retrucou Dona
Fortunata. Mas como não podia evitar a jogatina, decidiu experimentar.
-“Veja, dentro desta sacola existem botões vermelhos e
botões verdes. Estarão misturados, e você deverá colocar sua mão ai dentro, sem
olhar, e pegar uma. Se pegar um botão vermelho, você vence, e se pegar um botão
verde você perde. “
Dona Fortunata olhou dentro da sacola, e tinham muitos
botões vermelhos, mas quase nenhum botão verde.
-“As chances de eu ganhar são muito boas. Mas é claro, se eu
não ganho não te pago não é mesmo?” Disse ela.
O mago fechou e sacudiu a sacola para misturar os botões.
Então, Dona Fortunata pediu uma cabra leiteira e enfiou a mão lá dentro para
pegar um botão. Ela tirou um botão vermelho, e deu três moedas ao homem.
-“Parabéns, minha senhora.” Disse o mago. “Você venceu, e uma
cabra leiteira será sua.”
Pela noite, Dona Fortunata ouviu um gemido no quintal de sua
casa, e quando olhou, viu uma cabra ali, cheia de leite.
Nos dias seguintes, a senhora voltou na tenda do mago,
fazendo pedidos cada vez menos modestos. Ela estava sempre vencendo, e seus desejos
seguiam sendo realizados.
Até que, um dia, ela retirou um botão verde da sacola.
-“Oh, hoje eu perdi.” Lamentou Dona Fortunata.
O mago falou solenemente: -“Que pena. Mas como eu tinha te
avisado, o seu azar, será o meu azar.”
Naquele instante, Dona Fortunata se transformou em um botão
vermelho, que foi colocado dentro da sacola.
FIM
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Pesadelo
Drina Caruzzo era adolescente quando explorou um antigo castelo
abandonado com seus amigos. Eles tiveram de entrar por uma parte quebrada da
parede, pois o local era proibido de visitar e a porta estava trancada.
O lugar estava intocado à séculos, repleto de poeira e teias
de aranha. A mobília e a arte eram do dono original do castelo, o Conde Bartholomeu.
Iluminando com a lanterna de seus celulares, os jovens
seguiram pelos extensos corredores, subiram e desceram escadas e entraram em
alguns cômodos. Em um grande salão, viram um quadro pintado com a imagem do
conde. A imagem mostrava Bartholomeu usando um sobretudo negro que cobria todo
o seu corpo, um chapéu sobre a cabeça e segurando uma bengala. Seu olhar deu
calafrios nos intrusos. Eles decidiram ir embora.
À partir daquele dia, Drina começou a ter pesadelos
recorrentes, em que era perseguida pelo Conde Bartholomeu dentro de seu castelo.
Ela não sabia explicar porquê, mas ele era assustador. Em seus sonhos, aquele
homem vestido com sobretudo negro, chapéu e bengala, a perseguia pelos caminhos
escuros, e sempre chegava muito perto de alcançá-la, antes que ela acordasse
ofegante.
Anos se passaram, e aquele pesadelo continuava acontecendo.
Por isso, ela tentou diversos tipos de terapia mas nenhum surtiu efeito. Até
que, fez um tratamento experimental que inibiu sua atividade cerebral durante o
sono. Naquela noite, ela não sonhou. Mas para seu horror, começou a ver o conde
enquanto estava acordada, como uma alucinação assustadora que vinha inesperadamente.
Drina decidiu que voltaria naquele castelo onde tudo
começou. Talvez encontrasse alguma solução por ali. Não podia mais continuar
correndo daquela figura sinistra.
Ela entrou no castelo pelo mesmo lugar que tinha entrado
anos atrás. Estava sozinha dessa vez.
Drina passou por uma porta que dava acesso a um corredor, e
quando estava na metade desse corredor, se virou, olhando para trás. Viu o
conde na sala anterior, encarando-a.
Ela decidiu que não correria dessa vez.
-“Você não me assusta mais! Você não existe, é só uma
ilusão!”, gritou ela.
Então, o conde Bartholomeu começou a caminhar em sua
direção, e ela percebeu que podia ouvir o barulho dos seus passos. Quando ele
passou pela porta, a fechou.
Aterrorizada, Drina começou a correr. Seu perseguidor estava
atrás, e em certo ponto, ela chegou em uma sala sem saída. Ela empurrou a
pesada porta de ferro fechando-a lá dentro. Era o antigo calabouço do castelo,
onde jaziam uma porção de esqueletos. A porta se trancou, e ela nunca mais
conseguiu sair dali.
FIM
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Alienígenas
Em um sistema solar vizinho da Terra, uma espécie se
desenvolveu praticamente sozinha num planeta. Extremamente inteligentes, tais
seres se desenvolveram muito, tecnologicamente, mas não conheciam a maldade nem
a guerra. Ali, todos viviam harmoniosamente se ajudando mutuamente. Em certo
ponto, começaram a exploração espacial, e depois, descobriram uma maneira de
viajar grandes distâncias através do espaço. Guiados por inúmeros indícios de
atividade na Terra, vieram para cá.
Quando os alienígenas chegaram, se depararam com uma guerra
de proporções globais.
-“Eles disparam metal uns nos outros! Queimam suas cidades!
Destroem e matam!”
Disseram, assustados em ver a tecnologia usada para fins
violentos.
Algumas de suas naves foram abatidas por poder de fogo
terráqueo. Seus tripulantes foram mortos e dissecados.
Eles aprenderam o conflito com os humanos, e pela primeira
vez, sentiram raiva e desejo por vingança.
Retornaram ao planeta deles, e iniciaram seu próprio
armamento. Organizaram exércitos e desenvolveram armas mais avançadas do que a
dos terráqueos.
Cinquenta anos depois do primeiro contato, eles voltaram com
uma grande frota.
O planeta Terra não estava mais em guerra total. Eles não
foram atacados nos céus, como esperavam. Decidiram enviar soldados batedores no
solo.
Presenciaram cenas de afeto entre as pessoas. Afinal, os
terráqueos eram capazes de sentir empatia uns pelos outros e pelos outros seres
do planeta. Também empregavam sua tecnologia para ajudar e curar.
Notaram que diversas espécies na Terra naturalmente viviam
em conflito pela sobrevivência, e por isso, os humanos tiveram de evoluir carregando
esse comportamento agressivo, mas não eram sempre assim.
Enquanto um alienígena reportava da Terra o que estava
presenciando para os comandantes nas naves, foi visto por uma criança humana. A
criança, amigavelmente lhe entregou uma flor de lótus como presente.
Depois disso, os alienígenas decidiram interromper a missão
de ataque e foram embora. Eles, não eram mais ingênuos quanto as outras
criaturas do Universo, e passaram a somente nos observar.
FIM
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Ozuri
Hideki, Kana e Tomiko eram amigos, e cada um trabalhava em
uma área diferente. Hideki era dono de um restaurante, Kana era motorista de
aplicativo e Tomiko, atriz. Os negócios iam mal para todos eles.
Certo dia, marcaram um encontro num café para conversar.
Papo vai, papo vem, começaram a se queixar dos problemas do serviço e das
dificuldades financeiras que enfrentavam.
Hideki se lembrou de uma história que seu avô lhe contou,
quando ele era criança. Não era uma das muitas lendas urbanas recentes, mas um
conto antigo e cheio de superstição. Hideki decidiu contá-lo para suas amigas.
-“Meu avô me falou sobre um diabo chamado Ozuri. Ele se
disfarça de humanos ou de animais, e testa o caráter da pessoa durante três
dias. Se ela for honesta e boa, terá seu maior desejo realizado. Caso
contrário, Ozuri a punirá, lançando-a em um inferno especialmente elaborado
para ela”
Kana e Tomiko ficaram curiosas e Hideki continuou:
-“Entretanto, para que alguém seja testado por Ozuri, deve
primeiro realizar o ritual para invocá-lo. Que é: durante uma tempestade,
quebrar um cadeado pensando no seu desejo, fazer um corte nas palmas das mãos,
e com o corpo nu, rastejar em círculos enquanto pronuncia seu nome, Ozuri, dez
vezes.”
Por pior que aquilo parecia, eles decidiram tentar. E assim
fizeram durante a próxima tempestade.
No primeiro dia de Hideki, ele recusou-se a dar comida para
um homem esquelético e faminto que apareceu sem dinheiro no seu restaurante.
Porém, aquele homem era na verdade o Ozuri.
Hideki desapareceu do mundo, e surgiu em um salão onde
acontece um banquete farto, e das mais variadas refeições. Sempre que Hideki
tenta comer ou pede por uma refeição, sua boca é costurada e ele morre de sede
e de fome. E então ele ressuscita e o processo se repete.
Kana passou pelo primeiro dia, mas no segundo, enquanto
dirigia, viu um cachorro velho deitado no meio da rua. Ela desviou do animal e
seguiu em frente. O cão era o Ozuri. Kana desapareceu do mundo, e surgiu em um
túnel sem começo e nem fim. Sempre aparece um trem vindo de alguma das direções,
e a atropela, não importa o quanto ela corra.
Tomiko passou pelo primeiro dia e pelo segundo, e durante o
terceiro dia, Tomiko recebeu uma ligação de um diretor renomado, dizendo a ela
que ela tinha conseguido o papel como estrela da maior produção cinematográfica
de todos os tempos. Muito feliz, Tomiko comemorou o seu desejo realizado. Como
o diretor a pediu, ela foi imediatamente até a produtora. Quando estava na
porta do lugar, uma anciã vestindo trapos, e com feridas na pele lhe perguntou
se ali era a produtora, pois ela seria uma estrela daquele mesmo filme. Tomiko
tomada por repulsa disse à senhora que não era ali, e que ela jamais seria
estrela de qualquer filme.
A anciã, era na verdade, o Ozuri.
Tomiko desapareceu do mundo, e surgiu em uma jaula. Pessoas
ao redor riem dela, enquanto sua pele enxe de bolhas, apodrece e cai, sempre se
repetindo o mesmo processo.
O que Hideki não se lembrou de contar, é que na história de
seu avô, Ozuri tinha se sentido enganado quando, depois dos três dias de
provações, a pessoa que teve seu desejo realizado, mudou drasticamente para o
mau. Por conta disso, Ozuri, dali em diante, costuma realizar o desejo das
pessoas ainda no terceiro dia, para não correr o risco de errar novamente.
FIM
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O CULTO DO
LABIRINTO
CAPÍTULO 1
Gordon e Vanessa eram um jovem casal. Recentemente, haviam
se mudado para uma cidade pequena, numa região montanhosa.
Certa vez, enquanto passeavam com outras pessoas em ruínas
antigas, próximas da cidade deles, avistaram três pessoas mais afastadas do
grupo, que os encaravam. Eram dois homens e uma mulher. Esses três vestiam-se
de forma diferente, com roupas que pareciam trajes cerimoniais. Um dos homens
acenou para eles.
O casal tentou não dar muita atenção a essas pessoas, e
tentaram ignorá-las.
Alguns dias depois, Gordon e Vanessa andavam pela praça da
cidade deles, e, quando passavam pela grande fonte central, perceberam aqueles
mesmos três indivíduos ali, só que agora tinham mais cinco deles. Dessa vez,
não vestiam aquelas roupas, mas ainda assim, seus trajes eram bem exóticos, com
muitas peças pretas, brincos, colares e tatuagens.
O casal reconheceu aqueles três pela forma que os olhavam.
Ainda no mesmo dia, alguns minutos mais tarde, deram de cara
com uma mulher daquele grupo estranho. Levaram um susto quando ela surgiu de
repente, e falou com eles: -“Oi. Vocês são novos por aqui, não são? Eu sou Tina.”
-“Ah, olá. Nos mudamos a pouco tempo sim. Eu sou Gordon, e
ela é Vanessa, minha esposa.” Respondeu Gordon, tentando agir de maneira
despreocupada.
-“Escuta, meus amigos querem conhecer vocês. Por que vocês
não vêm conhecer o pessoal?”
Gordon e Vanessa se entreolharam, sem muita certeza. Por
fim, acabaram cedendo, e seguiram a mulher até a fonte, onde estavam os outros.
Tina apresentou a todos. Começou com o homem que havia
acenado para eles nas ruínas: “Este, é Adrian. Os outros são Lázaro, Camile, Gustav,
Gabriel, Erick e Wanda.”
O casal se apresentou:
-“Prazer em conhecê-los, eu sou Vanessa”.
-“Eu sou Gordon, prazer em conhecê-los.”
Adrian sorriu e disse: -“Sejam bem-vindos ao nosso pequeno e
seleto círculo de amizades.”
Então, enquanto caminhavam pelas ruas da cidade, conversaram
sobre como era viver ali, sobre como eram as pessoas que moravam ali e sobre as
ocupações de cada um deles, até que passaram a conversar sobre magias e
rituais.
-“Acho interessante, mas nunca vi nada que realmente me
convencesse da existência de poderes mágicos ou de coisas sobrenaturais.” Disse
Gordon.
-“A minha mãe era uma bruxa, ou algo assim.” Disse Vanessa.
Adrian tirou do bolso um cristal roxo, e disse: -“Prestem
atenção naquele cara.”
Um homem estava andando do outro lado da rua. O cristal
começou a brilhar na mão de Adrian, e o homem paralisou.
-“O que você fez?” Perguntou Vanessa, enquanto o restante do
grupo ria.
O cristal parou de brilhar, e o homem voltou a andar como se
nada tivesse acontecido.
-“Veja aquele cachorro” Disse Adrian. O cristal começou a
brilhar novamente em sua mão, e um cachorro que corria na rua paralisou como se
ainda estivesse correndo, até que o brilho desapareceu e o animal voltou ao
normal.
-“Minha nossa! É impressionante! Como você fez isso?”
Perguntou Gordon, estupefato.
Adrian guardou o cristal novamente em seu bolso, e disse:
-“Apareçam amanhã na fonte, pelo fim da tarde, e lhes contaremos.”
No dia seguinte, Gordon e Vanessa decidiram ir até o local
combinado. Ambos estavam perplexos demais para ignorar o que viram, apesar de
sentirem um pouco de medo daquelas pessoas.
Quando chegaram no lugar, foram novamente bem-recebidos pelo
grupo. Conversaram amigavelmente por alguns minutos, até que Wanda perguntou a
Vanessa se ela já tinha experimentado um fruto da árvore que crescia naquela
cidade. Vanessa respondeu que não.
–“São deliciosos.”
Disse Wanda, depois tirando do bolso uma luva e vestindo uma mão com ela. Wanda
ergueu a mão coberta pela luva com a palma apontando a árvore a que ela se
referira, e que estava a cerca de uma dezena de metros deles. Foi quando um
fruto da árvore veio voando até a mão dela. Wanda ofereceu-a para Vanessa: -
“Quer experimentar?”
-“Meu deus!” Disse Vanessa. –“Acho que não, obrigada.”
Gordon, então disse: “Bem, vocês ainda não nos disseram como
conseguem fazer essas coisas. Confesso que estou bem curioso para saber!”
Adrian deu um suspiro, e disse: -“Se vocês querem realmente
saber o que está se passando, então terão de vir conosco até um lugar secreto.
Mas devem jurar que tudo o que verem e ouvirem lá, manterão em completo
segredo.”
CAPÍTULO 2
Gordon e Vanessa juraram. E quando já era quase noite, o
grupo saiu dos limites da cidade, passaram pelas antigas ruínas, e seguiram por
um caminho difícil, subindo pela montanha, até chegarem a entrada de uma
caverna.
No interior da caverna, Erick e Gabriel acenderam tochas que
estavam fixadas nas paredes, e então, todos entraram. Haviam muitos símbolos
gravados nas rochas, e diversos objetos, joias e artefatos estranhos espalhados
pelo local. Mais ao fundo, havia um grande baú, no centro de um círculo
desenhado com tinta preta no chão. Adrian pegou uma chave em seu bolso, e o
abriu.
Dentro do baú, tinha roupas cerimoniais, máscaras douradas e
um manuscrito.
Adrian quebrou o silêncio e começou a falar:
-“Encontrei este lugar anos atrás, juntamente com Jerônimo,
um amigo nosso que se foi. Achei esse baú, e, dentro de um esqueleto, a chave.
Lázaro removeu um tecido azul de um dos cantos da caverna, e
revelou um esqueleto gigante, com uma coroa sobre o crânio e sentado em um
trono; Uma grande espada manchada de sangue estava a seus pés.
Adrian disse: -“Quando usei a chave para abrir o baú, achei
dez roupas e dez máscaras, e junto, esse manuscrito com um antigo idioma. Eu o
copiei, e levei para um velho conhecedor de línguas antigas. De acordo ele,
aqui diz: ‘Os dez escolhidos vestidos com as roupas sagradas de Mitrican e
usando as máscaras do destino devem abrir a porta para o labirinto da riqueza
sem fim’.
Erick cobriu novamente o esqueleto com o manto. Tina
sussurrou para Gordon e Vanessa: -“Adrian diz para cobrirmos o esqueleto quando
estivermos aqui. Acho que ele tem um pouco de medo dele.”
Adrian prosseguiu: -“E também, aqui diz: ‘No lugar de
inúmeras bênçãos e delícias, somente o Perseguidor deve-se temer. Os portais
dourados indicam a saída.’
-“E vocês já entraram nesse labirinto?” Perguntou Gordon.
Camile respondeu: -“Sim, já entramos algumas vezes. Todos os
tesouros que vocês estão vendo aqui, e também nossos artefatos mágicos vêm de
lá.”
-“Mas precisamos de dez pessoas para entrar.” Disse Gustav.
-“Por isso vocês nos chamaram...” Concluiu Vanessa.
-“Mas, se vocês já entraram antes, o que aconteceu com os
outros dois?” Perguntou Gordon.
O grupo se entreolhou em silêncio por alguns instantes.
Então, Lázaro disse:
-“Os outros dois eram Jerônimo e Alissa. Os dois estão
mortos.”
Gordon disse: - “Sinto muito. Mas o que aconteceu com eles?”
Adrian disse: -“Tem uma coisa que precisamos contar a vocês,
antes de entrarmos no labirinto. Lá dentro não existem sombras naturais,
somente uma sombra... uma criatura sombria, o Perseguidor. Se vocês avistarem
uma sombra, ou alguém que não seja um de nós, corram, o mais rápido possível à
procura de um portal dourado. O portal dourado é a saída do labirinto.”
-“E o que acontece caso o Perseguidor nos alcance?”
Perguntou Vanessa.
-“Ele toma o seu corpo, e tenta matar a todos.” Respondeu
Gabriel.
-“Nós fugíamos dele, porque ele é assustador, mas também não
sabíamos o que aconteceria, até que Jerônimo foi pego. Quando voltou, Jerônimo,
tomado pelo Perseguidor, aguardou os outros. Alissa foi a primeira a retornar
depois. Em seguida, Adrian. Adrian viu Jerônimo matar Alissa com uma pedra, e
então, usou a espada do esqueleto para matar Jerônimo.” Disse Tina.
Gordon e Vanessa, muito assustados com o relato, olharam
Adrian; Sua expressão era séria e sombria.
Adrian disse: -“É um risco que todos corremos. Mas existem
objetos de poder inimagináveis dentro do labirinto, e por isso, todos
concordamos em voltar para dentro dele.”
-“Eu não sei...” Disse Gordon meio atordoado.
-“Você é um de nós agora.” Disse Adrian. –“Não é possível
voltar atrás.”
-“Mas, e se nós não concordarmos?” Perguntou Vanessa.
-“Nós insistiremos...” Disse Adrian, com um tom incisivo na
voz.
Então, Adrian começou a distribuir as roupas e as máscaras.
-“Preparem-se, irmãos e irmãs. As portas do labirinto se
abrirão mais uma vez para nós.”
Todos, um a um, colocaram a roupa para o ritual e a máscara.
Sentindo-se sem opção, Gordon e Vanessa fizeram o mesmo.
-“O que vocês encontrarem dentro do labirinto, pertence a
quem encontrou. Se avistarem o Perseguidor, procurem imediatamente a saída, e
se possível alertem os outros.” Disse Adrian, já usando a roupa e a máscara.
Camile, então, disse a Gordon e Vanessa: “Escutem, é
possível perceber que o Perseguidor está presente, se ficarem atentos. O local
vai ficar sutilmente mais escuro, e as cores todas mais... opacas. Boa sorte a
vocês.”
-“Boa sorte a todos nós.” Disse Gustav.
-“Façam um círculo sobre a linha no chão.” Disse Adrian.
Quando todos assim o fizeram, um buraco negro se abriu sob
seus pés, e seus corpos caíram em um vazio de escuridão, até que surgiram
dentro de um lugar luminoso. O céu era completamente branco. As paredes verdes
variavam em altura e em largura. O chão era liso e também era verde. Então,
todos se separaram. Todos, menos Gordon e Vanessa, que decidiram seguir juntos
pelo labirinto.
CAPÍTULO 3
-“Parece que estamos sonhando.” Disse Vanessa.
-“É bem real pra mim.” Disse Gordon.
Seguiram por um caminho que mais a frente se dividia em
três. Foram pelo meio, que também veio a se bifurcar em mais dois. E assim,
cada caminho que escolhiam levava para muitos outros. Até que deram de frente
com um beco sem saída, e no chão havia um pequeno objeto em forma de estrela de
cinco pontas.
-“Bem, já que encontramos, acho que é nosso.” Disse Gordon,
que pegou o objeto.
-“O que será que isso faz?” Perguntou Vanessa.
-“Descobriremos mais tarde.” Disse Gordon.
Os dois continuaram andando pelo labirinto, até que viram
uma pessoa do grupo carregando uma taça prateada. Era Wanda.
-“Olha o que eu encontrei.” Disse Wanda empolgada. –“Deve
ter algum poder mágico.”
-“Nós também encontramos essa estrela.” Disse Vanessa.
-“Uau. Que bom pra vocês.” Disse Wanda. –“Bom, vou continuar
procurando mais alguma coisa. Até mais.” E Wanda seguiu por um caminho diferente
do casal.
Gordon e Vanessa continuaram caminhando, até que deram em
outro beco sem saída. No chão, havia um colar com um medalhão. Vanessa o pegou.
-“Acho que tivemos sorte de novo.” Ela disse.
Continuaram andando pelo labirinto, até que Vanessa teve a
impressão de que o local havia escurecido um pouco.
-“Gordon, lembra o que Camile disse, sobre ter cuidado
quando o local ficasse mais escuro? Você não acha que ficou mais escuro?” Falou
Vanessa.
-“Não tenho certeza. Talvez.” Disse Gordon. –“Mas sinto que
a temperatura caiu um pouco.”
-“Verdade.” Disse Vanessa. –“Vamos procurar o portal dourado
para sairmos daqui.”
Os dois caminharam mais um pouco, até que Gordon tocou no
braço de Vanessa.
-“Vanessa, espere. É verdade que aqui não existem sombras.
Mas olha ali, naquela curva, tem uma sombra incidindo no chão.”
Então, ficaram alguns segundos em silêncio, observando, até
que Gordon gritou: -“Vanessa, vamos! Corre!”
Os dois saíram correndo, ao mesmo tempo em que aquela sombra
se transformou em uma figura demoníaca negra e foi na direção deles.
Gordon e Vanessa correram pelo labirinto, tomando muitos
caminhos diferentes, e ignorando alguns objetos que viam, até que se depararam
com um portal dourado e entraram nele.
Os dois apareceram novamente na caverna. Alguns dos outros
já haviam voltado, e, um a um, o restante foi ressurgindo do chão. Adrian foi o
último a voltar, e estava um pouco assustado. Adrian disse: -“Todos vocês,
digam o seus nomes.”
-“Lázaro”, -“Erick”, -“Wanda”, -“Gabriel”, -“Tina”,
-“Gustav”, -“Camile”, -“Gordon”, -“Vanessa”
-“Ótimo. Todos estamos de volta.” Disse Adrian.
Eles riram e abraçaram uns aos outros.
-“Nós o vimos... o Perseguidor.” Disse Gordon.
-“Eu também. Por pouco ele não me pegou.” Disse Erick.
-“Vejam o que eu encontrei! Um dardo!” Disse Gabriel.
-“E eu uma ampulheta!” Disse Camile.
-“Eu encontrei uma semente!” Disse Lázaro.
-“E nós encontramos um colar com um medalhão, e também um
objeto em forma de estrela!” Disse Vanessa.
-“Não testaremos nossos achados aqui entre nós. Podem ser
perigosos.” Disse Adrian, que segurava um cetro.
Então, após uma oração, apagaram as tochas que iluminavam o
interior da caverna, e fizeram o caminho de volta até a cidade. Ainda era noite,
quando Gordon e Vanessa chegaram em sua casa. Exaustos, se deitaram e dormiram.
Na manhã seguinte, tiveram de ver os objetos que encontraram
no labirinto para terem certeza de que não haviam sonhado tudo aquilo.
-“Como testaremos essas coisas?” Perguntou Vanessa.
-“Só saberemos quando tentarmos.” Disse Gordon, pegando sua
estrela. Ao concentrar-se no objeto, ele começou a brilhar, e então tudo no
planeta desapareceu para Gordon. Ele se viu totalmente rodeado pelas estrelas,
pelo Sol e pela Lua. Conseguia ver claramente todo o esplendor do cosmos.
-“Oh! Isso é maravilhoso!” Exclamou Gordon, derramando
lágrimas. E então, quando decidiu interromper o poder do objeto, Gordon novamente
viu ressurgir todas as coisas que estavam ao seu redor.
-“O que você viu Gordon?” Perguntou Vanessa.
-“Depois eu deixo você ver por si mesma.” Ele respondeu.
Vanessa colocou o colar com o medalhão e se concentrou no
objeto. Logo, ela começou a sentir o seu poder. Um campo de força violeta a
envolveu.
-“Eu também estou vendo isso Vanessa!” Disse Gordon.
-“Sim... é incrível!” Disse Vanessa.
Mais tarde, os dois foram até a fonte da praça para
encontrar o grupo. Eles estavam lá. Todos contavam animados sobre o que
descobriram dos objetos que pegaram no labirinto.
-“Eu enchi a minha taça de vinho. E quando fui bebe-lo, ele
nunca se esgotava!” Disse Wanda.
-“Eu plantei a minha semente. Em poucos minutos, cresceu uma
árvore, com folhas de ouro e de prata.” Disse Lázaro.
-“Todos nós conseguimos alguma coisa de valor.” Disse
Adrian.
O grupo continuou conversando por mais um tempo, até que
todos foram embora.
Gordon e Vanessa foram até o bar da cidade, e tomaram
algumas bebidas fortes, conversando sobre tudo o que estava acontecendo. Então,
voltaram para casa.
Quando já era noite, ouviram batidas na porta. Eles a
abriram. Era Tina, que lhes disse:
-“Adrian está chamando a todos do grupo. Ele quer entrar no
labirinto de novo.”
-“O que?! Quando?” Perguntou Gordon assustado.
-“Esta noite.” Respondeu Tina.
CAPÍTULO 4
Gordon e Vanessa se arrumaram as pressas, pegaram seus
artefatos mágicos e foram com Tina ao encontro dos outros. Todos já se
encontravam no portão da cidade, aguardando pelos três.
-“Oi pessoal. Por que vocês querem entrar no labirinto hoje?
Ainda nem tive tempo de curtir o objeto que encontrei lá ontem.” Disse Gordon.
Adrian, que segurava seu novo cetro, disse: -“Tenho um bom
motivo para voltar lá. E estou ansioso demais para esperar mais tempo.”
Enquanto percorriam o caminho até a caverna, Lázaro foi
falar com Gordon e Vanessa:
-“Adrian acha que pode vencer o Perseguidor com seu novo
artefato.”
-“Nossa! Como ele pretende fazer isso?” Indagou Vanessa.
-“Bem, ele diz que seu cetro é capaz de emitir um forte raio
de luz. E como o Perseguidor é um ser formado de escuridão, ele acha que pode
dar certo.” Respondeu Lázaro.
-“Isso não é arriscado demais? Vocês já tentaram isso
antes?” Perguntou Gordon.
-“Já, mas nada funcionou até agora. Wanda tentou queimá-lo
uma vez, Erick tentou prendê-lo dentro de uma bolha de energia, Adrian tentou
paralisá-lo, e, pelo que sabemos, Jerônimo tentava confrontá-lo com um anel
mágico desintegrador quando foi pego.”
-“Adrian está louco! O que o faz pensar que dessa vez será
diferente?!” Disse Gordon.
Lázaro deu de ombros.
Assim que chegaram na caverna, todos vestiram seus trajes e
colocaram as máscaras, e então, Adrian começou a falar: -“Meus caros, se meu
plano der certo, e estou confiante que vai, hoje nos tornaremos os mestres do
labirinto! E nunca mais vamos precisar correr.”
Gabriel perguntou: -“Mas Adrian, e se não funcionar, e o
Perseguidor pegar você ou um de nós?”
Adrian respondeu: -“Nesse caso, vocês sabem o que fazer.
Assim como eu o fiz com Jerônimo.”
Todos ficaram em silêncio, apreensivos.
-“Formem o círculo.” Disse Adrian. E assim que todos
assumiram a formação, a entrada para o labirinto se abriu novamente, levando-os
para dentro.
Mais uma vez, todos, menos Gordon e Vanessa, tomaram
caminhos diferentes. Os dois seguiram escolhendo aleatoriamente quando deviam
virar ou seguir em frente, e depois de alguns minutos, encontraram um beco sem
saída. Ali, no chão, havia uma pena de pássaro.
-“Vá em frente.” Disse Gordon. Vanessa pegou a pena.
-“Acho que não tem problema de testarmos agora o que ela
faz.” Disse Vanessa. Então ela se concentrou no poder do objeto, e começou a
flutuar.
-“Gordon! Eu consigo voar!” Ela disse.
-“Isso é demais Vanessa! Tente subir mais para ter uma vista
completa do labirinto.” Gordon sugeriu.
Vanessa subiu e subiu, e tudo o que ela podia enxergar era o
labirinto, que não parecia ter um fim para nenhuma direção. Só que Vanessa
subiu demais, e acabou perdendo a referência de onde Gordon estava. Quando ela
começou a perder a concentração, acabou por descer em outro lugar.
Gordon esperou por um tempo, mas decidiu continuar andando, vindo
a encontrar uma flauta, mais tarde.
Daquela vez, Lázaro foi o primeiro a encontrar o
Perseguidor. Uma ondulação negra veio em sua direção, e ele começou a correr.
-“O Perseguidor! Adrian! O Perseguidor está aqui!”
Lázaro, por fim, encontrou um portal dourado e saiu do
labirinto. Em pouco tempo, todos já sabiam que o Perseguidor havia chegado.
Vanessa viu Gustav passar correndo a sua frente, e
instintivamente acionou o poder do seu colar, sendo envolvida pelo campo de
força. Logo atrás de Gustav, surgiu o Perseguidor, que se deteve por um instante
na frente de Vanessa, e então continuou por outro caminho.
Adrian ouvia os gritos de alerta dos outros, e preparava-se
para confrontar o ser das sombras com o seu cetro de luz. Quando a hora chegou,
lançou sobre o demônio um poderoso e brilhante raio de luz do seu cetro. O
Perseguidor desapareceu e Adrian pensou que o tinha vencido. Então, o ser
surgiu por outro lado, e Adrian se pôs a correr.
Camile estava tendo dificuldade de encontrar uma saída, e
por isso, acabou capturada.
Todos, menos Adrian e Camile já tinham retornado, e, assim,
aguardavam pelos dois. Adrian voltou primeiro, logo se identificando. Alguns
segundos mais tarde, Camile voltou; Seus olhos estavam completamente escuros e
vazios.
Todos olharam assustados para Camile, que saltou sobre
Adrian atacando-o com força descomunal. No chão, com Camile sobre si, Adrian
pegou seu cristal roxo na tentativa de paralisá-la. Mas não teve efeito contra
ela.
-“A magia não funciona contra o Perseguidor!” Gritou Wanda.
-“Ajam rápido!” murmurou Adrian, enquanto começava a ser
esganado.
Erick pegou a pesada espada do esqueleto e correu investindo
a ponta contra Camile, atravessando-a com ela.
Camile tombou de lado, tossindo sangue, até finalmente
morrer.
Erick deixou a espada cair, e sentou-se no chão levando as
mãos na cabeça.
-“Está tudo bem Erick. Você fez o que tinha de ser feito.”
Disse Adrian, ainda se recuperando.
-“Como assim, está tudo bem?! O que tinha de ser feito?!
Como pode dizer uma coisa dessas Adrian?!” Esbravejou Gordon.
Os outros choramingavam.
-“Gordon tem razão. E se houver uma cura? Um jeito de
expulsar o Perseguidor do corpo?” Disse Tina.
-“O plano não deu certo.” Disse Adrian. –“Não havia nada que
podíamos fazer por ela.”
Todos deram as mãos e rezaram, por Camile, e por si mesmos.
-“Vamos enterrá-la apropriadamente.” Disse Gabriel. E assim
o fizeram, enterrando Camila ali por perto, ao lado das covas de Jerônimo e
Alissa.
Depois, voltaram para suas casas.
-“Como pudemos fazer parte disso Gordon? Uma pessoa foi
assassinada bem na nossa frente!”
-“Vanessa, temos de pensar muito sobre o que faremos. Não
sabemos do que essa gente é capaz. Não quero nos colocar em perigo.”
Gordon descobriu que quando tocava sua flauta, era capaz de
controlar o vento.
O casal passou alguns dias sem sair de casa. Estavam em
choque, e tinham peso em suas consciências. Quando decidiram sair um pouco,
passaram pela praça, e viram o grupo reunido na fonte.
-“Vejam, é Gordon e Vanessa.” Disse Gabriel.
O casal se aproximou do grupo.
-“O que faremos a respeito do que aconteceu?” Perguntou
Gordon, quebrando o silêncio.
Adrian disse: -“O que quer dizer Gordon? Não podemos fazer
mais nada por Camile. Ela sabia dos riscos.”
-“Mas que escolha demos a ela?! Que escolha vocês dão uns
aos outros?! Estão todos obcecados pela magia do labirinto!” Disse Gordon.
Adrian tocou o indicador no peito de Gordon: -“Você não dirá
nada a ninguém está ouvindo?! Você jurou! Todos juramos manter segredo!”
-“Por Deus, Adrian, pessoas estão perdendo suas vidas!”
Disse Vanessa.
Dois carros de polícia pararam perto deles, e quatro
policiais desceram, indo falar com eles.
-“Olá policiais.” Disse Adrian, de maneira natural.
-“Viemos interrogá-los sobre o desaparecimento de Camile
Zarganov.” Disse um dos policiais.
CAPÍTULO 5
-“Já tem um tempo que não temos notícias dela.” Disse Adrian
aos policiais.
-“Por que está respondendo por todos, rapaz?” Perguntou um
policial.
-“Cara, todos nós gostávamos da Camile. Não sabemos dela.”
Disse Gustav.
-“Gostavam? O que aconteceu com ela?” Perguntou um policial.
-“Já dissemos que não sabemos. Ela não aparece já tem alguns
dias.” Disse Lázaro.
-“Essa garota não a primeira que desaparece depois de
começar a andar com vocês. Seja o que for que fizeram com ela e com os outros,
dessa vez não ficarão impunes, eu lhes prometo.” Disse um policial.
-“A Camile deve ter saído da cidade. Ela detestava esse
lugar.” Disse Adrian.
-“Estamos de olho em vocês.” Disseram os policias, e,
depois, entraram em suas viaturas e foram embora.
-“O que faremos agora?” Perguntou Wanda.
-“Não faremos nada, por enquanto. Cedo ou tarde eles se
cansarão de procurar por Camile.” Disse Adrian.
-“Também não somos mais em dez. Não podemos voltar no
labirinto.” Disse Gustav.
-“Melhor aqui fora, onde nossa magia tem algum valor. Nada
nosso funciona contra o Perseguidor.” Disse Lázaro.
-“Quando vi o Perseguidor, usei o meu colar e ele foi
embora.” Disse Vanessa.
-“Vanessa!” Disse Gordon.
-“Bem, não tenho certeza. Talvez ele não tenha me visto.”
Disse Vanessa.
-“O Perseguidor não precisa enxergar. Ele sabe quando
estamos lá.” Disse Gabriel.
Adrian se aproximou de Vanessa, e perguntou: -“Você precisa
ter certeza! Mostre-me esse colar.”
Vanessa tirou-o para fora da camiseta. Adrian ficou
olhando-o em silêncio.
-“Então, quer dizer que ele te protegeu do Perseguidor,
Vanessa?” Perguntou Erick.
-“Eu.. acho que sim.. mas, mesmo que tenha me protegido, eu
não poderia me concentrar para sempre no poder dele, e logo ficaria vulnerável
novamente.”
Pouco mais tarde, o grupo se dispersou.
-“Vanessa, foi arriscado dizer para eles sobre o seu colar.
E se o Adrian quiser tomá-lo de você? Ele é capaz de qualquer coisa para vencer
o Perseguidor. E você nem tem certeza se o colar realmente te protegeu lá
dentro.” Disse Gordon.
-“Eu sei Gordon. Me desculpe.” Disse Vanessa.
Mais alguns dias se passaram, até que, durante uma tarde,
Tina bateu na porta de Gordon e Vanessa.
-“Oi Gordon, oi Vanessa. Vocês tão legais? Adrian tá
chamando o grupo para uma reunião.”
-“Oi Tina. Não sei se devemos ir. Estamos cansados de fazer
as vontades do Adrian.” Disse Gordon.
-“Gordon, talvez seja bom a gente ir, ver o que ele tem pra
dizer.” Disse Vanessa.
Os dois seguiram Tina até a fonte da praça, onde estavam os
outros. Lá, Adrian estava ao lado de uma garota nova.
-“Pessoal, esta é Mary. Ela quer fazer parte do nosso
grupo.”
-“Como é? Ela por acaso sabe no que está se metendo,
Adrian?” Perguntou Gordon.
-“Ela sabe muito bem Gordon. Mary está ansiosa para
conseguir seus próprios poderes mágicos.” Disse Adrian.
Todos se apresentaram para Mary.
-“Isso é muito legal. Quando a gente vai para esse lugar
secreto?” Perguntou Mary.
-“Hoje a noite.” Respondeu Adrian.
-“Eu achei que isso tinha terminado, Adrian.” Disse Vanessa.
-“Como poderíamos ignorar a existência do labirinto,
Vanessa? O mundo todo está ao nosso alcance. Ninguém pode imaginar o poder que
está em nossas mãos! É a nossa responsabilidade! Nós, somos os escolhidos!”
Disse Adrian.
-“Você é louco Adrian! É você que nós devíamos ter
enterrado!” Disse Gordon.
Adrian esmurrou o rosto de Gordon, que caiu no chão com a
boca sangrando.
-“Parem!” Disse Vanessa.
-“Não me faça machucá-lo, Gordon.” Disse Adrian. –“Assim que
o Sol se pôr, nos encontraremos no portão da cidade. Vanessa, não se esqueça de
levar o seu colar mágico.” Continuou.
-“Mas Adrian, a polícia está no nosso encalço. Eles vão nos
seguir.” Disse Erick.
-“Não se preocupe Erick. Eu tenho um plano.” Disse Adrian.
Quando chegou a hora, Gordon e Vanessa saíram de casa, e
encontraram uma multidão agitada na cidade. Gordon perguntou a uma pessoa o que
estava acontecendo.
-“Um grande incêndio! A delegacia da cidade está em chamas!”
Disse a pessoa.
CAPÍTULO 6
Tina e Gustav apareceram.
-“Hora de partirmos.” Disse Gustav para Gordon e Vanessa.
-“Foi o Adrian que começou o incêndio não foi?” Perguntou
Gordon para Tina.
-“Não sei. Talvez tenha sido esse o plano dele.” Tina
respondeu.
-“Desgraçado!” Exclamou Gordon.
Os quatro foram ao encontro dos outros no portão da cidade,
e, dali, seguiram até a caverna na montanha. O ritual seguiu como antes, e os
dez entraram no labirinto.
Depois de algum tempo, Gabriel encontrou com Erick por
acaso, e ambos viram no fim de um corredor, um cachorro negro.
-“Eu não sabia que existiam animais por aqui.” Disse
Gabriel.
-“Não existem.” Disse Erick.
O cachorro se sentou e ficou encarando os dois.
-“Só pode ser o Perseguidor.” Disse Erick.
O cachorro começou a se aproximar andando, até que passou a
correr na direção deles, mudando de forma e crescendo de tamanho. Erick e
Gabriel saíram correndo, gritando para alertar a todos sobre a presença do
Perseguidor.
Gordon e Vanessa souberam o que estava acontecendo, e
correram para procurar o portal dourado e sair do labirinto, quando, Adrian
surgiu de um corredor e segurou o braço de Vanessa.
-“Dê-me o seu colar Vanessa! Eu preciso dele!” Disse Adrian.
-“Adrian! Você não pode tomar o colar dela! Foi ela que o
encontrou!” Disse Gordon.
-“Eu o devolverei depois.” Disse Adrian.
Os três viram a sombra começar a preencher o corredor.
Vanessa tirou o colar e o entregou para Adrian. Depois, o casal saiu correndo
até encontrar a saída. Adrian colocou o colar de Vanessa e usou o seu poder,
sendo envolvido pelo campo de força mágico. O Perseguidor deteve-se na frente
de Adrian, que pôde testemunhar horrorizado a totalidade de sua forma
demoníaca, bem de perto. Então, Adrian aproveitou sua proteção para abrir
caminho e continuar pelo labirinto.
Fora do labirinto já estavam os nove, que aguardavam o
retorno de Adrian. Cerca de meia hora se passou, enquanto esperavam.
-“Eu me pergunto, o que será que Adrian pretende?” Disse
Gordon ao grupo.
-“Todos já temos muitos objetos mágicos. O que é que ele realmente
procura no labirinto?” Continuou Gordon.
O baú estava aberto, e Gordon olhou dentro dele, viu o pergaminho
com o manuscrito, e o abriu. Em um determinado trecho, estava gravada a imagem
de uma estatueta.
Vanessa se aproximou para olhar também. –“Será que é isso
que o Adrian está procurando?” Ela perguntou.
-“Sim.” Disse Lázaro. –“Adrian procura a estatueta de
Mitrican. O pergaminho diz que é um objeto de poder ilimitado, capaz de
modificar a realidade à vontade do seu portador. Com ela pode-se controlar a
vida, a morte, e até mesmo o curso do tempo.”
Então, Adrian surgiu vindo do labirinto. Todos ficaram
imóveis, com receio do que podia ter acontecido.
-“O medalhão funciona. Ele pode proteger contra o
Perseguidor.” Disse Adrian.
Todos se acalmaram um pouco ao perceberem que Adrian não
estava possuído.
-“Então, você pode devolvê-lo para mim?” Perguntou Vanessa à
Adrian.
-“Eu o devolverei Vanessa. Mas ainda não posso fazer isso.”
Respondeu Adrian.
-“É claro. Você ainda não encontrou isto aqui, não é
Adrian?” Disse Gordon mostrando a imagem no pergaminho.
Adrian ergueu um cristal que disparou um raio em Gordon, o
derrubando no chão.
-“Gordon! O que você está fazendo Adrian?!” Disse Vanessa.
Adrian caminhou até Gordon e pegou o pergaminho.
-“Um novato não pode sair pegando o que quiser por aqui.”
Disse Adrian, guardando o pergaminho no baú.
Todos retornaram para as suas casas.
-“Gordon, você está bem?” Perguntou Vanessa.
-“Sim. Só um pouco atordoado ainda.” Respondeu Gordon.
-“Estive pensando... e se o Adrian encontrar essa tal
estatueta que ele procura? O que vai acontecer?” Disse Vanessa.
-“Se algo assim cair nas mãos de alguém como o Adrian, será
o fim. Ele com certeza reescreveria a história se transformando em um deus.”
Disse Gordon.
-Também acho isso. Seria terrível!” Concluiu Vanessa.
-“Gordon, devemos fugir! Sair da cidade e ir para bem
longe!” Disse Vanessa.
-“Não Vanessa. Se fizermos isso, o Adrian vai encontrar mais
duas pessoas dispostas a entrar no labirinto. E quem sabe o que tentará fazer
conosco. Devemos tentar impedi-lo.” Disse Gordon.
CAPÍTULO 7
Na tarde do dia seguinte, Gordon e Vanessa foram até a praça
para encontrar o grupo.
-“E aí Mary, achou alguma coisa legal?” Perguntou Wanda.
-“Achei! Consegui esse chapéu.” Disse Mary mostrando um
chapéu e colocando-o na cabeça. Assim que ela o colocou sobre a cabeça,
desapareceu da vista.
-“É o máximo não é?!” Agora posso ficar invisível!” Disse
Mary.
Todos ficaram impressionados.
As pessoas da cidade ainda estavam muito chocadas com o
grande incêndio do dia anterior, e só se falava disso. Enquanto isso, Adrian e
seu grupo já planejavam outra incursão ao labirinto para aquela noite.
-“Foi bem estranho aquele incêndio de ontem.” Disse Vanessa.
-“Pois é.” Disse Gustav.
-“Veio a calhar bem. Assim ninguém veio seguir a gente,
principalmente a polícia.” Disse Erick.
-“Aposto que muita gente está sofrendo por causa disso.”
Disse Gordon encarando Adrian.
-“Vamos seguir com o combinado, e voltar ao labirinto hoje a
noite.” Disse Adrian.
-“Sim Adrian, mas Gustav e Lázaro já voltaram aos seus
trabalhos e só podem vir mais tarde.” Disse Gabriel
-“Não tem problema. Partiremos mais tarde então.” Disse Adrian.
Era tarde da noite, quando todos estavam prontos, e saindo
da cidade em direção a caverna do labirinto.
Mais uma vez, os dez entraram no labirinto.
Enquanto procurava por objetos mágicos, Erick foi
surpreendido pelo Perseguidor, e assim, foi capturado. Possuído, Erick
continuou a andar pelo labirinto, até que encontrou Gustav.
-“Ah, é você Erick! Já encontrou alguma coisa?” Disse
Gustav.
Erick, que estava sendo controlado pelo Perseguidor,
conseguiu chegar perto de Gustav sem levantar suspeitas, e então o atacou, o
esganando até a morte.
-“O lugar está cada vez mais escuro Gordon.” Disse Vanessa.
-“Sim, algo não está certo. Vamos dar o fora daqui.” Disse
Gordon.
Adrian andava rápido em busca da estatueta mágica de
Mitrican, com o colar de Vanessa em seu pescoço, até que avistou Erick. Sem dar
muita importância, Adrian continuou seguindo pelo labirinto. Erick foi atrás
dele, ainda possuído pelo Perseguidor. Adrian ouviu os passos de Erick, e
virou-se para olhar quando os dois já estavam bem próximos. Por precaução,
Adrian ativou seu colar protetor, e Erick foi repelido para trás dando um
grunhido feral.
Adrian, pegou uma varinha que guardava consigo, e usou-a,
lançando uma rajada de energia mágica que decepou a cabeça de Erick. Assim que
fez isso, o Perseguidor surgiu por de dentro do corpo morto. Adrian,
concentrado no poder do colar que o protegia, continuou procurando a estatueta
mágica. O Perseguidor deixou de ir atrás dele, indo atrás dos outros que ainda
estavam vivos e dentro do labirinto.
Até que, enfim, Adrian encontrou o lugar que ele procurava. Era
um espaço diferente, decorado com inúmeras inscrições douradas, e com um altar
no centro. Em cima do altar, estava a estatueta representada no pergaminho.
Adrian o pegou, e se dirigiu à saída.
Fora do labirinto, já estavam os outros sobreviventes. O Sol
já estava nascendo e o céu clareava.
Assim que Adrian surgiu de dentro do labirinto, houve um
terremoto que fez cair pedras do teto. Uma grande pedra atingiu Wanda, que caiu
morta.
Adrian não parecia se importar, e se sentia triunfante.
-“Eu encontrei! Agora sou o ser mais poderoso do universo!”
Disse Adrian.
Nesse momento, vários policiais apareceram na entrada da
caverna.
-“Mãos ao alto! Todos vocês!” Disseram os policiais.
Adrian ativou seu colar protetor e ergueu a varinha contra
os policiais, atingindo-os com suas rajadas mortais. Tiros começaram a ser
disparados.
-“Abaixe-se Vanessa!” Gordon saltou sobre Vanessa, e ambos
ficaram deitados para se protegerem.
Gabriel foi baleado, e agonizava.
Adrian caminhou até a saída da caverna, enquanto as balas
ricocheteavam em seu campo de força.
-“Temos de fazer alguma coisa!” Disse Gordon para Vanessa.
Adrian lançava sua magia contra os policiais, que eram
mortos, enquanto ele ria.
Gordon pegou o dardo mágico do Gabriel e o lançou contra
Adrian. O dardo se multiplicou em muitos dardos que explodiram no campo de
força.
-“Adrian! Pare!” Gritou Gordon.
Adrian não se feriu, mas perdeu a concentração em seu
escudo, se virando para olhar. Quando Adrian levantava sua varinha para mirar
contra Gordon, recebeu diversos disparos de bala em suas costas. Então, Adrian
caiu no chão, sangrando, mortalmente ferido.
-“Acabou.” Disse Gordon.
Adrian usou suas últimas forças para concentrar o poder da
estatueta de Mitrican. A estatueta começou a brilhar, e seus ferimentos se
curaram. Adrian mudou de forma, transformando-se em um enorme monstro.
-“Agora eu sou invencível! Tremam todos!” Disse Adrian,
voltando sua atenção aos guardas.
Vanessa viu o manto que cobria o esqueleto gigante cair. O
esqueleto havia se levantado. O esqueleto pegou sua espada, que agora parecia
mágica, e começou a caminhar em direção à Adrian.
Vanessa foi até Gordon, e mostrou o que estava acontecendo.
O casal afastou-se, apenas observando em silêncio.
O esqueleto gigante cravou sua espada em Adrian pelas
costas, atravessando-o. Adrian urrou, e deixou a estatueta de Mitrican cair de
suas garras, voltando a sua forma original. O esqueleto puxou sua espada, e
Adrian caiu morto. Depois, o esqueleto voltou para dentro da caverna e
sentou-se novamente em seu trono.
-“Gordon! A estatueta!” Disse Vanessa, apontando para a
estatueta caída no chão.
Gordon espiou para fora e não viu nenhum policial, então
pegou a estatueta de Mitrican.
-“Não use o poder dela Gordon!” Disse Vanessa.
-“Eu sei. Mas precisamos mantê-la em segurança.” Disse
Gordon.
Gabriel estava morto.
-“Vamos, Mary, Tina, Lázaro! Logo a polícia vai voltar com
reforços.” Disse Gordon.
-“Espere!” Disse Lázaro, quando todos saíram de dentro da caverna.
–“Temos de esconder a entrada dessa caverna para evitar que todos esses itens
caia nas mãos deles.”
O grupo resolveu deixar todos os seus objetos mágicos dentro
da caverna, antes de fechá-la.
Então, Lázaro se concentrou em um bracelete mágico, e
tornou-se super forte. Depois, começou a carregar pedras enormes com as mãos,
colocando-as na entrada da caverna para ocultar a sua existência. O bracelete
de força foi o único objeto que ficou fora da caverna, e então, eles o
enterraram.
Logo, os cinco voltaram para a cidade, e, assim que chegaram,
foram todos presos.
CAPÍTULO 8
Todos eles passaram muitos anos presos.
Assim que ficaram livres novamente, decidiram voltar mais
uma vez para o labirinto. Queriam levar a estatueta de Mitrican de volta para
dentro dele.
Em pouco tempo, conseguiram mais cinco pessoas dispostas a
entrar no labirinto com eles. Usaram o bracelete de força para abrir passagem
para dentro da caverna. Encontraram lá dentro os esqueletos dos antigos membros
que haviam morrido lá.
Os novos dez fizeram o mesmo ritual. Colocaram as roupas e
usaram as máscaras. Assim que formaram o círculo, foram levados novamente para
dentro do labirinto. Lá, Gordon deixou a estatueta de Mitrican, esperando que
não fosse mais encontrada.
Porém, a mente é sempre tentada pelo poder da magia, e nem
todos os dez estavam decididos a nunca mais voltar.
FIM
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A SAGA DE FERGUSSON
CAPÍTULO 1
Mar Mediterrâneo, 211 a.C., entre a Ilha de Creta e Alexandria. Uma embarcação ateniense carregada com prata, e especiarias orientais fazia o seu caminho de volta para a Grécia, escoltada por dois barcos de guerra.
Dias atrás, uma esquadra independente, adepta de pirataria, em quantidade e poder de ataque respeitáveis, estava escondida em um complexo de cavernas abertas ao mar, situadas em pequenas ilhotas próximas dali. Sabendo sobre a provável rota de seu próximo alvo, os piratas contavam com cinco barcos bem armados e com muitos guerreiros experimentados no combate e no saque. Sua tripulação consistia em grande parte de mestiços, mouros, criminosos, e homens renegados em suas terras. Entretanto, o homem que estava os liderando era o Capitão Gamênidas, um grego nascido em Tebas, que antes de se tornar um pirata, assumia um cargo militar importante em Atenas. Com a ordem do capitão, os piratas lançaram-se ao mar para interceptar os barcos atenienses que voltavam das terras do leste.
Os barcos de Gamênidas içaram velas e bandeirolas gregas. Assim, os gregos os identificaram como amigos, aos avistarem surgindo no horizonte. E, quando perceberam a formação típica de combate dos barcos que se aproximavam, já era tarde para escapar de um confronto sangrento. O tempo fechou de maneira não habitual, com nuvens multicoloridas, verde, roxas, azuis, e relâmpagos começaram a cortar o céu. Um sinal de bom agouro para uns, e de mau agouro para outros. As flechas, algumas incendiárias, já voavam vindas de ambos os lados, fazendo vítimas e cravando nos barcos, quando os gregos foram cercados, e os piratas ajeitaram suas pontes de madeira reforçada até os barcos que pretendiam assaltar. Os lanceiros invadiram na frente, seguidos pelos espadachins. Em considerável vantagem numérica, os piratas de Gamênidas levavam a melhor, mesmo que dois dos seus barcos tivessem sido criticamente danificados por causa de enormes rochas pontudas que os gregos lançaram com mecanismos de catapulta.
Como toda e qualquer batalha, ocorriam pelos dois lados, demonstrações de bravura e também de covardia. Um homem em específico, deve ter contudo destaque em minha narrativa: Fergusson, um pirata novo na tripulação de Gamênidas, um jovem de vinte e um anos. Esta era a sua segunda batalha desde que se juntou aos homens de Gamênidas.
Ao entrar no barco grego, uma flecha rasgou seu ombro esquerdo de raspão e depois atingiu um companheiro no pescoço, fazendo-o se afogar no próprio sangue. Fergusson agachou-se para tirar sua cabeça da mira de quem havia atirado aquela flecha. Viu um grego que tremia com um facão em punho, aproximou-se o mais sorrateiramente que pôde e desferiu um golpe de estocada com sua espada na região da costela desse homem. Atingido, o grego emitiu um som gutural e caiu para trás, e em poucos segundos passou a babar sangue. Fergusson não era uma pessoa que apreciava matar, não era alguém sem escrúpulos, porém ali estava e devia fazer o que estava fazendo. Era sua única opção. Lembrou-se dos conselhos do seu tio-avô, que dizia, “em uma guerra, acabe com pelo menos dois filhos da mãe. Porque então, mesmo que você caia em combate em seguida, terá contado positivamente para o seu lado.” Buscou outra vítima em potencial com os olhos, e golpeou um homem forte pelas costas, provavelmente alguém que gozava de status elevado, a julgar por sua armadura e elmo de boa qualidade. A espada de Fergusson golpeou a cabeça do homem, derrubando o seu elmo e fazendo-o cair atordoado. Em seguida, trespassou o rosto do homem caído com a ponta de sua espada.
Amedrontados, alguns gregos saltavam ao mar em uma tentativa desesperada de sobreviver, na esperança de que a corrente marítima os levasse até a terra firme.
Entre os brados ferozes dos golpes que ainda eram desferidos, gritos de vitória, e gemidos lastimáveis, um pirata apontou para o céu, e exclamou: - “A serpente de fogo!”, ao ver que estava se formando uma linha flamejante no céu. Em questão de segundos, houve um grande estrondo, e alguém gritou – “Ataque dos deuses!”. Em seguida a linha flamejante veio diretamente na direção daquela batalha colidindo com o mar. O impacto foi devastador para todos ali presentes, esmagando-os e a seus barcos com uma onda de choque. Os barcos foram revirados com uma sequência de ondas gigantes que se formaram logo após o impacto.
Um silêncio tenebroso tomou conta do lugar. Uma névoa branca pairava sobre o mar que aos poucos se assentava novamente. Fergusson, ao contrário da maioria de todos os que estavam presentes naquele local, ainda estava vivo. Segurava-se em um pedaço de madeira flutuante, e vomitava água pela boca e nariz. Neste momento de confusão mental, recordou-se de sua infância e adolescência. Nascido em Creta, é filho de um homem do deserto do leste e de uma mãe cretense. Sempre fora alvo de preconceitos por todos devido a sua miscigenação, e com seus dezessete anos acabou nas mãos de um amigo da família após a morte de sua mãe que não resistiu a uma febre intensa. A Fergusson, foram dadas duas opções, ser escravo de luxo para algum senhor da nobreza, ou juntar-se à pirataria. Obviamente, o homem que ficara responsável por ele receberia uma boa quantia de dinheiro em ambos os casos. Fergusson acreditou que seria mais fácil escapar de um navio do que das correntes da escravidão em alguma fortaleza. Gamênidas é um capitão rígido e austero, mas não maltrata sua tripulação gratuitamente, pois sabe que precisa do respeito de todos a seu comando. Mas qualquer desertor é perseguido e condenado a morte. Pensou que sua mãe choraria de felicidade se pudesse vê-lo ainda vivo depois de tantas situações mortais como aquelas. Tudo o que ele sempre quis foi encontrar um lugar de felicidade e liberdade, onde todos pudessem conviver sem medo. Uma vibração em seu corpo o trouxe de volta dos sonhos. Viu que o que quer que tenha caído no mar estava agora emergindo à superfície. Era uma espécie de rocha cristalina, mesmo parcialmente submersa alcançava cerca de trinta metros de altura, e também continha algo igualmente grande, e negro em seu interior. O objeto cristalino vibrava em uma frequência que gerava um som grave e que reverberava em tudo. Havia uma criatura no interior daquele cristal fumegante. Fergusson conseguiu identificar um grande olho aberto que se revirava e emitia um calor que ardia a pele quando o olhava. Fergusson soltou-se do pedaço de madeira em que estava segurado e nadou até outras tábuas flutuantes que sustentavam um lança, tomando-a para si. O cristal começou a evaporar, liberando uma fumaça branca e espessa que subiu ao céu. Alguém gritou aterrorizado – “É um monstro!” E mais alguém disse: - “Ataquem a fera!” e lançou uma lança que encravou na criatura. A criatura ergueu-se e estendeu duas grandes asas cheias de espinhos que cobriram a luz do Sol. Alguns homens que estavam posicionando-se para ataca-la, imediatamente se incendiaram emitindo um grito curto em uníssono. Outra pessoa bem próxima de Fergusson disse: - “É um dragão. Criaturas malditas que levam a danação e a morte para onde quer que vão.” O dragão emitiu um rugido ao alto que ensurdeceu Fergusson. E em seguida tomou a direção de encontro de Fergusson, e começou a se aproximar nadando na água. Tudo o que Fergusson pensou foi – “Eu sou muito azarado.” E tentou nadar para fora da rota do dragão.
Foi empurrado com o fluxo de água causado pelo deslocamento do ser imenso. O dragão parou então de se locomover, e fitando Fergusson diretamente com seus grandes olhos, disse no idioma grego: -“Por que você não queima?” Fergusson emitiu um grito de coragem e terror misturados, enquanto bradava sua lança. O dragão arrastou Fergusson com sua grande asa e alçou vôo. Quando se deu conta de que deveria estar muito alto e não podia enxergar nem ouvir nada, Fergusson segurou-se o melhor que pôde em um espinho na asa do dragão. Durante aquela jornada teve um pressentimento de que nunca mais seria o mesmo. Por um momento, durante o percurso avistou figuras voando logo atrás do dragão. Poderiam ser bruxas ou outros demônios pensou.
Durante a noite o dragão chegou nas regiões montanhosas do Oriente, pousando. Fergusson soltou-se da asa do dragão e afastou-se depressa parando para observá-lo a alguns metros de distância. Fergusson gritou: - “Você é um demônio!”
O dragão permaneceu quieto e imóvel, até que tremeu e grunhiu por um instante. Fergusson pensou “Ele está ferido.” Então o dragão falou: - “Eu sou Hageron, o dragão do ódio.”
Fergusson disse: - “E por que você está aqui?”
O dragão respondeu: - “Fui ferido por um guardião dos céus. E alguém nesta terra abriu um portal onde eu entrei para me recuperar.”
Fergusson disse: - “E suponhamos que eu tenha aberto esse portal...”
O dragão disse: - “Foi você que abriu o portal? Por que fez isso?”
Fergusson disse: - “Na verdade não fui eu não.”
O dragão disse: - “As lanças daqueles homens lá atrás não me feriram. Mas eu pude sentir que o ódio deles me fortalecia. Você também tem ódio, mas não é igual aqueles homens. Você anseia por liberdade. O seu ódio e o meu são muito parecidos.”
Fergusson disse: - “Estou indo embora.”
O dragão disse: -"Eu sou o ódio e a vingança! Você tem sorte de estar vivo humano. E além do mais, agora carrega com você um pouco do meu poder. A minha simples presença pode alterar a realidade de vocês, e o fato de ter sobrevivido à mágica que usei para acabar com a vida dos outros que estavam contigo deixou-me curioso a seu respeito. E é por isso que te deixarei vivo dessa vez."
CAPÍTULO 2
Quando Fergusson acordou, o dragão já havia partido. Sentia-se diferente. Com muito mais energia do que o habitual. Saltou e surpreendeu-se com a altura que alcançou. Sentiu aumento em sua força e velocidade na realização de qualquer ação. Também seus sentidos estavam mais aguçados, e seu raciocínio veloz. Não estava mais armado com a lança, pois a havia perdido durante o voo. Pôs-se a caminhar. Não muito adiante, avistou um pequeno vilarejo cujas chaminés das casas fumegavam. Sentiu cheiro de ervas e carne queimada. Alguns homens avistaram Fergusson, apontando-o para outros. No local as pessoas eram todas camponesas e trabalhadoras rurais. Olhavam-no com desconfiança. Usava roupas muito diferentes, e sua aparência era estranha a todos. Passou o dia todo naquele local, pensando o que faria em seguida. Não sabia onde estava. Aquelas pessoas não lhe incomodavam e dois senhores até mesmo lhe ofereceram água e bolinhos. Mas não conseguia se comunicar com eles. Até mesmo os gestos que fazia pareciam ser mal interpretados. Ficou a pensar sozinho até o cair da noite, e então notou que podia ver muito melhor no escuro do que antes conseguia. Achou que seria um bom momento para explorar o lugar. Assim que saiu do local das habitações, percebeu que haviam pequenas criaturas verdes e azuis, com não mais do que cinquenta centímetros de altura, correndo rápido entre as folhagens do chão. Elas faziam um som, como se conversassem entre si, com uma voz aguda, quase um zumbido. Talvez, além das novas capacidades físicas, também estivesse percebendo coisas que antes não percebia, pensou. Viu que havia uma estrada que dava acesso ao local, e ela seguia para dentro de um caminho montanhoso. Decidiu esperar até o amanhecer para partir. Talvez as pessoas daquele lugar se sentissem ofendidas se partisse sem ser visto no meio da noite. Voltou para a vila, deitou-se sobre um amontoado de folhas. Decidira que pegaria aquela estrada e desceria as montanhas sempre que possível, até ter acesso ao mar. O que faria daí em diante ainda não sabia. Fechou os olhos, até que dormiu.
Acordou com um chacoalhão. Ainda era bem cedo a julgar pela pouca claridade do dia. Três homens estavam de pé a sua volta. Não eram camponeses, vestiam armaduras como guerreiros. Um deles abriu um pergaminho mostrando-lhe o conteúdo em escrita que não pode compreender. Em seguida dirigiu-se a ele em um idioma que não pôde entender. Os homens se curvaram para ajudá-lo a se levantar, mas antes que tocassem nele, já estava de pé. Os homens disseram palavras incompreensíveis por alguns minutos, e então ficaram irritados com o seu silêncio, alterando o tom de suas vozes como se impacientes. O povoado assistia a cena timidamente, até que um outro homem, que pelas roupas devia pertencer ao povoado, se aproximou de Fergusson, e tentou conversar com ele em pelo menos três diferentes idiomas. Embora, todas as tentativas de comunicação se mostraram inúteis. Um dos guerreiros começou a passar uma corda ao redor dos pulsos de Fergusson no intuito de amarrar suas mãos. Ao perceber que seria amarrado, e possivelmente preso, uma fúria incontrolável tomou conta da mente e do corpo de Fergusson. Em um piscar de olhos, Fergusson livrou suas mãos antes de que fosse preso, e tomou a corda, enrolando-a no pescoço do mesmo homem que tentara o amarrar. O fez com tamanha violência que o pescoço do homem se partiu e ele caiu no chão mortalmente ferido. Os outros dois guerreiros saltaram para trás com o susto e se armaram com facões grandes. Ao constatar o que acabara de fazer, Fergusson não entendeu o que o levou a agir tão impensadamente. Estava desarmado, então seria melhor não resistir mais e se entregar. Ficou de joelhos e levantou as mãos em rendição. Ouve grande alvoroço por parte de todos os presentes, e Fergusson se viu cercado pela multidão, que o amarrou da cabeça aos pés. Fergusson levou muitas pancadas, até que foi colocado dentro de uma carroça e partiu sem saber para onde ia. Amarrado dentro de uma tenda na carroça, sentiu que uma carga extra de energia estava novamente preenchendo seu corpo, e que poderia facilmente se soltar. Mas estava no controle, e preferiu conter esse impulso dessa vez, teve medo. Subitamente viu aparecer uma pequenina mulher nua e com asas, do tamanho de uma borboleta. Ela voou graciosamente ao seu redor e sobre ele, por alguns minutos, sorrindo, até que desapareceu, de repente, da mesma maneira como havia surgido. Uma fada! Fergusson sorriu.
O Sol já brilhava forte, bem no alto do céu, quando a carroça parou. Mesmo sem ver, sabia que estava em algum lugar cheio de pessoas, pois ouvia muitas conversas, sons de animais e de ferramentas. Alguém desamarrou seus pés, e, logo, um homem musculoso sem camisa apareceu, disse alguma coisa para ele, e ajudou-o a sair da carroça. Estava em uma mina, onde muitos estavam trabalhando. Eram prisioneiros, como ele. Porém, foi colocado junto em uma fila de outros homens que também estavam amarrados. Um senhor de vestes coloridas e finas, andava na frente deles os observando, e as vezes falava com o homem forte, como se fizesse observações sobre um ou outro prisioneiro. Quando o senhor se deteve a frente de Fergusson, o homem sem camisa cuspiu no chão e disse algumas palavras com uma expressão de raiva no rosto. Então o senhor, pareceu perder o interesse sobre ele. Quando um homem mais jovem se aproximou segurando uma porção de moedas nas mãos, e rindo, ouve uma rápida conversa entre as pessoas ali, e então desamarraram Fergusson e fizeram um sinal para que ele fosse embora. Começaram a empurrá-lo para que ele se afastasse, enquanto o rapaz que havia se pronunciado estava preparando uma flecha em seu arco. Fergusson começou a correr, enquanto todos riam e conversavam animados. Quando já tinha se distanciado cerca de vinte passadas, algo fez com que parasse de correr e se virasse. Viu uma flecha voando em sua direção e com um movimento extraordinariamente veloz, agarrou a flecha com sua mão direita antes que ela atingisse seu peito.
Todos que observavam a cena ficaram pasmos, e ouve alguns instantes de silêncio. Até que alguns dos presentes começaram a ovacionar Fergusson. O rapaz que disparou contra ele, preparou outra flecha, mas dessa vez estava nervoso e suas mãos tremiam. Quando a segunda flecha voou, Fergusson desviou-se dela e lançou de volta a primeira flecha que estava segurando contra o rapaz, atingindo seu braço esquerdo. A força com que Fergusson lançou a flecha fez com que todos se impressionassem. Dez guerreiros armados cercaram Fergusson, se aproximando com cautela. De repente, alguém falou no idioma que Fergusson consegue entender. – “Você é grego, não é rapaz?” Fergusson respondeu: -“Sim. E só o que quero é que me deixem em paz!” Uma sombra negra começou a dar volta no corpo de Fergusson e então essa sombra avançou naqueles homens um a um derrubando-os e golpeando-os. Apavorados, os guerreiros fugiram. Nesse momento, Fergusson viu a cabeça do dragão Hageron aparecer no horizonte, como uma miragem. O demônio disse: -“Venha Fergusson. Tenho algo para você.”
CAPÍTULO 3
Parou um instante para contemplar o impacto que havia causado no lugar. Todos corriam ou se escondiam. Um homem ruivo passou por Fergusson, sorrindo, e dizendo em grego, mas com má pronuncia: - “Obrigado senhor. Nos vemos por aí.” E desceu um caminho através das rochas apressadamente. Fergusson ainda via a cabeça do dragão no horizonte pedindo que a seguisse. Com certeza a criatura era a responsável pelos poderes que estavam se manifestando nele, pensou, pois nunca na vida tinha desenvolvido dons paranormais ou sequer se interessado por magia. –“Tudo bem dragão. Estou indo onde pede que eu vá. Só peço que depois disso me liberte do seu feitiço.” O dragão respondeu: - “Você não gosta do poder que está experimentando? Não sabe que isso não é nada perto do que pode vir a conseguir.” Fergusson começou a caminhar. – “Verei o que tem para mim.”
O caminho à frente era uma descida difícil e tortuosa. Pensou que devia ter tomado para si o calçado de algum daqueles guardas, pois sua bota estava rasgada e desgastada. Sobre o corpo só tinha uma túnica que cobria a cintura e parcialmente seu peito e costas. Com todos os poderes que estava experimentando, esqueceu-se de se apossar de alguma arma quando estava deixando a mina. Um vento frio anunciava o cair da noite, e um tremor muscular súbito fez com que despencasse a altura de dois homens até que começasse a rolar montanha abaixo e despencasse mais uma vez uma altura ainda maior, caindo sobre um monte de galhos e folhas, que amorteceram o impacto. Mas já havia fraturado o tornozelo direito e também o seu braço direito. Também bateu a cabeça, e sentia dores nas costelas e nas costas. A dor que sentia não pareceu tão importante para ele no momento, era como se na verdade quase não se incomodasse com ela. Precisou de alguns minutos até que a tontura passasse e pudesse fixar os olhos. Estava claramente em um ninho de pássaro. Tinham ovos ao redor e também pedaços de ossos. Só depois notou aves voando e planando próximas dali. E deviam ser enormes. – “Dragão...” balbuciou. –“Dragão... você não me quer vivo? Então me tire daqui com a sua magia.” Um pássaro começou a se aproximar diretamente para Fergusson. Era uma grande águia. Fergusson teve a ideia de pegar um ovo e proteger-se com ele. A águia desviou. Então segurou um pedaço de osso pontudo e esperou que a águia investisse contra ele novamente. E não demorou. O pássaro subiu mais alto e mergulhou sobre Fergusson encravando suas garras em seu braço direito, que já se encontrava fraturado, aproveitando a chance, Fergusson enfiou o osso dentro do corpo da ave, fazendo com que ela perdesse as forças e despencasse montanha abaixo. Seu ombro também estava deslocado agora. Abriu um ovo e o tomou. Em seguida, desmaiou.
Acordou durante a noite com o ânimo renovado. Parece que a magia do dragão não o abandonara afinal. Incrivelmente, seus ossos haviam se recuperado. Segurando e apoiando nas pedras, foi encontrando a melhor maneira de descer, até que avistou uma extensa planície à frente. Caminhou sem ter muita certeza para onde deveria ir. Então, viu uma formação incomum de grandes rochas, dispostas em um padrão estranho na planície. Foi até lá. As pedras tinham desenhos gravados nelas em cor vermelha, e poderiam ter sido tingidas com sangue. Em pouco tempo viu surgir por detrás de uma rocha o dragão Hageron. Uma visão imponente e assustadora.
O demônio disse: - “Aquele que abriu o portal não é digno de confiança humano. Mas trama contra mim. Você irá de encontro a ele no meu lugar, e o matará se for preciso.”
Fergusson respondeu: - “Parece que resisti novamente a sua magia dragão, pois não me sinto tentado a fazer isso. E além do mais, se você está com medo de enfrentá-lo, o que alguém como eu poderia fazer?”
Hageron disse: -“Acontece que nosso homem é um conhecedor de magias rituais que talvez possam me causar inconvenientes. Mas não a você. E você estará protegido por minha magia.”
Uma armadura negra se materializou protegendo o corpo de Fergusson e uma espada negra também apareceu flutuando à sua frente.
Fergusson disse: -“Por que eu devo ajudar um demônio do ódio que aprecia tirar vidas e causar sofrimento aos outros?”
O dragão disse: -“Ser quem sou é minha natureza. Eu só posso agir assim. E mesmo que eu seja destruído renascerei novamente, pois sou primordial. Mas, acho que você vai se interessar em constatar com seus próprios olhos o que esse conjurador é capaz de fazer.”
Fergusson começou a ver imagens de um templo, dentro de um castelo, localizado no meio de um pântano. Lá muitos homens, mulheres e crianças estão sendo sacrificados para a realização de rituais profanos. Fergusson diz: -“Se o que eu estou vendo é mesmo real... terei prazer em acabar com esse feiticeiro!” E segurou a espada negra.
Hageron riu medonhamente. E disse: - “Agora você é um guerreiro do dragão negro Fergusson. Não existem limites para o alcance das suas trevas e nenhum ser que não se fira com a sua espada. Você é tão rápido que já estava lá mesmo antes da luz. Nada pode medir a sua força.”
CAPÍTULO 4
Quando o dragão se foi, Fergusson passou um tempo perdido em uma dimensão escura. Ao mesmo tempo em que se sentia muito forte, de nada adiantava sua força em meio aquele vazio sem fim. Imagens fantasmagóricas começaram a brotar do escuro e suas feições monstruosas o intimidavam. Os fantasmas avançaram contra Fergusson, que movia-se para se defender, mas o atravessavam como se ele não existisse, e ele também não podia afeta-los diretamente.
Não sabia dizer quanto tempo permaneceu naquele lugar, mas assim que viu um raio de luz, foi a seu encontro, e chegou novamente no local onde estava antes de ser jogado para aquela dimensão escura. Era noite, mas podia ver claramente. Entre suas duas sobrancelhas viu o castelo negro daquele mago de quem o dragão falara, e o caminho que devia percorrer até chegar nele. Era um longo caminho para se percorrer, mesmo a cavalo. Porém, sabia que precisava somente de um impulso para chegar. Deu um passo, e transformando-se em um vulto, percorreu o caminho por através da selva e das montanhas escarpadas, até o interior do pântano maldito.
Algo naquele local o fez desembainhar sua espada negra, ficando pronto para lutar. Uma vibração de desespero e agressividade o invadia, e soava como um zumbido em seus ouvidos. Estava somente a algumas dezenas de metros do castelo negro, e uma energia imensa começou a se concentrar ao seu redor, girando em redemoinho e sacudindo a paisagem com uma força crescente. Se decidisse alimentar aquela energia poderia destruir o castelo e também todo aquele pântano. Sentiu-se imensamente tentado a fazer isso, mas com a sua visão projetada, viu aldeias próximas que começavam a ser afetadas por aquela tormenta profana que emanava do seu ser. Com imenso esforço controlou-se para não destruir aquelas aldeias, e também acabar com toda a vida naquele pântano. Deteve aquela energia destrutiva, parando-a.
De repente, a terra começou a tremer e a se abrir, e bem próximo dali, Fergusson viu uma criatura enorme surgir por de dentro da terra. Seu corpo era de um homem gigante, e a cabeça de crocodilo; elevava-se vinte metros acima do chão. Possuía também uma cauda de crocodilo. Em alguns instantes, a criatura gigante desapareceu e apareceu às costas de Fergusson, teletransportando-se, e pisou nele para esmaga-lo. Fergusson sentiu aquele peso colossal o esmagando e quebrando seus ossos; suas vísceras saíram por orifícios do seu corpo. Viu o rosto pálido da morte, mas ela não o tocou. Seu corpo amassado regenerou-se, puxando de volta seu espírito, e em questão de segundos já estava de pé a fitar a criatura novamente, com a sua espada em mãos. O gigante curvou-se para morde-lo com suas mandíbulas enormes, mas dessa vez Fergusson foi mais rápido, saltando com a velocidade de um raio para atravessá-lo na barriga com ajuda da sua espada. Fergusson passou inteiro através do corpo do gigante-crocodilo, saindo em suas costas, e então, escalou-as, subiu pelo pescoço, e por fim perfurou cérebro com um golpe de estocada no topo do crânio. O gigante homem-crocodilo balançou e caiu pesadamente, afundando parcialmente na lama.
Fergusson então ouviu um grito raivoso: - “Você matou o meu guardião! Amaldiçoado seja!”
A voz era de um homem, que o olhava de cima do muro do castelo, e segurando um cajado brilhante, vermelho e emanando fogo. Era o mago que vira em suas visões, sacrificando e torturando pessoas para a execução de rituais. Aquele que presumidamente tinha invocado o dragão negro.
Fergusson caminhou, devagar, aproximando-se mais do muro do castelo, parou e disse em voz alta para o mago: - “Eu vi as coisas horríveis o que você faz com as pessoas em nome da sua magia, mago!”
O mago criou uma bolha luminosa com o seu cajado ao redor de si mesmo, e dentro dela, desceu suavemente, pousando poucos metros de distância de Fergusson. Fergusson sentia mais morte do que vida no corpo daquele homem. A magia necromântica havia tomado suas feições humanas, e lhe conferido um aspecto demoníaco. Seus olhos eram negros por completo, e os cabelos, compridos e brancos, esvoaçavam ao vento. Uma veste marrom, ornamentada com símbolos dourados, só não lhe cobria as mãos e a cabeça. Com a mão esquerda segurava um cajado flamejante. O mago disse: - “Eu sou Arkamom, senhor das trevas. Você tem muita força, mas não acho que tenha a conseguido sozinho. Quem é o seu mestre?”
Fergusson respondeu: - “Quieto! Eu vim por minha conta! Renda-se para ser julgado, e talvez você viva.”
Arkamom riu. – “Tolo. Quem vai me julgar? Um débil camponês de uma aldeia qualquer? Você cometeu um erro em vir aqui, e se arrependerá disso até o último suspiro.”
O mago balançou o seu cajado e, correntes de relâmpagos saíram do artefato para eletrocutar Fergusson. A eletricidade fervia o seu sangue, e seu corpo ficou em chamas. A dor inicialmente foi infernal, e seus órgãos vitais derreteram, mas o poder do demônio dragão o protegeu, dando-lhe meios de suportar, e, em então, de defender-se, colocando a sua espada na frente dos raios, os absorvendo até que cessassem. Habituado aos combates o mago já havia antecipado novamente a ação de Fergusson, multiplicando-se. Fergusson via o mago Arkamom em todas as direções.
Instintivamente, ao se ver em perigo Fergusson transformou-se em um dragão e voou através das múltiplas cópias do mago, subindo ao céu. Então, no alto, cuspiu um jato de chamas contra a concentração de imagens do mago. Sentiu as chamas tomando forma dentro de si, e então as expeliu, sem pensar em como o fazia.
O fogo queimou o corpo das cópias e somente o verdadeiro corpo de Arkamom resistiu, a baforada de dragão, criando uma barreira mágica com ajuda do seu cajado.
Fergusson pousou e retomou a sua forma humana. O mago Arkamom lançou três sementes, que ao caírem na terra se transformaram em serpentes gigantes.
As serpentes tentaram enrolar seus corpos no corpo de Fergusson e dar-lhe mordidas, mas a velocidade do guerreiro era superior possibilitando que evitasse a maior parte dos golpes. Uma mordida porém, arrancou o seu braço que segurava a espada e o engoliu. Imerso em dor, foi capturado pelo corpo da serpente que começou a esmagá-lo. A serpente, então, subitamente começou a aliviar a força e a emitir um rosnado, quando de repente explodiu de dentro para fora. O braço que ainda segurava a espada retornou para Fergusson. Ainda restavam duas serpentes e o mago Arkamom já preparava uma nova magia enquanto lia um pergaminho e recitava algumas palavras mágicas.
Fergusson também sentiu uma força mágica em seu interior, sua mente estava conectada com aquelas serpentes. Com a força do pensamento ele as ergueu no ar as amarrou uma à outra. Depois mandou-as para longe.
Ouve um ruído estrondoso e um clarão de luz. Em seguida, uma esfera flamejante de metal caiu do céu em altíssima velocidade sobre Fergusson, como um meteoro. O impacto explodiu seu corpo em mil pedaços. Arkamom deu um suspiro, pensando contente que estava tudo acabado. Seu castelo foi bastante danificado por seu último ataque. O meteroro deixou uma grande cratera no chão e destruiu seu muro, mas ele não se feriu.
E quando o mago deixava o local para entrar no castelo, o corpo nu de Fergusson havia se recomposto ao redor da espada negra do dragão, que tinha ficado intacta.
Com o poder que fluía através do seu ser, Fergusson criou uma nova armadura negra ao redor do seu corpo, e com a espada em punho, disparou-se contra Arkamom, que estava de costas. Chocou-se contra um escudo mágico protetor ao redor do mago, que virou-se surpreso, e lançou um raio de energia do seu cajado contra Fergusson, que defendeu com a lamina de sua espada. Ficaram medindo força, quando o dragão apareceu no céu. Ao perceber o dragão, Fergusson disse: - Agora você está perdido mago! Somos dois contra um.
O mago disse: - “O que?! Foi o dragão que te enviou?”
O dragão ficou somente a voar acima do campo de batalha. O mago riu. - Hahaha. Idiota, não sabia que ele te enviou para morrer? O demônio só queria testar a minha força!
Com uma descarga repentina de energia Fergusson foi jogado para trás. Arkamom começou a mudar de forma, até que se transformou em um demônio chifrudo.
CAPÍTULO 5
Arkamom, em sua nova forma, medindo três vezes o tamanho de Fergusson, aproximou-se dele em um piscar de olhos. O cajado transformou-se em uma lança flamejante, e Arkamom golpeou Fergusson com uma estocada. Fergusson conseguiu desviar a lança de fogo batendo nela com a espada negra. O mago-demônio diz: - Tolo! Aproveite a força que você tem agora e fuja daqui enquanto pode.”
Hageron, o dragão, pousou no alto do castelo.
Fergusson refletiu um instante sobre as palavras do mago, e pensou que talvez fosse mesmo a decisão mais sensata a tomar. Mas rangeu os dentes, segurou firme a espada e falou: - “Nada disso. Agora somos eu e você Arkamom!”
Fergusson lançou tentáculos sombrios do próprio corpo contra o mago demoníaco. Os tentáculos imobilizaram os braços e pernas de Arkamom. Então, Fergusson, com um impulso girou sobre o próprio eixo pegando mais força e saltando o suficientemente alto para um ataque com a lâmina da espada negra no pescoço do mago-demônio, o decapitando.
A cabeça demoníaca caiu no chão e o corpo despencou em seguida com um estrondo. Então seguiram-se alguns segundos de quietude e calma. Somente um leve som do vento que movia a neblina, e uma sensação de êxtase tomou conta de Fergusson, que começou a ver tudo em câmera lenta.
A sensação terminou quando Hageron alçou voo subindo alto com um rugido, e o castelo desmoronou. Então o dragão negro voou até próximo de Fergusson e falou com ele, pairando no ar com o bater de suas asas. – “Você se mostrou mais capaz do que eu havia previsto mortal. Sirva-me e conquistará todo o mundo.”
- “E como é que eu devo servi-lo dragão?” Perguntou Fergusson.
O dragão respondeu: - “Vá de reino em reino, derrotando os seus exércitos e obrigando que todos se curvem a mim. Faça-os construir templos para que me adorem, e monumentos em minha glória. “
Fergusson disse: - “Está louco demônio. Não vou fazer nada disso.”
Então algumas pessoas que estavam presas no castelo do mago, aparecem saindo correndo de dentro dos escombros.
- “Você não conhece realmente a minha força mortal.” Diz Hageron, o dragão, que volta-se para os sobreviventes, e começa a concentrar um sopro de fogo.
Fergusson diz: - “Deixe essas pessoas em paz dragão!” E salta com fúria golpeando o pescoço de Hageron com a espada negra, usando toda a força que lhe tinha sido dada. A espada encravou totalmente no pescoço dele, que soltou um rugido poderoso e cuspiu chamas em direção do céu. As labaredas atingiram dezenas de quilômetros de altura. Fergusson empurrou com suas pernas e conseguiu desprender a espada novamente, e então, foi atingido por um golpe de garra do dragão, sendo projetado com força no chão, afundando metros dentro dele. Então ouviu: - “Você não terá escolha mortal.”
Fergusson ouviu mais um rugido do dragão e depois o silêncio. À dez palmos abaixo na terra Fergusson não conseguia sentir o seu corpo. Nenhum músculo sequer o obedecia ou enviava qualquer informação para seu cérebro. Então, seus sentidos começam a abandoná-lo, até que ele submergiu em uma escuridão sem fim.
Quando acordou, teve a sensação que esteve ausente por milênios. Sentia o calor do fogo. Virou o rosto para averiguar e percebeu estar deitado em uma clareira em meio à um bosque. Uma fogueira estava acesa ali perto, e havia carne sendo assada. Estava nú. Viu aparecer da mata um homem ruivo, e logo identificou que era o mesmo que ele havia libertado tempos atrás das mãos dos mercadores de escravos.
- “Bem vindo de volta.”
Disse o homem. E continuou: - “Eu sou Satáro. Agora posso agradece-lo por ter-me ajudado a me libertar dos escravizadores.”
Fergusson diz: - “Não é preciso. Sinto-me bem, e não tenho fome. “
Era verdade. Fergusson sabia que ainda estava com o poder do dragão em si, e nunca se sentira tão bem.
Satáro riu contidamente, e disse: - “Eu me refiro ao dragão que o persegue. Eu sei como ajudá-lo a se libertar dele.”
- “ Como?” Perguntou Fergusson.
- “Você deve aprender a arte misteriosa da magia. Então com sorte poderá mantê-lo longe. O primeiro a se fazer é vasculhar os escombros do castelo de Arkamom. Encontre seus pergaminhos mágicos e estude-os.” Disse Satáro.
Fergusson diz: - “O que você sabe sobre isso e sobre o dragão? Como me seguiu até este lugar?”
Satáro diz: - “Sou amigo de um poderoso gênio, e pedi ajuda a ele para encontrá-lo, pois achei que você também precisaria de uma ajuda. Venho de uma família de ocultistas e feiticeiros. Já vi portais sendo abertos antes, e já vi seres abomináveis, que se chegassem a esse mundo ele seria destruído instantaneamente.”
Fergusson disse: - “Então podia facilmente escapar sozinho daqueles homens?”
Satáro disse: -“Sim, poderia. Mas se eu não pudesse, você teria me ajudado a escapar.” E sorriu.
Fergusson fez como o misterioso homem o aconselhara, criou uma armadura negra para si, e voltou até o local do castelo. Sentiu um calafrio ao perceber que o corpo do mago Arkamom havia desaparecido.
Fergusson viu um brilho branco e intenso surgir de repente, e esse ponto de luz rodopiou ao seu redor. Então pairou à sua frente e a intensidade diminuiu. Fergusson viu aquela pequenina fada novamente. Ela falou docemente com ele: - “Coitadinho. Estão o fazendo sofrer com toda essa violência.”
Fergusson diz: - “Não se preocupe comigo bela criatura.”
A fada disse: -“Quando estiver em desespero, atravesse a ponte do arco-íris.” E então, ela desapareceu.
Fergusson encontrou uma dúzia de pergaminhos e os levou de volta até aquela clareira. Satáro não estava mais lá. E na fogueira só havia brasa incandescente.
Fergusson leu cada um dos pergaminhos, e surpreendeu-se por conseguir entender o significado dos símbolos impressos neles.
Depois de estudar a magia do necromante, Fergusson estava muito mais forte. Aprendeu a abrir portas dimensionais e a desenvolver feitiços poderosos. Seus novos conhecimentos o transformaram profundamente. Agora ele entendia processos intrínsecos naturais como nenhum humano normal entende. Mas não estava certo do que deveria fazer dali em diante.
Então, Fergusson ouviu a voz de Satáro, que surgiu correndo de dentro da mata, o alertando energicamente - “Fergusson! Prepare-se, um guarda de Mekatron está vindo! “
- “Um o que?!” disse Fergusson.
Satáro disse: - “Os mekatrons defendem o equilíbrio do cosmos, garantindo que seres como os humanos não adquiram poderes muito além dos esperados. Um deles está vindo agora para destruí-lo!”
CAPÍTULO 6
Era noite, e Fergusson notou o mekatron se aproximando conforme ia cobrindo a luz das estrelas. O mekatron parou flutuando uma centena de metros sobre Fergusson, e era enorme, como uma montanha. Fergusson não reconhecia nenhum tipo de cabeça ou membros, era só um enorme monte cinzento que flutuava no céu.
Asas negras se criaram da armadura de Fergusson e fecharam-se sobre ele, formando uma capa protetora. Um ataque de luz desceu do mekatron para colidir com Fergusson. Ouve uma explosão gigantesca, e Fergusson instantaneamente se viu flutuando em meio à uma sopa de pequenas partículas que se desprendiam ou se uniam umas nas outras. Seu corpo também havia sido desfragmentado, porém sua consciência ainda era mantida em segurança com o poder do dragão negro.
Quando o calor diminuiu, o corpo físico de Fergusson novamente se materializou. Fergusson estava coberto por uma nova armadura, ainda mais forte. Com um impulso, saltou colidindo com o campo de força que protegia o mekatron. O toque com o campo de força o fez vibrar tão intensamente que seu corpo quase se despedaçou. Ficou zonzo por alguns segundos, e em seguida, sentiu-se capaz de atravessar o campo de força; tocou nele com as mãos, e sintonizou-se com a energia dele. Com isso, atravessou-o, e em seguida atacou o mekatron com um raio negro de energia disparado da ponta de sua espada. O raio abriu um buraco na estrutura do mekatron. Havia um compartimento em seu interior, e Fergusson adentrou.
No interior do mekatron, haviam muitos fios e seres misturados com metal. Pensou que, possivelmente, a explosão do raio do mekatron, matou Satáro, e quem sabe quantos mais. Fergusson sentiu-se dominado pelo ódio poderoso de Hageron, o dragão que alimentava sua força, e com golpes crus de espada matou a todos os seres presentes no local. Quando matou o último deles, a enorme estrutura mekatron se auto-destruiu, com uma explosão ainda maior do que a primeira.
Pisando sobre o centro de uma enorme cratera, Fergusson contemplou todo o cenário devastado. Não havia sequer uma planta existente por uma grande distância, somente poeira e o som do vento. Subitamente sentiu tristeza e arrependimento.
-“Quanta destruição! Quantas mortes em vão!” Lamentou Fergusson.
Fergusson notou a presença do dragão Hageron, e ouviu a sua voz: -“Muito bem Fergusson. O ódio se fortalece em você e você está cada vez mais forte. Logo, poderá ser indestrutível como eu.”
-“Cale-se demônio!” Disse Fergusson. –“Não desejo me tornar o seu marionete! Afaste-se de mim!”
Com uso das mágicas que aprendeu dos pergaminhos do feiticeiro Arkamom, Fergusson conseguiu ver Hageron sinistramente pairando a algumas dezenas de metros de onde estava. Sua energia estava conectada com a dele. Viu as sombras negras que envolviam a ambos. Sentiu-se impotente. O que poderia fazer? Estava nas garras daquele poderoso demônio. Foi quando lembrou-se do conselho daquela fada. Porém, quase não havia luminosidade ao seu redor. Como poderia encontrar a ponte do arco-íris? Fechou os olhos e imaginou um arco-íris, que o envolveu, até que Fergusson se viu em uma outra dimensão. Havia claridade, e rochas cristalinas de todos os tamanhos flutuando no espaço. Sentia-se muito bem. Milhares de seres voavam por toda parte como que se estivessem dançando.
As criaturas tocaram as mãos de Fergusson e começaram a conduzi-lo suavemente até o interior de um cristal enorme. Lá dentro, Fergusson viu uma fada maior, sentada em um trono. A fada falou com Fergusson: -“Lamentamos muito o que está acontecendo com você humano. Mas, sabemos que você está sob o controle do dragão. Não podemos deixar que você retorne ao seu corpo, pois poderá servir aos propósitos obscuros dele.”
“O que?!” Pensou Fergusson. “Ficarei aqui nesse lugar para sempre?”. Sentiu-se enganado. Talvez aquelas fadas tivessem razão, mas não podia abandonar a sua vida assim, não estava em sua própria natureza.
-“Não ficarei!” Fergusson flutuou para sair do cristal, e as fadas tentaram impedi-lo entrando na sua frente. Mas Fergusson as golpeava com socos e chutes, ou as lançava longe. Até que conseguiu sair do cristal, e, voando, começou a se distanciar dali.
Percebeu um ponto mais escuro naquela dimensão, e seguiu nessa direção. Logo, viu um portal dimensional que revelava negras nuvens de tempestade.
Fergusson decidiu arriscar. Entrou no portal, e se viu no meio daquela cratera que estava antes de ir para a dimensão das fadas. O dragão não estava mais lá, e acontecia uma violenta tempestade de raios e vendavais, com pesada chuva.
Estava nú em sem proteção contra as intempéries. Tinha consigo somente uma pequena parcela do poder que tinha a pouco, enquanto enfrentava o mekatron ou quando enfrentou o necromante Arkamom. Mas ainda foi suficiente para que criasse uma proteção sombria ao redor do seu corpo.
Não tinha mais a espada negra. Não conseguia se mover rapidamente através de grandes distâncias como antes, e também não podia ver além do horizonte. Seu corpo, afinal, era o corpo de um mortal, e sem o dragão para conferir-lhe poder, estava sentindo dores e exaustão.
Fergusson caminhou por quase dois dias, até que pudesse voltar a ver vestígios de vida e natureza na paisagem. Mesmo mantendo certa energia fantástica consigo, estava muito cansado, e sentia sede.
O Sol brilhava forte no alto do céu. Ao longe, Fergusson viu um grupo de monges. Os monges se aproximaram dele com cautela, fazendo orações e executando magias protetoras. Podiam sentir as sombras que envolviam Fergusson. Mas os monges também perceberam que Fergusson estava muito mal, e mesmo sem que lhes pedisse, deram-lhe água. Fergusson bebeu. Depois, o convidaram para acompanha-los até o mosteiro onde moravam. Fergusson aceitou.
CAPÍTULO 7
Fergusson foi acolhido pelos monges no mosteiro. Comeu, se banhou e dormiu confortavelmente. No segundo dia, um monge mais velho foi falar com ele, acompanhado por outros dois. Fergusson sentia-se mais forte do que quando tinha chegado.
Não entendendo o idioma que falavam, Fergusson usou seu poder fantástico, possibilitando assim, que compreendesse qualquer linguagem. Os monges perceberam sinais de magia, e novamente ficaram apreensivos, segurando seus símbolos sagrados. O monge ancião falou –“Qual a razão da sua vinda?”. Fergusson respondeu no idioma deles: -“Sou um desgarrado. Apenas procuro um novo lugar para viver em paz.”
Os monges começaram a cochichar entre si, e Fergusson conseguiu ouvir o que falavam, sobre se deviam aceita-lo ou não no local, e por fim decidiram que o aceitariam com a condição de que trabalhasse duro. Então, assim foi feito.
Fergusson viveu no lugar por dez meses de tranquilidade, até que o chamaram para uma reunião. Com vários monges influentes no lugar, disseram-lhe: -“Ferguson, você não é preguiçoso e sempre nos ajuda em nossas dificuldades. Mas alguns acham que você está tocado pelo demônio e que um dia o atrairá para cá. Vimos quando você desviou o curso da água usando magia durante a enchente, e quando nos trouxe uma quantia enorme de madeira em poucas horas. Vimos quando um ataque de abelhas passou através de você sem que o atingisse, como se você não existisse. Vimos quando você, com um salto subiu até o alto da torre para reparar o teto. E parece que você sabe das coisas antes de que o contemos a você. Alguns pensam que você é o grande iluminado a muito esperado, enquanto outros acham que você é servo do demônio, e afirmam ter visto monstruosidades por perto desde que você chegou.”
Fergusson falou: -“Eu entendo. Talvez, seja melhor eu partir.” Ainda naquela noite, Fergusson deixou o mosteiro. A escuridão não era problema para ele, mas uma vantagem, pois podia enxergar perfeitamente sem luz.
Fergusson caminhava pelas colinas, triste, por ter de ir embora dali, mas eles tinham razão em temê-lo. O dragão Hageron apareceria cedo ou tarde no mosteiro, e quem sabe o que faria com aquela gente. De repente, um pássaro sobrevoou acima de Fergusson e deixou cair um bilhete que prendia entre as garras. –“Venha depressa Fergusson. Alguém com poderes iguais aos seus está nos atacando. Monge Sião”. Era um dos monges do mosteiro em que ele estava hospedado. Fergusson retornou rápido, com uma só passada, transformou-se em trevas em chegou ao mosteiro, surgido das sombras. Ali, viu um homem enorme, com uma armadura negra similar à sua, e que empunhava um machado negro. Sua energia era agressiva e maligna. Três monges jaziam mortos aos seus pés.
-“Ola Fergusson! Ouvi falar sobre você. Estou aqui para matá-lo, e provar que sou o mais digno de ser o guerreiro do dragão negro. Hahahaha. Eu sou Evandir!”
Fergusson disse: - “Desgraçado! Não me importo quem seja, vou acabar com você agora mesmo.”
Mas então, Fergusson lembrou-se que seu poder dependia em maior parte do quanto o dragão negro o ajudava, e o mesmo devia acontecer com Evandir, sendo que o resultado dessa batalha dependeria de quem ele fosse apoiar.
Fergusson transformou-se em uma besta, evocando todo o seu poder, e atacou Evandir com a sua espada negra. Evandir fez o mesmo, atacando Fergusson com o seu machado negro. Ambos travaram uma longa batalha, que causou grande impacto naquele território. O choque de suas armas originou terremotos, montanhas derreteram, e furacões varreram a terra, por causa do confronto. Os dois tinham a mesma força, e um sempre conseguia anular o ataque do outro. Em certo momento, Fergusson e Evandir transformaram-se eles mesmos em dragões e subiram até o espaço sideral lutando um contra o outro, voando próximo de muitos planetas.
O combate já durava três dias, quando, bem alto acima do oceano e das nuvens de tempestade, Hageron, o dragão, tomou partido. Hageron apareceu entre os dois, Fergusson e Evandir, que estavam quase propondo uma trégua um com o outro, e disse: - “Vocês dois tem um espírito admirável, mas, você Evandir, sabe melhor como me servir.”
Então Fergusson perdeu a maior parte de seus poderes, e sua espada e armadura desapareceram, enquanto Evandir tornou-se muito mais forte. E o dragão ordenou: - “Evandir, acabe de uma vez com Fergusson, e assuma o seu lugar como meu servo guerreiro!”
Porém, quando Evandir tentou golpeá-lo com o seu machado, não conseguiu. Evandir também não podia fazer-lhe mal com os seus poderes mágicos. O dragão, ao perceber aquela situação, retirou os poderes de Evandir e os conferiu mais uma vez à Fergusson.
Evandir queimou e transformou-se em cinzas, sem que Fergusson sequer fizesse algo.
Hageron disse à Fergusson: -“Isso prova que você é o verdadeiro predestinado para ser o meu anio das trevas, Fergusson.”
Fergusson disse: -“Besteira dragão! Você teria acabado comigo, se eu não fosse imune ao seu poder.”
Hageron disse: -“Não me subestime mortal. Eu ainda poderia facilmente acabar com você, existem muitas formas de fazer isso sem precisar usar magia. Também posso destruir o mundo todo ao seu redor, o que acharia disso?”
Fergusson grunhiu de raiva, pois ainda era prisioneiro da magia do dragão e seus propósitos sinistros. Assim, Fergusson foi protagonista de muitas aventuras, derrotando sozinho muitos exércitos e monstros, ao longo de mil anos. Por ser especial, o dragão Hageron o mantinha vivo, e muitas vezes o usava indiretamente como instrumento para seus propósitos.
Até que, um dia, Fergusson, que nem ao menos podia morrer, para deixar de causar sofrimento por culpa do seu fardo, entrou dentro de uma caverna sagrada no alto de uma montanha, e meditou profundamente, atingindo o equivalente a um estado de hibernação.
Fergusson ficou mais forte ao longo dos séculos, e as variadas técnicas mágicas que aprendeu durante esse tempo, possibilitaram que conseguisse se manter ali à salvo de ser acordado pelo dragão.
Muitos dos seus feitos foram cantados em forma de poemas, tornaram-se lendas e inspiraram novelas. E ninguém sabe a localização da caverna onde Fergusson continua a meditar até os dias de hoje.
FIM
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O Verdadeiro Conhecimento
Setetiba era um monge estudioso e dedicado, membro de uma
antiga linhagem religiosa. Todos, até os outros monges, ficavam impressionados
com a sua capacidade de dissertar sobre os textos sagrados. Setetiba sabia os
nomes de muitos deuses, conhecia diversos costumes tradicionais, e decorava os
sermões dos antigos mestres.
Setetiba, também era conhecido e admirado por sua capacidade
de lançar-se em longos períodos de meditação, e, certo dia, decidiu se sentar
no interior de uma caverna e ficar ali até que conseguisse perceber com total
clareza o Universo.
Durante os primeiros dias, Setetiba organizou em sua mente
todo o conhecimento que tinha aprendido com os mestres e com os livros. Seus
amigos mais próximos iam de vez em quando até o local onde ele meditava,
dando-lhe um pouco de comida e água.
Setetiba experimentou transes profundos que duravam dias, e,
ao passar de sete anos, ele decidiu que era hora da deixar a meditação, saindo
então, da caverna.
Todos os monges aguardavam Setetiba com reverência, ansiosos
para que ele lhes dissesse o que tinha descoberto durante todos aqueles anos em
que esteve no interior da caverna.
-“ Irmão Setetiba, com base em sua agraciável experiência, o
que pode me dizer sobre as palavras do mestre Lon quando ele caminhava às
margens do rio Chanzui?” Perguntou um dos monges.
-“Querido irmão, eu me esqueci que palavras foram essas.”,
respondeu Setetiba.
-“O que você me diria a respeito do décimo segundo poema do
livro sagrado da conduta?”, perguntou outro monge a Setetiba.
-“Perdoe-me, mas eu
me esqueci como são esses poemas.”, respondeu Setetiba.
-“Você pôde constatar a veracidade dos ensinamentos da
tríplice dourada?”, perguntou o monge chefe.
-“Se pude, não sei. Eu me esqueci.”, respondeu Setetiba.
De imediato começou uma grande discussão entre os monges.
Todos estavam convencidos de que, ou Setetiba tinha se perdido no caminho da
espiritualidade durante aqueles anos na caverna, ou estava escondendo a verdade
deles.
Até que um monge disse para Setetiba: -“Que embaraço! Ao
invés de tornar-se mais sábio, tu viraste um tolo!”
Setetiba disse: -“Não, irmão. Pelo contrário, me sinto
infinitamente mais sábio depois que me esqueci de todos os nomes e versos que
são constantemente repetidos desde os tempos antigos. Eles estavam tapando a
minha compreensão pura e verdadeira acerca de todas as coisas. Agora, que
desapareceram todos os floreios sobre a realidade, posso perceber a mim mesmo
como uma extensão do próprio Universo.”
Depois de ouvirem tal esclarecimento por parte de Setetiba,
os monges alcançaram um novo e mais completo entendimento, e passaram a venerar
Setetiba, tomando lições com ele.
FIM
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O Salão da Eternidade
Três almas recém desencarnadas chegaram ao salão da eternidade, onde cada alma podia ver um quadro retratando seus feitos em vida. Alguns quadros eram grandes, enquanto outros, bem pequenos.
Heitor, tinha sido em vida um poderoso e hábil comandante militar, e estava furioso porque seu quadro era pequeno. Ele foi questionar o porteiro: “-Meus feitos não estão retratados aqui. Onde estão todas as batalhas que ganhei?
O porteiro lhe disse: “-Os feitos da eternidade são diferentes dos feitos para os vivos. Ganhar batalhas podem causar consequências boas ou ruins, alternando sempre quanto a isso ao longo do tempo, e por isso, são atos neutros, não sendo citados no quadro.”
Alberto, que tinha sido um comerciante rico e muito influente em vida, estava perplexo, porque o seu quadro era pequenino.
Alberto questionou o porteiro sobre isso: “-Como pode ser? Em vida eu era rico e influente. Obtive muitos prazeres.”
O porteiro lhe disse: “-Você agiu como uma peça em uma engrenagem, e não fez nada novo. Os seus prazeres foram somente seus, e por isso, o seu quadro é tão pequeno”
Jérson, que em vida foi artista e inventor, e não teve muitas posses materiais, tinha um quadro grande. Suas obras foram, e ainda eram sentidas por muitas pessoas, e cada experiência individual era acrescentada em seu quadro.
FIM
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ROSHIKAMI OBUSHI, O SAMURAI
O Mestre Samurai Roshikami Obushi. não é um personagem histórico, mas lendário.
O Mestre e o infeliz:
Uma bela tarde O Mestre dos Mestres Roshikami Obushi estava a contemplar a vista, onde as montanhas e o céu refletiam sobre o extenso lago, da mesma maneira que um límpido espelho polido. Estava sentado sobre seus calcanhares, a harmonizar-se com a natureza, o vento balançava as folhas, que se despr
endiam de vez em vez, conforme os desígnios supremos, e somente de acordo com os desígnios supremos.
Como não vestia na ocasião sua armadura, e carregava apenas uma espada curta, oculta por sua roupa larga, um ladrão o abordou, cego por sua ambição, sem saber que aquele homem era o Mestre Supremo dos Samurais.
Armado com um porrete o ladrão agarrou a gola da vestimenta do Mestre, e esbravejou: Posso ver que sua roupa é de ótima qualidade. Suponho que deve ser dono de considerável riqueza. Ande! Vamos até onde você guarda sua fortuna, eu a tomarei para mim!
E bradando o porrete como um louco:
Sou muito perigoso! Faça o que digo!
O Mestre sem dizer palavra alguma, fez um gesto em concordância, se levantou, sem demonstrar sentimento ou emoção, caminhou em companhia do ladrão até a Aldeia dos Samurais. Os guerreiros que percebiam a cena ficaram impassíveis, pois, certamente Roshikami Obushi estava no controle da situação, a não ser que aquele homem fosse na verdade um Deus, e sendo assim, nada poderiam fazer. O Mestre adentrou em sua majestosa residência seguido pelo ladrão, e então deu a ele uma quantia de ouro capaz de manter alguém modestamente por uma vida. O ladrão que já tinha percebido onde havia se metido, agora agia com nervosismo e incredulidade, agarrando o ouro e fugindo para a floresta. Nenhuma ordem para que o perseguissem foi dada. Passaram-se 7 anos, e em certa ocasião O Mestre visitava uma pequena cidade distante, quando viu aquele mesmo homem, agora bem vestido, e ostentando uma expressão esnobe no rosto, característica daqueles que gozam de riqueza adquirida de maneira fácil. O Mestre decidiu observa-lo durante o dia sem deixar ser percebido. Acompanhou uma cena, em que o bem sucedido Ladrão por pura natureza tomou das mãos de um pobre pedinte uma moeda de ouro. Neste momento Roshikami Obushi já segurava o infeliz larápio pela gola de sua roupa.
- Deve se lembrar de mim ó infeliz?
Agora com sua armadura, e com suas armas, o samurai era uma visão aterradora. Mas o ladrão se lembrou assim que o viu.
- Você veio pegar de volta o que havia me dado?! - disse o usurpador. - Eu já gastei até a última moeda!
- Obviamente que não vim fazer isso. Quando você veio até mim naquela dia, pude claramente perceber que uma quantia como a que lhe dei eliminaria muito do seu sofrimento. Você precisava daquele dinheiro mais do que eu.
O ladrão por um momento deslumbrou uma sabedoria que não sabia existir, nos olhos do furioso Samurai, a que um dia tentara covardemente roubar.
Roshikami Obushi disse: - Agora vejo que mesmo vivendo como um fanfarrão, continua a tomar o que é dos outros. Agora você ira entregar a sua casa e o seu dinheiro a este pedinte.
- Não posso e não irei fazer isso! Veja como é este miserável mendigo, ele não é digno de tamanho beneficio!
Os olhos do Mestres dos Mestres tornou-se vermelho, e como uma divindade colérica esbravejou, sacudindo o próprio punho à frente do homem desonesto: - SOU MUITO PERIGOSO! FAÇA O QUE DIGO!
E assim o infeliz por natureza fez.
Ao deixar a cidade O Grande Mestre disse para todos ouvirem: Tenho olhos que se estendem por onde o todo o horizonte reflete sua graça!
E saiu cavalgando em seu cavalo.
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O guerreiro em poucas palavras..:
Uma vez alguém perguntou ao Mestre Roshikami Obushi.
Mestre, o senhor poderia descrever o guerreiro em poucas palavras?
A pergunta fora pertinente, e O Mestre respondeu:
Nos tempos de paz ele se aperfeiçoa. Estuda os mecanismos da guerra, e desenvolve suas habilidades pessoais.
Serve a comunidade, e sabe ser servido por ela.
Seu senso de justiça é Uno à natureza.
Suas tradições são aquelas há muito estabelecidas.
Age com inteligência, e nunca com imprudência, mesmo diante da maior das injustiças.
Não se apega à nada que não à Sabedoria primordial.
É um guerreiro, pois não está perdido no campo de batalha.
Esta sempre pronto para ser a ponte, por onde caminha a esperança.
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O Mestre dos Mestres conta uma fábula..:
Durante uma certa ocasião em que todos festejavam a boa colheita, muitos silenciosamente se agitavam com intuito de que O Mestre dos Mestres percebesse que havia algo que desejavam pedir, ou perguntar. Então o Mestre deu tal oportunidade.
- Ó Mestre dos nossos Mestres Grande Senhor Roshikami Obushi, o senhor nunca antes nos contou alguma estória encantada. Com tantos jovens presentes, e aproveitando as festividades, O Senhor teria a bondade de nos conceder a honra de ouvir alguma?
O Mestre agitou sua barba, ponderou, e disse:
Era uma vez um homem que havia muito praticava com sua espada a arte de matar. Até que um dia, considerando-se invencível, começou a matar a todos os que cruzavam seu caminho. Cortava-lhes a cabeça, e arrancava-lhes as vísceras. Este homem assim prosseguiu até cansar-se, apoderou-se dos bens que encontrara, e viveu tranquilamente os fins de seus dias na mais plena felicidade.
Com o espanto de todos, Roshikami Obushi acrescentou: - É só para não dizer que essas coisas não acontecem.
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O Mestre diz: É melhor corrigir tarde do que nunca:
O Mestre dos Mestres Roshikami Obushi, é venerado por seu povo, o qual segue religiosamente suas palavras. Categoricamente o povo recita as proezas do Mestre, e todos enfatizam o quão seu mestre é sábio e poderoso. Dizem: O Mestre nunca se engana. Certa ocasião, o mestre dos mestres os guiava através dos vales para que chegassem à uma cidade onde fariam negócios mercantis, e também assistiriam à cerimonias. Quando em determinado trecho do percurso o Mestre deveria escolher entre um caminho, e outro. E assim, sem demora o Mestre escolheu por qual deles iriam prosseguir. Após um dia inteiro de caminhada, o Mestre chamou o segundo em comando e disse-lhe que voltariam, para ir pelo outro caminho. O seu segundo ouviu, e lhe disse - Mestre, não seria melhor agora que continuássemos por este mesmo caminho? Afinal o seu povo pode se sentir confuso ao considerar que o Mestre errara o caminho.
Roshikami Obushi respondeu - Devemos voltar e ir pelo outro caminho.
O segundo em comando lhe falou outra vez - Seria melhor então dizermos que vir até aqui foi necessário, ou que tu terias vindo por este caminho porque queria provar para seus comandantes que estavam errados?
Roshikami Obushi disse - Nada disso. Diga-lhes a verdade, que me enganei. Se mentiras me acompanharem, o que de bom eu poderia oferecer de verdade a meu povo? É melhor corrigir tarde, do que nunca.
Roshikami Obushi e o adversário
Quando o mestre samurai Roshikami Obushi era
jovem, começou a praticar golpes no tronco de uma árvore, também jovem, mas
resistente. Todos os dias ele a golpeava com os punhos, canelas, e de toda
maneira com o objetivo de derruba-la. Ele batia até que sangue saísse de seu
corpo, porem, a árvore não cedia. Três anos se passaram e a árvore ainda estava
agüentando firme. Então, Roshikami Obushi golpeou outra árvore do mesmo tipo que
estava ali do lado, e no primeiro golpe ela se quebrou. Assim, Roshikami Obushi
percebeu que aquela árvore que ele tinha tentado derrubar por tanto tempo, do
mesmo modo que ele, cresceu mais forte do que as outras. E o mestre entendeu
que a força do seu adversário jamais deve ser subestimada.
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